quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Um kapedido só ao confrade Luís Fernando, agora na presidência, ya?

O dia de hoje está a ser uma verdadeira roda-viva, entre renovar documento da viatura e a presença em inadiáveis visitas familiares, o que me manteve desligado dos canais convencionais de informação. A meio da tarde recebi via redes sociais um comunicado de imprensa atribuído ao recém-empossado presidente da república (PR), João Lourenço (aka JLo) que dá conta do elenco que passa a constituir os serviços de apoio ao PR, uma geração relativamente jovem, da qual destaco o jornalista Luis Fernando (LF), de quem sou próximo pela faceta de escritor. Tomamos posse enquanto membros da União dos Escritores Angolanos no mesmo dia, finais de 2009. Foi por este vínculo que "se dei encontro" mais de perto com o homem, quando em 2015 veio a Benguela (ladeado, como diria o erudito, de sua esposa, a mana Paula Fernando), sob escolha do secretário-geral, Carmo Neto, para capitanear o lançamento oficial do livro de crónica O APITO QUE NÃO SE OUVIU, de sua excelência eu. Foi um encontro memorável e para mim emocionante, num fim-de-semana prolongado daqueles de só conseguir quarto de hotel por "tráfico de influências" do amigo Efraim, passe algum exagero. Voltando ao hoje. Não tenho até ao momento confirmação do próprio quanto ao cargo de Secretário para os Assuntos de Comunicação Institucional e de Imprensa do Presidente da República, mas a fonte diz-me que se trata de um dado oficial, pelo que, por esta via também, reforço os parabéns ao confrade LF e deposito votos de êxitos neste exigente desafio. E para não terminar sem "embirrar", até porque temos de aproveitar quando os nossos sobem ao poder, ó meu kota lá do Tomessa, Uige, estou já adiantar com um kapedido só. É assim, tipo, eh, ora, vejamos... Quando vier a ser objecto de notícia, a redacção fica só mesmo «o Secretário para os Assuntos de Comunicação Institucional e de Imprensa do Presidente da República, Luis Fernando». O «Dr.», herdado do posto, cai, faxavori, ya? Ainda mba era só isso. Obrigado.
 Gociante Patissa | Benguela, 27 Setembro 2017 | www.angodebates.blogspot.com
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terça-feira, 26 de setembro de 2017

Crónica | O papel do multicaixa na prevenção de conflitos

Benguela, cidade, anda movimentada, como devia aliás andar, a caminho de trezentos e noventa e seis anos de existência. É evidente que a data oficial está longe de ser consensual, havendo intelectuais que se indignam por entenderem que, em cada dia dezassete de Maio, festejamos a vitória militar do invasor colonial português, representado por Cerveira Pereira, sobre os nossos antepassados, autóctones Bantu.

Janota, conhecido por doutor muito antes até de tirar a licenciatura, procurava preencher o vazio que tem sido a sua cama, desde que a esposa viajou para a China. Por muito que gostasse e bebesse de filosofia, estava difícil o jejum (devo usar uma linguagem mais ou menos sóbria, já que tenho sobrinhos menores seguindo-me no Facebook). Vai daí que Janota deu um salto ali para as bandas da Sé Catedral, onde se diz haver um bordel. Assim como ao lado de cada direito anda o respectivo dever, pureza e fé têm sempre uma tentação à perna.

Em coisa de minutos, Janota tinha uma rapariga, expedita vendedora de orgasmos simulados e um canto para o labor e o sabor, não sem antes ficar claro o preçário. A menina fê-lo chegar à China por alguns instantes. Ora, completada a viagem, surgia um tipo de conversa mais ou menos imprevista para aquele segmento de negócio. «E agora, como vamos fazer? Posso pagar com cartão?», indagava o saciado, enquanto calçava as meias antes de botar a calça.

A rapariga olhou para ele, como quem diz, caramba!, está aqui um espertalhão. E antes mesmo que ela emitisse uma palavra, o cliente continuou justificando-se: «Sabes como é que é. É fim-de-semana, a função pública pagou. Já circulei pela cidade e cercanias, mas nenhum aparelho tem dinheiro. Mesmo a nível de macroeconomia, honrar os salários dos professores é um caso sério, já que eles não produzem como tal. É um sector nobre, muito importante, mas pobre. Com os militares é a mesma coisa. Não sei como vamos fazer, sabes? Eu gosto de pagar as minhas contas, acontece que não consigo tirar dinheiro do banco, sabes que aquilo enche que nem uma coisa doida.»

A rapariga ouvia, franzindo progressivamente a testa. Pensava por dentro, do tipo, esse gajo não quer com este monte de palavras que no final fique tudo por um crédito sine die, não? «Doutor, pela próxima, quando é assim, avisa antes. Estás a ver se hoje eu não trouxesse o TPA, íamos mesmo se pegar nas camisas. E até não fica bem. Vá, dá lá o cartão multicaixa. Hôko!, assim também querias quê?!»

Bom, ao menos o final foi feliz para o professor Janota, uma vez que a menina, sendo profissional com visão empreendedora, tinha a sua máquina de pagamento electrónico na mesma bolsa em que guardava os preservativos, pensos e lubrificantes íntimos, não tendo sido necessário, como ela mesma disse, «se pegar nas camisas». Como diria o ditado, para um esperto, esperto e meio.
Benguela, 25 Maio 2013
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Gociante Patissa, Benguela, 11 Dezembro 2012. In «O Apito Que Não Se Ouviu», 2015. Pág. 60-61. União dos Escritores Angolanos. 1.ª Edição. Luanda, Angola . 2015 Colecção: «Sete Egos»

(*) livro de crónicas disponível na Livraria Sucam e na Tabacaria Grilo, em Benguela, ou na sede da União dos Escritores Angolanos, em Luanda, sita no Largo das Escolas. Mil kwanzas o exemplar
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segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Crónica | Caro compatriota João Lourenço, acabe só com isso, ya?...

Foto de autor não identificado
Cada vez que me tratam por doutor (o que por acaso não sou, mas também em nada mudaria se fosse), carrego a inevitável culpa de não poder – evitando ser deselegante – dispensar prontamente tal deferência. Ultimamente até nos noticiários, temos sujeitos com o título académico, principalmente quando detentores de cargos públicos, muitos dos quais arredondados por excesso, dado que, em termos concretos, não passam de uma licenciatura.

Aí, resta ao cidadão acrescer à pilha de "vergonhas colectivas " esta mania do elitismo. Por que raio tem de ser a frequência universitária parte da nossa identidade? O indivíduo faz uma chamada telefónica e tu ouves depois do pigarrear aquele "daqui fala o doutor não sei das quantas", e ficas a prever no outro lado da linha o emissor a endireitar o nó da gravata ou eventualmente a tirar o pó do bico do sapato, como se não atendesse às suas necessidades fisiológicas socorrendo-se dos mesmos órgãos sensoriais que os demais mortais. E aquelas cenas deprimentes então de estar aos copos em mesa de bar e nos tratarmos por doutor disto, engenheiro daquilo, arquitecto e bla, bla, bla?... O lugar da simplicidade qual é mesmo?

De que adianta a excessiva formalidade se, na realidade, muito do que você precisa no dia-a-dia é resolvido na relação com o país informal? Os exemplos estão à mão de semear. O doutor cai no radar por excesso de velocidade e… resolve no momento com o regulador de trânsito. Tem algum parente doente, recorre a influências para melhor assistência. É professor mas o poder de decisão no mais elementar, como a reprovação (ou não) do aluno ou aluna com fraco rendimento escolar, é condicionado pelo telefonema do degrau acima na hierarquia. E se nos preocupássemos mais, sob o ponto de vista da ética social, com o funcionamento eficaz das instituições ao invés de investir o tempo em categorizar indivíduos?

É que já trabalhei com alemães, belgas, quenianos, americanos, italianos, espanhóis, australianos, ingleses, franceses, etc., bwé de PhD, alguns até diplomados em universidades do topo do ranking mundial, e a prática é tratar a pessoa pelo nome, ou quando muito por senhor/senhora. A propósito de tendências que acabam por nos elevar ao patamar caricatural, recordo a troça de uma antiga amiga e tutora australiana, isso no sector das ONG’s por volta do ano de 2006, segundo a qual é fácil topar um angolano em voos internacionais. E como? Porque é o que mais se preocupa em se agrilhoar (termo meu) em fato e gravata (onde os demais procuram viajar em trajes casuais e mais confortáveis), mesmo quando a estação que os espera no país de destino é o verão.

A nossa comunicação social é outra promotora do vício, sobretudo no tratamento dado aos comentadores (residentes ou itinerantes, que por vezes também não acrescentam nada de novo ao senso-comum), o que indirectamente passa a mensagem de não haver sabedoria em quem não ostentar um grau universitário. As rádios e televisões em alguns países que visitei (EUA, Alemanha, etc.) apresentam os interlocutores pelo nome e função, no que se pode inferir que já se fartaram dos doutorismos, onde o acesso à universidade é um dever, não uma questão de luxo e/ou barreira social.

Aqui chegado, e não sendo ainda eu de andar a pedir favores a governantes (talvez tenha pedido alguma vez em pequeno na era do partido único e um ano antes do fim da guerra ao meu próprio pai, mas não me lembro), ou exceptuando a cedência de salas para lançamento de livros, já na condição de escriba, vejo-me neste contexto obrigado a abrir uma excepção. Portanto, caro compatriota João Lourenço (o "president to be", como diriam os anglófonos), faça-nos o favor de acabar com este "vazio interior" de esfregar o grau académico na cara da sociedade, ya? Ainda era só isso. Obrigado.

www.angodebates.blogspot.com | Gociante Patissa | Benguela, 25 Setembro 2017
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quinta-feira, 21 de setembro de 2017

Crónica | Não me podem acusar é de não ter tentado singrar

Está a sair-se divertida a experiência da interacção via chat (sim, o chat, voltei a usá-lo em termos "boca livre" para atender os interessados em comprar a máquina fotográfica). ESTOU A VENDER UMA MÁQUINA NIKON D3300 NOVA (180 mil kwanzas). INCLUI MOCHILA, PEQUENO TRIPÉ E LENTE EXTRA 55-200mm. Negociação sobre formas de pagamento "inbox" (ou chat, excepcionalmente aberto para este fim). Ainda era só isso. Obrigado, Gociante Patissa, dizia o anúncio estampado no meu mural e graciosamente partilhado por outros amigos virtuais e não só. Quanto aos termos de pagamento, estes, reservei-os para o privado. Na verdade também não têem assim muito de voltas a dar. A condição é pagamento via banco, e ali é que a coisa roça o remoinho tragicómico. Na fila de frente das dúvidas que me chegaram, destacou-se pela pertinência a seguinte: “Quanto custa a máquina?” Tenho estabelecido, em conversas com pessoas chegadas, um certo paralelismo entre o Facebook e o ambiente de uma escola de condução, pelo seu carácter homogéneo (digamos misturador), onde volta e meia todos os níveis de ensino são encaixados na mesma turma, o mesmo que dizer da experiência de vida, das gerações e afins. A parte mais doce é do tipo “Vendes máquinas ou só tens uma”? No momento da resposta eu era capaz de jurar em como deixei isso claro no anúncio, pelo que ainda me ocorreu atribuir as culpas de um tal ruido na comunicação à oposição (como, de resto, tudo o que corre mal em Angola, não é?), mas você já sabe aquela preguiça… E pronto, acabei assumindo eu mesmo o benefício da culpa. Eram já quase meia-noite, se não mais. Lá regressei à rede social e acrescentei: Sim, está à venda. A máquina fotográfica é nova. Sai a pronto pagamento ao preço de 180 mil kwanzas. A entrega é imediata. Tinha-a adquirido para equipamento auxiliar. Ainda era só isso. Obrigado. Na sequência veio alguém ao chat pedir que fizesse fotografias do equipamento à venda. Não fiz, mesmo até para não decepcionar quem realmente teve a perspicácia de topar o ar de burlador visível na foto que tenho no perfil de Facebook. Ah, o nome, este meu, visto está, só pode ser de burlador. Juntamente com os contactos telefónicos dei o número da conta bancária, em nome de Daniel Gociante Patissa, do Banco BCI, o que, como se pode ver, são características de um burlador rodado na matéria e provavelmente já com as malas feitas para passar o resto de verão nas europas, para assim realizar o sonho de laifar com os 180 mil kwanzas do preço de máquina fotográfica, mais do que suficientes para alugar um jacto privado. Por fim, um dos clientes, talvez o mais conversador, intrigado, com razão, por não se lhe aceitar a modalidade de pagamento em cash, não escondeu que se sentia inseguro. Se preferires, tranquilizei-o eu, podes vir a Benguela amanhã. Ando com a máquina no carro e fazes o depósito. Como das dez da manhã (hora combinada para o encontro) para cá já passam largas horas, sem sinal do meu cliente, é bem possível que algum excesso de burocracia na procuradoria esteja a impedir o mandado de captura do presumível burlador. De maneira que me encontro arrepiado de medo, a tremer mesmo, na iminência de ser capturado. No final do dia, não me podem acusar é de não ter tentado singrar no empreendedorismo burlesco. Ainda era só isso. Obrigado. hahahah
www.angodebates.blogspot.comGociante Patissa, Benguela, 21 setembro 2017
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domingo, 17 de setembro de 2017

Citação

"Os comprimidos que são para curar ainda causam efeitos colaterais. Tens de curar os efeitos colaterais com mais comprimidos." (Ras Nguimba Ngola, 16. 09. 2017)
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sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Diponível para download | Programa ENTRE NÓS - Homenagem ao Dia do Herói Nacional, Rádio Benguela 15.09.2017 (poesia e trova)


- Trova/Músicas originais: Syrimus Mulaja (músico e compositor benguelense)

- Emissão e concepção: Rádio Nacional de Angola-Benguela, programa "Entre Nós", manhã de Sexta-feira, 15.09.2017
- Apresentação: Filomena Maria
- Poesia de António Agostinho Neto (1922-1979) poeta, médico e político angolano)
- Compilação, narração de poemas e fotografia: Gociante Patissa
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quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Diário | Dizer que alguém ‘está tão jornalista’ hoje em dia é ofensa?

“Com que então, numa altura em que as políticas estão preocupadas na esteira da reestruturação familiar, perseguindo o melhor desenvolvimento da criança, o senhor diz que está determinado, quer mesmo o divórcio?”
“Sim, doutor Juiz, ela foi longe demais!… É que tudo, menos isso!”
“Mas o que foi que a senhora aprontou ao seu marido afinal, que o tenha ofendido a este ponto?”
“Eu até não estou a ver, doutor Juiz, falando a verdade. Aquilo foi só uma conversa banal…"
"BANAL?! AIÉ? VISTE MESMO QUE FOI BANAL?!"
“Ó meu caro amigo, não se exalte! Contenha-se que estamos a tentar uma conversa civilizada para um desfecho definitivo airoso, e este seu tom não é o mais curial… Até porque a linguagem da lei é dura, mas não grita. Ou não é assim?”
“É desculpar, doutor… Oh, minha mãe debaixo da Terra! Você ia imaginar um dia um insulto destes arremessado contra aminha pessoa?…”
“Mas ajudem-me, caro casal, a perceber o problema. O que foi que se passou, se é que não estou a extravasar os limites da privacidade?”
“Então, eu, como marido, né?, só aconselhei que essa coisa de chegar à casa e encontro a mulher não bateu funji – que é carregador de macho – e só fica nessas comidas de crianças e pássaros, ah porque massa, arroz com feijão, bife, bitoque, etc., qualquer dia a pessoa arranja outra segunda via extra conjugal…”
“E então?”
“Aí é que ninguém esperava a ofensa que saiu da boca desta mulher, ó doutor Juiz. Assim estás a lhe ver tipo é madre em dia de preguiça, né? Hum! Boca dela, boca dela, boca dela!… Falou mesmo assim: ‘Hoje estás tão jornalista, pa!’”
“Mas dizer que alguém ‘está tão jornalista’ hoje em dia é ofensa?”
“Mas o doutor Juiz não é de Benguela ou quê?! Quando é assim anda a perguntar. Todo o mundo já sabe. Jornalista, eu?!O que é que a alma da minha querida mãe vai pensar da educação, da moral que me transmitiu, já sem falar do bom carácter e escrúpulos, hã?!”

Gociante Patissa | Benguela, 13 Setembro 2017
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terça-feira, 12 de setembro de 2017

Humor americano | O JARDIM E O VALOR DA ESTRATÉGIA (*)

Um senhor que vivia sozinho em Minnesota queria cavar a terra do seu jardim para plantar flores, mas era um trabalho muito pesado. O seu único filho, que o ajudava nesta tarefa, estava na prisão. O homem decidiu então escrever a seguinte carta ao filho:plantar 

"Querido filho, estou triste pois não vou poder plantar o meu jardim este ano. Detesto não poder fazê-lo porque a sua mãe sempre adorou flores e esta é a época certa para plantar. Mas eu estou velho demais para cavar a terra. Se estivesses aqui, eu não teria esse problema, mas sei que não me podes ajudar, uma vez que estás preso. Com amor, seu Pai."

Pouco tempo depois, o pai recebe o seguinte telegrama do filho:

"Pelo amor de Deus, Pai, não escave o jardim! Foi lá que eu enterrei os corpos".

Como as correspondências eram controladas na prisão, às quatro da manhã do dia seguinte, uma dúzia de agentes do FBI e polícias apareceram e cavaram o jardim inteiro, sem, no entanto, encontrar qualquer corpo. Confuso, o senhor escreveu uma carta para o filho, contando o que acontecera. Resposta do filho:
"Pode plantar o seu jardim agora, amado Pai. Isso foi o máximo que eu pude fazer para o ajudar, no momento..."
(*) Texto disponível em diversas fontes pela Internet pelo menos desde 2009, entretanto sem menção do autor. Título do blog Angodebates
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quarta-feira, 6 de setembro de 2017

segunda-feira, 4 de setembro de 2017

Crónica | Onde andará a bússola?

No bairro em que me fiz homem, os homens, os mais jovens, os intermédios e os de meia-idade, eram muito dados a festas. Isolando aqui as de aniversário, mais intimistas, ressalto as dos grupos organizados. Várias por ano. O réveillon era o apogeu em princípios da década de 2000 no bairro da Santa Cruz, Lobito. As festas, cada igual à sua antecessora, terminavam da mesma forma. Com pedradas. Umas mais a dar mais para o verbal, outras no entanto físicas mesmo, feridas e tudo. Testemunhei muitas delas como fotógrafo, mas não só. Contavam-se aos dedos de uma mão – se caso as houvesse – aquelas que terminavam tal começassem, felizes. Era como se o guionista de todas elas fosse um só. Seguia-se a próxima estação do ciclo, o mesmo entusiasmo de campanha, a mesma socialização, mas, também, o fim já previsível. Brigas. Talvez por isso não tenha recebido com o júbilo esperado por parte do especialista que a idealizou, falo da associação das eleições angolanas com festa, no caso a «festa da democracia». O povo eleitor, este, não pôde mais do que papagaiar o slogan, mesmo aqueles que abominam a implicação semiológica do termo (quando não descambam pelas bebedices, as festas costumam pulverizar decibéis da poluição sonora). E saímos de casa sem traumas, provavelmente convencidos que, uma vez ocorrendo à luz do dia, seria uma matiné, do tipo sunset, inofensiva até para crianças. Votamos, pois. Serenos. Cidadãos, pacíficos e pacifistas. E depois? Volvidas pouco menos de duas semanas, vivemos dias que aconselham aquele «cala-te ou fala algo que valha mais do que o silêncio». Prudência parece ser o conceito mais transversal neste quadro. Mas é um silêncio que me vejo forçado a romper por imperativos de consciência, sob pena de hipotecar a voz. Sou um simples escritor sem pretensão alguma de distribuir sermões académicos, como nos habituaram os nossos prendados sofistas, legitimados pelo quilate de seus diplomas. Até porque em matéria de realização neste campo, define-me melhor o que não consegui ser. Na crónica que escrevi aqui no Blog Angodebates no passado mês de Março, confessei logo no título como «Não gosto de eleições». O parágrafo de abertura dizia o seguinte: «E chega aquela fase de usar camisinha nas palavras. Já vamos na quarta. Assim manda a democracia, sistema de governo que, entre nós, tende a captar holofotes pela tendência de se embrutecer na sua faceta dos ciclos eleitorais, pondo em risco importantes conquistas da coabitação e do próprio exercício da cidadania». E acresci: «Francamente não gosto eu é do pico do processo que leva às urnas, em função da agitação social, nem sempre saudável e de sequelas indeléveis. Se em política tudo (parece que) vale, sou entretanto adepto de que qualquer que seja o sistema vale muito mais pelo quanto aproxima do que divide famílias. (…) No final do dia era suposto tornarmos às nossas casas em paz. Adversários, mas juntos por um ideário maior: Angola». Ora, desenha-se para dentro de cinco anos a incontornável realização de mais uma «festa da democracia» quando ainda não sabemos como vai terminar o novelo presente. Fica claro que tudo se resume à disputa… afinal. Para haver festa, precisaríamos de estar irmanados num mesmo lado. É o contrário. De um lado os que tudo acusam, do outro os que tudo negam. E a cada dia, vamos para a cama sem fazer ideia da conferência de imprensa que nos vai acordar, qual delas a mais atlética. Bem ao ritmo da onda, vai renascendo a cluster de «experts» sobre Angola na media mundial, sem falar das peças negativas nas grandes agências noticiosas. Oh, prezados mais-velhos da classe política, onde andará a bússola do entendimento? E nisto a nossa história tem algo a dizer: quando aumenta o número de sábios lá fora, é porque está a faltar sabedoria cá dentro. Ainda era só isso. Obrigado.

Gociante Patissa | Benguela, 04 Setembro 2017 www.angodebates.blogspot.com
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Cartoon

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domingo, 3 de setembro de 2017

Quote | "We forgive them for killing our children, but we don't forgive them for forcing us to kill their children" (Israeli propaganda against Palestine)

Nós perdoamo-los por matarem as nossas crianças, mas não os perdoamos por nos obrigarem a matar as crianças deles" (propaganda israelita contra a Palestina)
In Al Jazira, 03.09.2017
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A Voz do Olho Podcast

[áudio]: Académicos Gociante Patissa e Lubuatu discutem Literatura Oral na Rádio Cultura Angola 2022

TV-ANGODEBATES (novidades 2022)

Puxa Palavra com João Carrascoza e Gociante Patissa (escritores) Brasil e Angola

MAAN - Textualidades com o escritor angolano Gociante Patissa

Gociante Patissa improvisando "Tchiungue", de Joaquim Viola, clássico da língua umbundu

Escritor angolano GOCIANTE PATISSA entrevistado em língua UMBUNDU na TV estatal 2019

Escritor angolano Gociante Patissa sobre AUTARQUIAS em língua Umbundu, TPA 2019

Escritor angolano Gociante Patissa sobre O VALOR DO PROVÉRBIO em língua Umbundu, TPA 2019

Lançamento Luanda O HOMEM QUE PLANTAVA AVES, livro contos Gociante Patissa, Embaixada Portugal2019

Voz da América: Angola do oportunismo’’ e riqueza do campo retratadas em livro de contos

Lançamento em Benguela livro O HOMEM QUE PLANTAVA AVES de Gociante Patissa TPA 2018

Vídeo | escritor Gociante Patissa na 2ª FLIPELÓ 2018, Brasil. Entrevista pelo poeta Salgado Maranhão

Vídeo | Sexto Sentido TV Zimbo com o escritor Gociante Patissa, 2015

Vídeo | Gociante Patissa fala Umbundu no final da entrevista à TV Zimbo programa Fair Play 2014

Vídeo | Entrevista no programa Hora Quente, TPA2, com o escritor Gociante Patissa

Vídeo | Lançamento do livro A ÚLTIMA OUVINTE,2010

Vídeo | Gociante Patissa entrevistado pela TPA sobre Consulado do Vazio, 2009

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