"Escrevo
porque não tenho porte de arma de fogo. Escrevo porque não ganhei um autorama
no natal de 1992. Escrevo porque o Silvio Santos não leu as cartas que mandei
para o programa Porta da Esperança. Já criei centenas de definições para
literatura e descobri que escrever é apenas uma forma de domesticar o animal
que mora no zoológico interno. Fazer carinho no beijo raivoso que rosna dentro
da gente.Uma necessidade. Uma doença sem nome. E que a
solidão é o Posto Ipiranga para o abastecimento do tanque lírico. Que solidão é
o tempo para ideias surgirem como temporais que destelham casas. Não tenho
horário para escrever. Sou um eterno combatente do tédio. Estou sempre
estancando um vazio ruminando ideias. Sempre escrevendo no parquinho do
cérebro. Qualquer mentira escutada na rua é motivo para confabular poemas,
contos e roteiros. Impossível não pensar em fazer literatura num mundo que só
te oferece mentiras. A saída é sempre criar mentiras com asas. Nunca fui de ter
crises criativas, os socos que a vida nos dá na cara é sempre inspiração.
Literatura é cão que se alimenta da ração das tragédias alheias. Bem-aventurado
aquele que desconta as decepções da vida escrevendo versos. Dia desses atravessei
o porto de Manaus e vi crianças brincando numa canoa furada no Rio Negro. Uma
hora a canoa sumiu nas águas e pensei: 'Escrever é apenas uma forma de
naufragar lentamente. Literatura é naufrágio e o barco é você mesmo'. As
crianças choraram e eu fui para o bar cheio de lindezas para um conto. O
escritor é um náufrago pedindo socorro. O lance é seguir em frente estacionando
catástrofes e transformando em poesia."
Extracto
da resenha feita por Vivian de Moraes ao livro "Meu coração é um bar vazio
tocando Belchior", da autoria de Diego Moraes. Editora Penalux, Brasil,
2016
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