terça-feira, 14 de julho de 2020

Opinião. Meu repúdio por mais um óbito pelas mãos das forças da ordem


1. Porque me obriga a consciência de cidadão e agente de mudança social no campo das letras, venho expressar mais uma vez o vivo repúdio face aos actos que redundam em excessos das forças da ordem, policiais ou militares, na sua abordagem com populares. Situo no meu entendimento ao falar em uso excessivo de força um quadro de meios e perícia injustificado ou desproporcional a uma determinada circunstância.

2. A sociedade angolana segue chocada o ascendente trágico de mortes causadas pelas forças da ordem. A vítima mais recente é o jovem José Kilamba Rangel, baleado por um agente da Polícia Nacional que patrulhava o Bairro do Prenda, em Luanda, no quadro do Decreto Presidencial que reforça as medidas de prevenção da Covid-19. Um outro jovem, que ia em companhia do falecido, sobreviveu ao tiro no ombro.

3. Segundo o porta-voz do Comando provincial de Luanda, Nestor Goubel, citado pela Lusa, o incidente ocorreu por volta das 02h00, quando os jovens "se insurgiram contra a Polícia e na tentativa de os afastar, um agente acidentalmente disparou".

4. Cada cidadão contribui para o bem-estar e segurança da nossa Angola, mas tenho consciência do respeito acrescido que nos merecem as forças da ordem, que enfrentam por inerência das suas actividade situações de perigo e dormem longe do conforto dos seus lares. Também não fui militar nem alguma vez adquiri a perícia de manejar armas.

5. Seja como for, recuso-me a acolher a recorrência de tiros acidentais ou então que não haja outras formas de dissuadir o "desacato às autoridades" senão pela neutralização letal do "alvo". A própria Polícia já nos habituou a ver louváveis exemplos de contenção, pedagogia e humanismo. O papel do polícia não pode ser o de matar (fácil), do mesmo jeito que o papel do juiz não se pode limitar a condenar.

6. Os números de vidas perdidas à bala da Polícia, só nestes quatro meses, andam acima de 65% dos óbitos causados pela Covid-19, que temos todos o compromisso de prevenir e combater. Não deixo de lamentar as mortes e de me solidarizar com as famílias de agentes e militares mortos por meliantes e cidadãos de conduta errónea.

7. Exmo. Senhor Ministro do Interior, ensina-nos a ciência a prestar atenção aos fenómenos sociais e aferir as causas determinantes e condicionantes, sob pena de continuarmos a perder tempo, neste caso vidas, com a superfície. Porque será que os tiros de efeito psicológico, admitindo o seu uso como recurso extremo necessário, tendem a ser apontados ao corpo e não para o ar? Sabendo que, matando, o autor é punido com penas pesadas, os agentes não deviam estar sensibilizados do contrário?

8. Termino reforçando o apelo para se investir no acompanhamento psicossocial e aquisição de coletes anti-bala para os nossos agentes. Seria grave ouvirmos algum dia que afinal se andou a matar por... pânico.

Gociante Patissa (escritor). www.angodebates.blogspot.com |Benguela, 14 Julho 2020

Imagem: site do minint


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terça-feira, 7 de julho de 2020

Crónica | DESCULPA DIZER MAS ERA ASSIM UM SENHOR CHEIO



Ele relata as suas façanhas com invejável correcção gramatical e numa dicção bastante clara e cativante. Conhece o lugar do sujeito, do predicado e do complemento. Ah, o da pontuação e das entoações também. Articula no registo ajustado ao canal, uma linguagem cuidada, recorre o mínimo possível ao uso da gíria ou do calão. Fluiu-lhe de tal modo o raciocínio que antecipa possíveis questões do repórter. O entrevistado, jovem com alguma escolaridade, quando tem de descrever as características de um visado acima do peso, pede desculpas antes de dizer que se trata de um “senhor assim cheio”, pois a sua educação e consciência cidadã desencorajam o bullying, que como se sabe gera consequências psicológicas graves para a vítima e para a sociedade que o rodeia. O orador tem noção do alcance massivo da rádio e realmente constitui desrespeito andar a dizer que alguém é gordo, mais a mais porque ninguém escolhe possuir características socialmente alvo de adjectivos pejorativos. E continua no seu relato, sempre tratando as vítimas com respeito, o mesmo respeito que lhe faltou.. quando se meteu a protagonizar acções que motivam agora a tomada da palavra a partir de uma esquadra policial. O sujeito é assassino confesso de mototaxistas (kupapatas), pelo menos mais de quatro, os quais o delinquente abordava na condição de cliente e a meio da corrida, às vezes com comparsas, às vezes a solo, partia para o assalto à facada durante. Foram vários meses neste modus operandi na periferia de Benguela, como bem cuidou de narrar pormenorizadamente com pitada de crueldade e malvadez cada episódio, do qual o artista levou sempre de vencida cada incusão. Usamos sempre uma faca média de cabo preto, complementa o suspeito. As motos, de marca Delop, eram vendidas a um receptador que desembolsava 100 mil kwanzas e prosperava neste lucro regado com sangue e lágrimas de familiares e demais pessoas de bem no litoral da província de Benguela, que não pode ficar indiferente a todo este quadro de instabilidade. Do lado castrense, chega na voz do Comandante Municipal, Filipe Caxota, a negação de uma polícia falida no quesito de pôr cobro à situação. Chama à liça o fracasso dos sistemas informais de segurança pública, que têm como principal actor a família. A frequência da reportagem é 92.9 FM, Rádio Benguela, pouco antes das 12h. Amanhã é reposição.

www.angodebates.blogspot.com | Gociante Patissa | Benguela 07 Julho 2020 (imagem ilustrativa, in site americanas)
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sexta-feira, 3 de julho de 2020

O segredo da Igreja Universal do Reino de Deus - Sousa Jamba

 Sou da IECA, (Igreja Evangélica Congregacional de Angola). A minha família está ligada a esta organização desde a sua fundação em Angola há mais de um século atrás. Mas sou profundamente tolerante de outras religiões; isto tem a ver com a minha infância na Zâmbia. 
(...)
Voltei para Angola e notei que muitos jovens tinham deixado a IECA para confissões mais carismáticas, algumas pregando a Teologia da Prosperidade como a Igreja Universal do Reino de Deus.
(...)
Os angolanos têm um hábito muito perigoso: um desejo profundo de quererem dar nas vistas sem, muitas das vezes, estarem prontos a dedicarem-se ao trabalho árduo e difícil que faz a diferença. Os pastores e bispos angolanos da IURD deveriam ter aprendido muito mais além dos sotaques brasileiro na organização a que pertenciam.

A IURD é uma espécie de multinacional que é altamente eficiente. Na IURD não é apenas uma questão do dízimo; na IECA temos também pago o dízimo mas as nossas igrejas não são comparáveis às da IURD. Já assisti sessões da IURD no Huambo por várias vezes. Uma das coisas memoráveis do local foi o conforto, dentro da igreja havia um bom sistema de ar condicionado. A IURD investe, sim, na suas infra-estruturas que fazem com que estas passem a atrair a muita gente.

No Huambo, uma vez, fiz questão de fotografar livros que as pessoas estavam a ler. Uma boa parte das senhoras estava a ler obras de Edir Macedo; o marketing desta organização é impressionante. Depois há, também, aqueles programas de televisão. Estamos a falar aqui de um programa de Marketing sofisticadíssimo.

As operações da IURD dariam para um bom estudo de como os negócios devem ser geridos. Nunca vi um templo da IURD numa área pobre de Angola. Os estrategistas da IURD têm como o seu alvo a classe média (e aqueles que aspiram à mesma). Este segmento da sociedade é vastíssimo. Depois há a mensagem da prosperidade, este mesmo segmento da sociedade é que mais sofre de uma ansiedade de não pertencer, propriamente dito, ao topo — orando, dando o dízimo, e nunca faltar à igreja, que poderá garantir a promoção ou o contrato. Este é, também, o local de convívio com gente com os mesmos valores etc. Isto tudo não foi feito num instante, houve muito trabalho para se conseguir tal sucesso.”

(Fragmentos da crónica, in Jornal de Angola, 03.07.2020)
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A Voz do Olho Podcast

[áudio]: Académicos Gociante Patissa e Lubuatu discutem Literatura Oral na Rádio Cultura Angola 2022

TV-ANGODEBATES (novidades 2022)

Puxa Palavra com João Carrascoza e Gociante Patissa (escritores) Brasil e Angola

MAAN - Textualidades com o escritor angolano Gociante Patissa

Gociante Patissa improvisando "Tchiungue", de Joaquim Viola, clássico da língua umbundu

Escritor angolano GOCIANTE PATISSA entrevistado em língua UMBUNDU na TV estatal 2019

Escritor angolano Gociante Patissa sobre AUTARQUIAS em língua Umbundu, TPA 2019

Escritor angolano Gociante Patissa sobre O VALOR DO PROVÉRBIO em língua Umbundu, TPA 2019

Lançamento Luanda O HOMEM QUE PLANTAVA AVES, livro contos Gociante Patissa, Embaixada Portugal2019

Voz da América: Angola do oportunismo’’ e riqueza do campo retratadas em livro de contos

Lançamento em Benguela livro O HOMEM QUE PLANTAVA AVES de Gociante Patissa TPA 2018

Vídeo | escritor Gociante Patissa na 2ª FLIPELÓ 2018, Brasil. Entrevista pelo poeta Salgado Maranhão

Vídeo | Sexto Sentido TV Zimbo com o escritor Gociante Patissa, 2015

Vídeo | Gociante Patissa fala Umbundu no final da entrevista à TV Zimbo programa Fair Play 2014

Vídeo | Entrevista no programa Hora Quente, TPA2, com o escritor Gociante Patissa

Vídeo | Lançamento do livro A ÚLTIMA OUVINTE,2010

Vídeo | Gociante Patissa entrevistado pela TPA sobre Consulado do Vazio, 2009

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