domingo, 31 de março de 2019

(arquivo 4) Diário | FALA JÁ: MAS PERDOAS OU NÃO?!

“Ouve, vizinho! Eu vim a bem. Estou aqui para falar contigo, porque, é assim… na igreja, falaram uma coisa que até agora não consigo dormir bom sono.”
“Outra vez, vizinha?! Mas você não me deixa só em paz porquê?”
“É mesmo a paz que me trouxe, homem! Falaram tudo o que não está perdoado na face da Terra, no céu também não. Se eu morrer amanhã, não tenho direito ao paraíso.”
“Isso é problema teu!”
“Problema meu? Disseste quê?! O vizinho está a brincar comigo. Só pode!”
“Não, é engraçado que não estou. As feridas que me ofereceste ainda não curaram. Volta quando eu tirar o gesso e continuamos esta conversa.”
“Esperar mais o quê?! Mas o vizinho não ouviu aquele jovem na televisão, hã, português já não é português na ponta da língua, engravatado, que falou que o limite de vida do angolano é só 46 anos? Com 50 anos nos cornos, você pensa que estamos a comer para crescer mais? Estamos mais é a viver para morrer. Fica já saber!”
“O gesso sai daqui a 45 dias. Nessa altura você aparece e te digo se já estou em condições de falar de perdão, ou não.”
“E se eu cair amanhã aí na rua, atropelada como um cão? Já viste o risco de perder o reino dos céus, só porque o torto do meu vizinho não me quer perdoar? Afinal esta tortice vai-te levar aonde? É por essa coisa de complicar já muito que se lutamos…”
“Desculpa, não lutamos. Com mulher não luto. Foi mais uma agressão histérica tua. E porquê? Por ter dito que não era correcto a vizinha levar para a casa um vaso de flores que todos os vizinhos contribuíram para enfeitar a rua no dia de Natal”.
“Eu só levei porque não tinha árvore de Natal em casa… Aliás, mesmo até desde que plantamos a árvore no vaso, como eu até era a pessoa que mais regava… né?”
“Sim, mas a ideia não era essa. O que é de todos deve ser decidido por todos.”
“Eu também, se tivesse marido que me comprasse árvore de Natal, não ia levar para casa o vaso… mesmo a minha prima, que mora noutro bairro, também construiu quintal e cercou o chafariz do bairro em casa. Como é solteira, ninguém lhe chateou. O vizinho já como é que tem boca comprida, viu que sou mulher, queria se meter comigo. Você pensa que a tal mulherice está espalhada em todo o corpo ou quê? Eu te parto os cornos, ouviu? Agora estás ali com o braço no gesso.”
“Vizinha, agora, se faz favor, vai tomar banho, que eu vou descansar, ya?”
“Mas é preciso ressuscitar Mahatma Gandhi para o vizinho entender? Já naquele tempo ele dizia que o perdão é dos fortes, os fracos não sabem perdoar.”
“Ah, também chegaste a agredir o coitado do Mahatma Gandhi?”
“Eu já falei, vizinho. A bem ou a mal, vais ter que me perdoar. Se for necessário vou lutar outra vez contigo. Daqui é que não saio sem perdão. Fala já: mas perdoas ou não?!”

www.angodebates.blogspot.com | Gociante Patissa. Benguela, 30.12.15
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sábado, 30 de março de 2019

Pastor da IEBA alvejado por crente dentro da igreja

Um cidadão de 26 anos, membro da Igreja Evangélica Baptista, foi detido pelo Serviço de Investigação Criminal, por tentativa de homicídio frustrado contra o pastor da referida congregação religiosa, ocorrido no passado dia 24, no interior do templo, localizado no bairro do Golfe 1, município do Kilamba Kiaxi, em Luanda.

Texto: Jornal de Angola | Yara Simão | 30.03.2019

O móbil do crime, segundo fonte do Serviço de Investigação Criminal, tem a ver com o facto de o referido membro ter solicitado ao pastor autorização para efectuar curas divinas e apresentar aos fiéis o seu testemunho, o que foi prontamente rejeitado.

Após a rejeição, o indivíduo que se fazia acompanhar de uma pistola de marca Star, sacou de imediato e efectuou dois disparos, tendo alvejado a região da clavícula do braço esquerdo da vítima, de 57 anos, que foi mais tarde evacuada para o Hospital Geral de Luanda, no Kilamba Kiaxi, onde se encontra internado.

Esse indivíduo faz parte de um grupo de 86 marginais apresentados quinta-feira pelo Serviço de Investigação Criminal (SIC), detidos por prática de crimes diversos, numa operação levada a cabo em Luanda, no período de 13 a 27 de Março, no âmbito do combate a crimes violentos.

Nessa operação, foi também detido um elemento que ostenta a patente de 3º subchefe da Polícia Fiscal, envolvido no crime de ho-micídio voluntário, por disparo de arma de fogo, com uma pistola do tipo “Jerico”, em que a vítima foi o cidadão António Francisco João, 43 anos.


Imagem: Guiame
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Em linhas tortas (08/19)


Com acções isoladas não se promovem hábitos de leitura. Olá! Começo a reflexão breve de hoje nesta rubrica de forma apriorista a respeito do tão propalado desiderato de massificar os hábitos de leitura. O que não falta são boas intenções, felizmente, só que estas acções, para darem frutos, precisam de um olhar holístico. Por exemplo, é frequente, para quem está neste mundo da escrita, receber convites para participar em feiras e/ou oferecer exemplares para tais eventos ou campanhas de doação de livros. São gestos levados a cabo por organizações, algumas informais, outras vinculadas a instituições de ensino, geralmente em datas comemorativas. A lógica parece ser a seguinte: se a pessoa escreve, logo tem exemplares em casa. Ora, tendo exemplares e carecendo de ser lida, a pessoa ganha doando os seus livros. E em parte até faz sentido. Só mesmo em parte, uma ínfima parte. A questão é que o livro funciona um pouco como ocorre - perdoem-me a analogia - naqueles casos em que o homem se queixa de a sua parceira não aceitar/gostar de usar o preservativo nas relações sexuais. Só que depois, vendo bem, a gente questiona se alguma vez o uso da camisinha foi tema de conversa e a resposta é negativa. Ora, então não deveria o artigo ser objecto de conversa permanente? Com o livro é mesma coisa. Se não se fala do livro constantemente, da sua importância e de como instiga a reflexão ou o humor, de nada adianta impingi-lo “à queima-roupa”. Não é por ser dado de presente que se torna mais atractivo. Os hábitos de leitura passam também e fundamentalmente pela promoção da leitura como lazer. O caricato é que muitas destas organizações “solidárias” que solicitam aos autores/escritores livros de oferta não têm, em boa verdade, relação de amizade com o livro nem com a dimensão lúdica do mesmo. E como quase nunca se sentem motivadas a marcar presença em sessões de lançamento e autógrafos, oportunidades públicas e soberanas de manifestar algum apoio moral e aproximação ao autor, também não se percebe que há uma vertente económica no processo de edição do livro. Não se leva em conta que a despesa é do editor, que não conta com incentivos nem do Estado nem do sector empresarial (na ausência da lei do mecenato); que e o escritor só ganha menos de 20% da venda por livro, tendo de pagar do próprio bolso cada exemplar que ofereça ou as deslocações para presenciar feiras. Resumindo: a oferta não devia ser induzida. Ainda era só isso. Obrigado.

Daniel Gociante Patissa | Catumbela, 30.03.2019 | www.angodebates.blogspot.com

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sexta-feira, 29 de março de 2019

(arquivo) Diário | Mas lá na sua casa não tem regras?!

"Desculpa, minha senhora. Assim não pode de entrar…”
“Não posso, como?!”
“Do jeito que a senhora está apresentada, é só ler o comunicado da direcção. Por acaso, não mente…”
“MAS ASSIM ESTOU MAL?! ME FALA MESMO, SE CALHAR ESTOU A FICAR CEGA E AINDA NÃO DEI CONTA. ASSIM UMA GAJA ESTÁ MAL?”
“Bem, segundo só a papelada, assim essa blusinha de parto-os-cornos, calções subidos, sinceramente, o comunicado não aprova essa ética…”
“Eu só vou ao ATM, ó senhor segurança!, esse multicaixa que está no corredor, não vou entrar nos escritórios… Nem quero saber da vossa rádio para nada!”
“Mas é isso mesmo! Uma vez que o aviso está na porta desde o ano passado, e as outras pessoas todas já costumam vir aqui e cumprem, então da porta para dentro, do jeito que a senhora está, contraria…”
“Mas esse país também!… Vocês têm de viajar mais, meu senhor! Estão muito atrasados!…”
“Assim atrasado de quê?”
“Em Portugal ainda a pessoa entra nas instituições de fato-de-banho, quase. Aqui é que vão permanecer nestas leis velhas?!”
“Minha senhora, o documento está ali. Lê só, faz favor.”
“NÃO PRECISO DE LER NADA…”
“Então assim não estou a endender. Mas lá na sua casa não tem regras? As visitas não respeitam as tuas regras? Ainda é só isso que quero saber."
“Seja como for…”
“Então… aqui também é a mesma coisa. É só isso, não tem mais nada… Agora, se a senhora, no meu posto, quer me ensinar o contrário, quer só passar por cima da ordem, então não estou aqui a fazer nada!...”
“Mas eu não sou vossa visita… Eu venho aqui por causa do meu dinheiro que preciso de levantar no ATM…”
“Mas o aparelho está dentro de uma instituição. Ou não é isso, senhora? Não sei se está a acompanhar o meu raciocínio…”
“Ouve cá, ó senhor segurança! Eu sou professora. Além de professora, sou uma pessoa formada, sou socióloga. E sei como funcionam as culturas de cada povo. E posso mesmo falar…”
“Eu só estou a cumprir o meu trabalho… Não venho com as ordens da minha esposa de casa… é a ética…”
“Aié? Ética do jeito que estou não posso entrar, né? Você acha que eu não sei que passam a vida a fornicar mulheres nestes gabinetes e a desviar dinheiros? Estão mais é a dar cabo do país, e isso ninguém trava! Agora, uma gaja a vir do ginásio não pode entrar porque - fionko, fionko. Vai à merda, pá!”
“Isso até se a senhora está a discutir comigo, é só já falta de compreensão… Fica mais melhor vir amanhã cedo e refilar na pessoa que autoriza as ordens, o director. Mesmo essa parte de fornicar, como a senhora já é que viu, pode também aumentar na conversa. Eu aqui só cumpro…”
“Eu sei. Mas você mesmo e a pessoa que dá essas ordens precisam de viajar mais, ouviste?! VÃO SE LIXAR, MAIS É…”
“Mas lá na sua casa não tem regras?!"

www.angodebates.blogspot.com | Gociante Patissa | Catumbela 20.10.2017 - 29.03.2019
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Em linhas tortas (07/19)

Vejo crescerem na última década indicadores preocupantes de um novo perfil de actores sociais: (1) A prática de um activismo oco em bagagem intelectual, assente no puro entusiasmo, na auto-promoção, na teoria da conspiração e no monopólio da verdade absoluta, substituindo a reflexão pela polémica crónica (não poucas vezes imatura e avessa à elevação de se retratar quando se falha ou se falta com a verdade em uma determinada intervenção). Vai caindo em desuso aquela consciência cidadã e pedagógica de expor a mensagem com a devida coerência discursiva e a correcção ortográfica/gramatical, brindando-nos as redes sociais com o poder conferido a todo o cidadão de ser automaticamente emissor/editor. Não faltam comunicadores sem o hábito sequer de (re)ler os seus próprios textos, já para não tocar no quesito "lógica". Parece haver uma espécie de torneio de quem desleixa mais. Só de pensar que no passado os professores chegavam a dar palmadas por erro na ortografia... (2) Por outro lado, despontam estudantes e fazedores de opinião passivos, que agradecem cada informação recebida, do género quem queixar primeiro é que tem rezão (no lugar do instinto de pesquisar a veracidade num google, por exemplo, sendo por isso alvos fáceis e retalhistas de piadas e falsas notícias vendidas como informação séria, já que em muitos casos também o leitor não passa do título da matéria). E perante um problema a debater, a escolha emotiva do lado a defender antecede a construção do argumento. E há quem creia que um palestrante charmoso, bem maquilhado, é a chave para tudo, até para clarificar o óbvio, o provérbio, o aforismo. Enfim...
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quarta-feira, 27 de março de 2019

Citação

"Há cerca de dez anos um amigo defendia que o problema do país era fundamentalmente de corrupção. Eu retorquia que também era de incompetência, pois o mau funcionamento das instituições favorecia o florescimento da corrupção, embora compreendesse que a recíproca também era verdadeira. Hoje estamos os dois de acordo que a corrupção diminuiu enquanto a incompetência aumentou." (Fernando Pacheco, agrónomo e líder da sociedade civil angolana.

In revista África21, Nº 137, pág. 41, Luanda, Angola - Março 2019
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quinta-feira, 21 de março de 2019

(Arquivo) Humor | MANUAL DE PROCEDIMENTOS DO ASSALTANTE

Certo assaltante, em pleno exercício de funções, pula o muro da residência de missionários na pacata vila da Catumbela, que tinha no seu quintal uma marcenaria com materiais e ferramentas valiosíssimos. A residência não tem guardas, ou porque os celibatários o dispensassem ou porque não tinham condições de o remunerar. Disso andava bem informado o profissional do roubo. A noite é de cacimbo, tudo o que pessoas normais podem querer é aconchegar-se bem fofinhos na mantinha. O gatuno até já faz contas do quanto irá ganhar. Para seu azar, um dos padres, sabe-se lá por que insónias, acorda e flagra o gatuno. Instantes depois, os demais residentes se juntam. O resto é amarrar o gatuno, palmatória preparada e tudo para aplicar um correctivo. "UM PONTO DE ORDEM!", exclama o ladrão, para a surpresa dos donos de casa. "SENHOR PADRE, É ASSIM: PRIMEIRO AINDA NÃO É BATER. ACONSELHEM!"

(Adaptaçao da cena contada pelo Hito Virgílio, amigo de adolescência, no bairro Santa Cruz, Lobito) | www.angodebates.blogspot.com
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quarta-feira, 20 de março de 2019

Aquele meu parente de nome Daniel Gociante Patissa esteve na manhã de hoje no Instituto Superior Politécnico Jean Piaget de Benguela a cumprir a missão de arguente do painel de júri na defesa de monografia de licenciatura de um estudante no curso de Ensino do Português e Línguas Nacionais, opção Umbundu

É a segunda vez que lhe é colocado pela direcção da universidade este tipo de desafio, coincidentemente fazendo equipa com a Dra. Natália Viti no papel de presidente do júri. Foi bom rever as amigas Ana Ukuahamba e Margarida Kangunga, sem falar do mano David Calivala, docente do ramo, assim como o prof Mateus Cavala, que foi tutor do hoje arguente na licenciatura em linguística especialidade de inglês há quase sete anos. Ndapandula
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sábado, 16 de março de 2019

PRÉMIO LITERÁRIO ANTÓNIO JACINTO | Prazo de recepção das obras foi alargado até finais de Maio


Oliver Quiteculo ‘O Cronista’, vencedor da edição 2018
 com o livro de contos
Mahamba
O Ministério da Cultura, através do Instituto Nacional das Indústrias Culturais e Criativas (INICC), decidiu estender o período de recepção das obras concorrentes ao Prémio Literário António Jacinto, edição de 2019, até ao próximo dia 30 de Maio.

O prémio literário constitui uma homenagem ao poeta António Jacinto e é um galardão de revelação para obras inéditas de autores nacionais que procuram afirmar-se no mercado. O prémio tem como objectivos primordiais incentivar a criação literária e promover o surgimento de novos autores no domínio da literatura.

Patrocinado exclusivamente pelo Banco de Poupança e Crédito (BPC), o concurso anual [instituído em 1993] atribui ao vencedor de cada edição a quantia de cinco mil dólares norte-americanos em moeda nacional e a publicação da obra vencedora pelo INIC.

Os concorrentes devem enviar as obras dentro de um envelope grande, fechado e assinado com pseudónimo literário, com a identificação completa e uma fotocópia do Bilhete de Identidade, em envelope pequeno fechado, bem como a obra concorrente, em três exemplares digitados a dois espaços em folhas A4, encadernadas e assinadas com o pseudónimo.

A correspondência deve ser remetida para o endereço: Prémio Literário António Jacinto, Instituto Nacional das Indústrias Culturais, Caixa Postal 1248, Rua Cirilo da Conceição Silva n.º 7, 2º andar, Luanda.


Texto: Jornal de Angola, 16.03.2019
Foto: Neovibe
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(arquivo) Diário | E O SENHOR É JURISTA?

"Bem, caros convidados, daqui a pouco o nosso debate vai ao ar. Poderemos ter intervenção de ouvintes via telefone."
"Estamos prontos, caro senhor jornalista."
"Ora, a si já conheço e... a si também. Desculpe-me o senhor que vem pela instituição X: no seu caso, como quer o apresente?"
"Vou falar na qualidade de jurista... sem problema nenhum!!!"
"E o senhor é jurista?"
"Bem, eu trabalho na Associação como relações públicas, às vezes estafeta, e auxilio na secretaria com arquivos documentais..."
"E qual é a sua formação?"
"Estou a concluir o Médio, mas ainda dei uma pausa."
"Então o senhor não é jurista mas pode falar na qualidade de jurista?"
"A minha esposa é bacharel em Direito..."
"Pronto, não tem problema, vou-lhe tratar pelo nome."
"Você é que sabe, Ok?

Gociante Patissa, Benguela, 15.04.2016 (Adaptação)

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sexta-feira, 15 de março de 2019

(arquivo) Diário | VOCÊS NÃO VÃO ESPANTAR A CAÇA, OU VÃO?

(I)
"Atenção, atenção!!! Assim estamos a passar. A praça é grande, cada um fica já com o dinheiro na mão! Xé!, você aí, ó cidadão! Não estás a ver que a Fiscalização está a passar?"
"Como o caminho não passa na minha testa, ainda achei que não devia ter medo."
"Passa a taxa, rápido!"
"Taxa de quê?"
"O pagamento diário da bancada! Estamos aonde afinal?! Essa merda tem leis ou não?!"
"Acho que o país tem uma história..."
"Meu camarada, o tempo é dinheiro. Já Arranquei a ficha do bloco de facturas. É só pagar e mais nada!"
"Então não estou a ver bem o porquê que lutei. Um gajo entrou na tropa criança, combater sem folga de estudar, desmobilização sai sem emprego. Assim se hoje tenta na venda precária, ainda é perseguido pelo Estado que serviu?"
"Estás a brincar... É a tua última palavra?! Primeiro o camarada cumpre, depois é que reivindica. Nós também são ordens superiores que estamos a cumprir, ouviste, né?. "
"Ainda afinal quero ver esse tal vosso superior, tratar como homens peito a peito (corpo a corpo era já noutro tempo)..."

(II)
"Chefe! Ó chefe! Um ponto ainda..."
"Estás a fazer o quê no gabinete em hora de ponta?!"
"No mercado encontramos um reaccionário. Pede a comparência do chefe."
"Como é que é o gajo, assim corporalmente?"
"Músculos que não tem no corpo tem na boca, ó chefe. Nós até não passamos..."
"E qual é o estado de opinião e comentário dele?"
"Diz que não entende o fundo de dedicar a vida inteira combatente se hoje nem direito de sobreviver lhe resta... Isso é coisa de se falar, ó chefe?!"
"Mas isso que ele disse é grave, é política! E quando ele explana, é com força ou devagar?"
"Com força. O mercado até pára para ouvir."
"Abafa. Técnica de exaustão, ouviu?"

(III)
"Você é o reaccionário, certo? Olha, fomos despachar com o chefe sobre o nosso diferendo..."
"Nosso diferendo?..."
"Ora essa! Se nós, os Fiscais, em pleno gozo dos nossos deveres de zeladoria, somos interrompidos na cobrança da taxa diária..."
"Eu quero falar como homens com o vosso chefe, saber onde cumpriu a vida militar..."
"Não vale a pena, ele é muito ocupado!!! Também já abordamos a tua inquietação..."
"Quando é que o vosso chefe vem aqui?"
"Continuando. Você, só mesmo você, está isentado de tributar a taxa diária de bancada. Mas não penses que é porque refilaste, não. Em toda a parte do mundo há autoridade. Cumpre-se primeiro, reclama-se depois."
"Ó cunhada, vem ouvir! Esta mulher que estão a ver cheia de poeira é cunhada por afinidade, viúva de um companheiro de trincheira. Como é que eu não pago mas ela tem que pagar, quando a história é igual?"
"Por acaso, o chefe não deferiu sobre o caso dela, mas é pacífico. Conta como indigente. Portanto, agora, por favor, vocês não vão espantar a caça, ou vão?"

www.angodebates.blogspot.com | Gociante Patissa. Benguela, 28 Maio 2016
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quinta-feira, 14 de março de 2019

Crónica de Germano Almeida | RACISTAS OU NEM POR ISSO?


Foi nos inícios dos anos 60 do século passado, certamente por pressão dos movimentos independentistas e urgente necessidade de provar ao Mundo que éramos todos, brancos, pretos, amarelos, mulatos e companhia, todos iguais perante a Nação, que Portugal começou a integrar os naturais das ex-colónias nas tropas da Marinha. E lembro-me de um navio de guerra português que fundeou no porto da vila de Sal-Rei donde desembarcaram uma quantidade de jovens negros, bem tratados e fardados de um branco impecável e imaculado, e que saíram a passear e conhecer as ruas da vila. Quando passaram pela nossa casa a minha mãe viu-os e chamou-nos, Venham ver uns pretinhos de guerra a passar! Fomos ver. Eram muitos e rigorosamente fardados e bonitos, passeando em fila quase militar, sorrindo para nós, cumprimentando alegres. Depois que ficámos só nós, disse para a minha mãe, Mas espera, tu também és preta! Não, respondeu sem hesitar, nós somos cabo-verdianos.

Os cabo-verdianos em geral sempre tiveram alguma dificuldade em aceitar a sua condição de negro. Há muitos exemplos históricos a comprovar essa asserção, alguns bem caricatos como o caso de um administrador da ilha do Maio no século 18, negro como um carvãozinho, mas que se apresentou como branco a estrangeiros que visitaram a ilha. Pode ter sido o conhecimento dessa fraqueza nacional que levou Baltazar Lopes, no prefácio a Aventura Crioula de Manuel Ferreira, a afastar a nossa eventual condição quer de africanos quer de europeus, para sem mais nos afirmar orgulhosamente cabo-verdianos. E dentro dessa linha de pensamento, costumo defender, sem qualquer fundamento científico, é verdade, a existência de mais uma raça, a juntar-se às já existentes, e que é a raça cabo-verdiana.

Penso que se alguém com capacidade e conhecimento e vontade, pegasse a sério nesse postulado, bem perfeitamente que sem grande esforço poderia reencher o novo conceito de mais uma raça no mundo, a cabo-verdiana, caracterizando-a como tendo sido historicamente composta por todas as raças e culturas que aqui aportaram e se juntaram e se misturaram e se multiplicaram e acabaram criando raízes e se espalharam pelas ilhas todas, todos moldados por uma terra onde tiveram que quebrar pedras para inventar comida e que manenti manenti não se acanhava de os matar à fome.

Ora aconteceu que na sua intervenção parlamentar durante a reunião da Assembleia Nacional a deputada por África, eleita nas listas do PAICV, discutindo a mobilidade e integração na CEDEAO, insurgiu-se contra o tratamento que considera discriminatório a que viu serem sujeitos os africanos que pretendem vir para Cabo Verde, com exigências que considera vexatórias, e concluiu que até se poderia classificar isso tudo como discriminação racial.

Foi um deus-nos-acuda! Imediatamente os deputados apoiantes da situação e que estavam sentindo o Governo acossado, logo agarraram o mote e não mais largaram o osso. Racismo não! É grave acusar as pessoas de racismo, porque o cabo-verdiano, o povo cabo-verdiano, não é racista. Mas o mais grave é o PAICV, os deputados do PAICV, ouvirem essa afirmação atentatória da dignidade nacional sem reagir, aceitando de facto uma situação que deixa de rastros o povo cabo-verdiano…

De modo que a dúvida está lançada, e como não há não que não contenha um sim, vamos aguardar pelos próximos capítulos a ver se sim ou não somos racistas ou simplesmente cabo-verdianos.

In revista África21, Nº 137, pág. 58, Luanda, Angola - Março 2019 
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quarta-feira, 13 de março de 2019

Livro do mês na Revista África21 | O Homem Que Plantava Aves, De Gociante Patissa: Desfile Alegórico Da Praxis Popular Benguelense | Por José Luís Mendonça


LIVRO DO MÊS | Sugerimos ao leitor que pegue na obra O Homem que Plantava Aves, de Gociante Patissa, e comece por ler o último dos contos, Porque é que a Cauda de Lagartixa Cai? Este destoa do conjunto de estórias. É a voz de um contador de estórias anónimo, que Gociante talha com o formão da língua portuguesa num produto literário novo.

Por José Luís Mendonça, in revista África21, Nº 137, pág. 73/74, Luanda, Angola - Março 2019 

A seguir, leia-se A Lenda do Soberano Ndumba. Muito próxima da última estória, pela colagem ao nativismo, difere dela pelo recurso descritivo que caldeia todo o livro. É o que lemos neste trecho: “Concebo sipaio como milícia, um espécime rudimentar criado pela autoridade colonial, mas cujo poder se cingia sobre as comunidades indígenas, irónico instrumento de repressão de colonizados contra os seus semelhantes.”

O leitor atento pode constatar que certos recantos linguísticos trazem reminiscências do refinamento discursivo de Óscar Ribas. Nessa conformidade, o valor literário desta colectânea de contos não reside tanto no seu espectro linguístico, senão no registo fonético e no desfile alegórico da praxis popular benguelense de que se constrói a narrativa.

O Homem que Plantava Aves, lançado pela editora Acácias nos dias 14 e 15 de Dezembro nas cidades de Benguela e do Lobito, reúne 15 contos, de cuja leitura se extrai um valioso repositório de usos e costumes da região de Benguela. Neste sentido, esta obra é rica pelo seu pendor etnográfico. Como explica o autor, na nota introdutória, “Temos em mãos uma colectânea de ficção com esparsas referências autobiográficas do autor e do espaço de língua e cultura Umbundu, o que implica atravessar uma vez ou outros temas complexos, como as memórias do tempo de guerra civil, ou as sequelas do pós-conflito, não fugindo o devaneio literário ao papel de confrontar a humanidade com as suas contradições.”

Um aspecto peculiar de O Homem que Plantava Aves é a reunião, num mesmo texto, das técnicas do jornalismo, da literatura e da resenha histórico-social. Mas, quem é o homem que plantava aves? Lumbombo (raiz), paralítico à nascença, tal como Kahito, do griô Wanhanga Xitu, é um prodígio na sua aldeia.

Esta raiz paralítica produziu mais riqueza na aldeia que boa gente de corpo saudável. Primeiro, foi a horta. Que atraiu tantas aves, ao ponto de os vizinhos conjecturarem que Lumbombo passara, de simples domador, a plantador de aves. Preocupado em “atrair simpatia feminina aprendeu a esculpir pentes.” Até que, “com as suas poupanças, passou o mestre Lumbombo a investir na criação de gado. De frágil a prodigioso, cativava beldades e acumulava bens sem sair do lugar, sem conhecer o caminho da lavra sequer, já que só se podia mover arrastando-se.” Esta estória deslumbra por essa razão. Uma lição de filosofia se extrai no final: “Não é com as pernas que corremos, é com o pensamento.”

Gociante Patissa, qual plantador de aves literárias, reúne na sua lavra vozes longínquas de mais-velhos e as vozes do seu quotidiano benguelense, numa bela sinfonia de escrita.

É com o pensamento que Gociante Patissa, o plantador de aves literárias, corre, de estória em estória, reunindo na sua lavra vozes longínquas de mais-velhos e as vozes do seu quotidiano, numa bela sinfonia de escrita, onde, por vezes, encontramos trechos a raiar a textura da crónica, ou pedaços de ficção escritos como quem dança um som de ngoma mítico, tal é a ordem de sub-esferas culturais e psico-sociais que se entrechocam nas estórias.

Em Nossa Luta Vossa Luta, abre-se o pano do palco histórico angolano, tal como Manuel Rui o abre em Quem me Dera ser Onda. Com uma pitada de sarcasmo ajindungado. Assim lemos: “Mas há por aí pólvora na via pública a apanhar restos nos contentores, na birra do trânsito, na estatística da investigação criminal.” O mesmo jindungo pica num outro conto, A Chefe e os Homens, que faz a apologia da mulher na política.

A Comissária Comunal da Equimina, ao tempo do partido único, é alvo do machismo impenitente que grassa em Angola, principal. A Comissária havia espancado o responsável de uma loja que tinha batido numa viúva e estava a ser alvo de inquérito. “Dez dias depois saía o tão temido veredicto Primeiro. Recrutamento da senhora agredida para os quadros da OMA e Promoção da Mulher. Segundo. Exoneração do chefe da loja e responsabilização criminal do mesmo. (...) Contudo, este resultado levou os detractores, que já davam como certa a exoneração da chefe, a acreditarem ainda mais que a política é suja.”

Depois desta colherada de caldo de peixe seco, cabe a vez ao leitor de comprar O Homem que Plantava Aves e saborear o caldeirão real e, ao mesmo tempo, fantasioso, que nos mostra outra parte de Angola, das vidas que por lá nascem, crescem e desaparecem e da sua história que, por obra de Patissa, deixam um rasto indelével no livro.

Daniel Gociante Patissa nasceu em 1978 no Bocoio, Benguela. Tem licenciatura em Linguística, especialidade de Inglês, pela Universidade Katyavala Bwila. Membro da União dos Escritores Angolanos, foi distinguido com o Prémio Provincial de Benguela de Cultura e Artes 2012, na categoria de Investigação em Ciências Sociais e Humanas, «pelo seu contributo na divulgação da língua local Umbundu, na perspectiva das tradições orais, através do conto e novas Tecnologias de Informação e Comunicação». Anima os blogues www.angodebates.blogspot.com e www.ombembwa.blogspot.com
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(Arquivo) Diário | ENTÃO GOZAS DE IMUNIDADES COMO?

"Ó senhora, eu já falei. Ainda não sou casado, nunca bati uma mulher. Por isso, me cumpre só, ya? Não me obrigues a fazer uso de força, estás a ouvir?!"
"Isso é teu problema, ó mano. E eu é que vou fazer o quê, se as mulheres deste mundo não te aceitam?! Larga mais é o meu negócio, pá! Vá ser homem noutras coisas, entendeste?!"
"Já que não queres entregar a prova da infracção, estás renitente, é só subir na carrinha!..."
"Eu?! Tchaaa!!! Nunca!"
"Estás a te confiar em quê?"
"Nós gozamos de imunidades."
"Ó dona, vá, vamos embora, já falamos muito! Voz de mando! Eu sou autoridade!"
"Oh! Mano, o mano não é fiscal?"
"Ainda perguntas?!"
"Fiscal não é civil? Como mais é que vai ser autoridade?"
"Só falta mesmo pouco, vou-te meter nas algemas. Isso então é desacato!"
"Desacato como?! Te fiz o quê?"
"A senhora estava a fazer pracinha na berma, por cima ainda a estrada é nacional..."
"Não vamos só falar à toa ainda, mano! Uma pessoa sozinha assim já vira pracinha?! Afinal se a outra é zungueira..."
"Não, não! A mim não enganas! Já namorei com uma gaja de Malanje que me ensinou umas quinze palavras de kimbundu. Zungueira significa mulher que circula, ambulante. Não é o caso. Você estava parada..."
"Mano, na vossa família andam, andam, andam, nunca ficam cansados?"
"Por acaso, tens ali o cartão de ambulante para vender essa ginguba torrada, abacate, mandioca e banana?"
"Não."
"Tens alvará de retalhista?"
"Não preciso..."
"Então gozas de imunidades como?"
"Mão então o meu marido não é chefe de departamento?! Alguma vez viste no Prado dele último grito algum selo de taxa de circulação?"

www.angodebates.blogspot.com | Gociante Patissa | Catumbela, 17.06.2018
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segunda-feira, 11 de março de 2019

Crónica | Uma oração a “o ocaso dos pirilampos”*


Banny de Castro, Benguela, 10.03.2019

Hoje por hoje, quando um bom leitor se depara com livro de autor desconhecido, é regra que reaja de forma cética e desdenhosa. Olha para a capa, para a contracapa, para as badanas; mesmo que esta esteja escrita da forma mais inteligente possível, ainda reage à biografia do autor com o estoicismo de um médico calejado ante a impaciência de seu jovem paciente. Tratando-se de obras prefaciadas, também reagirá a esses dados com indiferença. Já tem noção de como fazem os prefaciadores: muitas vezes são leitores superficiais e entusiasmados que não têm a sorte de captar o âmago da matéria que introduzem.

Então o leitor avança e, se for realmente uma obra de fôlego, ele começará a resfolegar logo nas primeiras palavras que lhe darão entrada ao enredo. Porque para reconhecer um bom artista basta uma simples palavra sua, um som, um piscar de olhos. Depois segue-se, da parte do cético leitor, aquela estranha sensação de autoengano e também alguma autopunição libertadora; logo após o prazer cresce em cada avanço, em cada página, em cada secção. Muda-se o quadro, agora é ele que se sente caçoado, rebaixado, desdenhado, com o orgulho tolhido. Engole em seco, de arrependimento, mas também e sobretudo pela sorte de estar a degustar uma boa obra literária. Existe melhor terapia do que essa? Muitas vezes o escritor, primeiro subjugado, agora pesca o leitor, acolhe-o no seu manto, deixa-o prostrado na seguinte oração: «eu falo, é o falo!», escreve sorrindo, soltando um peido, «eu vomito cidades, todas as vossas cidades de novos-ricos e novos-pobres», ousa o escritor. E o leitor pensa: micção/Mixinge/isso é felação, há muito que eu andava a desconfiar de que as nossas cidades, e essa vaga de novos-ricos e novos-pobres que só começaram a aparecer primeiro em 1975 e depois em 2002, eram xixi e “dejetos fecais”. Mas o leitor não tem como abrir a boca, fica preso à trama… uma leitura assim é eletrizante. Atua como íman, prende e faz refém. Ele fica imerso na leitura, é absorvido, absolvido e convidado a adotar posições kamasutrianas. Só quando alcança as três ou duas páginas derradeiras, aquelas que desfecham o enredo, é que se lembra de parar, de forma brusca, porque é chato constatar que se vai terminar a leitura de um bom livro; e por isso finge, procurando prolongar, por subterfúgios, o momentum. Numa atitude de desespero, põe o marcador na página derradeira e devaneia: sopesa o livro, sente-lhe o cheiro, o tato também, detém-se por mais tempo e com algum respeito na leitura da biografia e na imagem do autor para lhe perscrutar as feições e abstrair as emanações da sua personalidade… Um bom leitor não aprecia um livro antes de saber do que este retrata.

Sempre tive medo de terminar a leitura de um bom livro; deixa-me uma sensação de desamparo, de traição e de vazio absoluto. Um bom livro é como o coitado do coito, seu fim nunca foi bem-vindo.

* “O Ocaso dos pirilampos” é título de um livro da autoria de Adriano Mixinge, escritor angolano; vencedor do prémio Sagrada Esperança. Esse texto foi inspirado pela leitura daquele livro.
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