Texto de Lauriano Tchoia Luanda, 16.04.2016 |
Ainda o ano que
nos orgulhava por nobre estágio. Estávamos a passos curtos da independência de
setenta e cinco em Novembro.
Um estrondo! Era
o anunciar de uma trovoada. Mais tarde soube-se que não era nada disso. A lógica
trazia novamente tanques de guerra, o ilustre “monacaxito” e canhões de longo
alcance auto-propulsionados, seguindo o curso da serpente negra, sentido
norte-sul.
Instalada a
desorientação, viram-se trouxas à cabeça, cabritos sobre ombros masculinos, bússola
orientada para o bosque na vontade de continuar a viver, ainda que isso
representasse entregar-se à boca de um leão ou de um jacaré. Deparar-se com
homens com cauda... nunca! Era o terror que se anunciava.
Em vão toda a
boa-vontade do programa Kudibanguela, que em ondas médias, curtas e FM, desde
Luanda “desconseguia” desmistificar o marketing boca a boca do parente
confiado. Os cubanos tinham cauda. Não estavam longe de canibais, podem crer! O
boato convidava as pernas a superarem-se no sprint. Do trabalho apurado dos
cientistas da fofoca multiplicavam-se os resultados e juravam de pés juntos
terem-nos visto algures a virem.
Despedaçar
crianças, metê-las em fornos, lançar fogo pela boca. Eram os mais terríveis
cenários que se desenhavam no imaginário dos habitantes sobre os companheiros
de Fidel. Estava lançada assim a concorrência de profissionais de ficção, para
os maiores realizadores de Hollywood. Quem vê multidão em fuga nem tempo tem para
questionar. Ou foges antes, ou ficas e és vitima da lentidão.
Meio a acreditar
no inverso, a traquinice infantil empurrava-me a ver de perto o fenómeno. Em meios
pequenos a notícia faz-se junto à estrada. Uma lata de “leite moça”
(condensado) chegava-me projectada da primeira viatura blindada de bandeira
rubro e negro no focinho.
A meio a
surpresa no meu rosto mal refeito chegava outra lata de sardinhas e um pacote
de bolachas, algo fecundo demais para as humildes aspirações de criança. Estava
rompido o tabu. Já nem me lembrei do check up às partes traseiras dos soldados
à minha frente.
Seguiram os
primeiros, chegavam os segundos e mais grupos passavam a posteriori. Um aceno,
um brinde para o seu “Ngangula”, eu no caso, ao qual se juntavavam timidamente outras
crianças mais, que dali em diante tinham de ser pioneiros porque “a luta
continua”. Uma carrinha ia aos soluços, combustível no fim. Chamados a empurrá-la
para a berma, apanhou-nos de surpresa a mensagem firme: “Olha pioneiro, fica
com este carro é para ti”.
Ter a primeira
viatura aos treze anos não podia ser um mau prenúncio. Alegria e medo juntos. O
doador despedia-se, mudando-se com os haveres para uma camioneta e, já sem
aparecer, reparei que nem livrete nem verbete, até chave de ignição ele levara
consigo. Oh, movia-se por ligação directa (chante de cabos). Ainda bem, o resto
era de menos!
No fim das
contas, a bola que sempre quiséramos jogar desaparecia por miniatura entre os bens
que nos chegavam a granel.
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