A minha passagem pelo Piaget atrás da licenciatura em
sociologia foi mais ou menos uma colecção de traumas. O primeiro choque veio de
um certo desrespeito que residia nas normas, principalmente aquela de não haver
uma segunda oportunidade para quem perdesse uma prova (por maior que fosse a
força do motivo). Se o estudante perdeu a primeira frequência, vai
automaticamente ao recurso, na lógica da improbabilidade de conseguir 20
valores na segunda frequência e com isso a média 10.
Ora essa, como ficaria o meu direito à desordem?! Nunca
na verdade fui um estudante disciplinado, nem acredito que vá a tempo de mudar.
Se em plena sala de aulas apetece ir para a casa, pego em mim e vou-me embora.
Pelo que tive mais tarde de desistir, com o receio de não concluir o curso nos
cinco anos curriculares e envelhecer tentando.
A segunda dor de cabeça era a falta de transporte para
conciliar o emprego (no estressante que é o serviço de terra em avião civil) e
duas universidades ao mesmo tempo, sendo que na estatal continuava alistado no
segundo ano de linguística/Inglês. Tudo isso fazia-se num perímetro de 70
quilómetros.
Depender de boleia, nos dias em que a última aula vai até
poucos minutos antes das 23 horas é, como diz a minha amiga portuguesa, dose!
Mas almas caridosas há sempre. Estou recordado de certa vez em que à meia-noite
fomos à boleia de uma camioneta carregada de caixas de tomate, certamente
destinada a Luanda.
Gostava das aulas de metodologia de investigação científica,
mas muito mais ainda das de epistemologia, ética social e francês. Tudo isso
não suplantava a grande frustração que era a gélida metodologia da professora
que dava o que eu mais desejava aprender, a sempre quente Antropologia.
A académica montava o datashow e limitava-se a ler o
powerpoint que projectava à parede, num ambiente mais frio do que o inverno das
ruas de Lisboa, que fazia questão de evocar como fonte do canudo. E o monólogo
de sotaque mecânico europeu de pronunciar o R como se a arrancar uma espinha de
peixe na garanta! Se mais explicação lhe pedissem, relia e trancava o
semblante. E na prova? Bem ao estilo linear e textual do exame de condução:
respondeste bem, mas não foi o que eu ensinei. Logo, zero.
De tal sorte que quanto mais o tempo passasse, mais me
ligava à professora algo intenso: a atitude de rejeição. Quase me fez odiar a
ciência que almejava dominar na sequência de um convívio três anos antes com
alguém que tinha mestrado e paixão por Antropologia. Curiosamente, a leitura
deste livro introdutório de Claude Rivière, que me chegou por empréstimo, está
a ser bem mais elucidativa do que o desperdício de meses sentado na sala de
aulas no distante ano 2007.
Já dizia alguém que quando as memórias do tempo de escola voltam com intensidade, é porque ressuscitou a alma de estudante. Queira, caro leitor e cara leitora, tolerar as divagações de um eterno estudante e sonhador que gostaria de sair pelo mundo afora e cimentar conhecimentos, seis anos passados desde a conclusão da licenciatura, pudesse ele quebrar os compromissos de sobrevivência.
Já dizia alguém que quando as memórias do tempo de escola voltam com intensidade, é porque ressuscitou a alma de estudante. Queira, caro leitor e cara leitora, tolerar as divagações de um eterno estudante e sonhador que gostaria de sair pelo mundo afora e cimentar conhecimentos, seis anos passados desde a conclusão da licenciatura, pudesse ele quebrar os compromissos de sobrevivência.
Gociante Patissa, Aeroporto da Catumbela, 17 Maio 2016
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