sexta-feira, 9 de agosto de 2013

UM POUCO DE MEMÓRIAS DE BENGUELA NO LIVRO


"Partiu do Huambo dia antes do troar dos canhões, uma sorte providencial mesmo, só que não se conseguiu livrar tão facilmente assim da fumaça da pólvora. Ia o cessar-fogo no segundo dia, quando o camião chegou ao Lobito. Corria o primeiro semestre de 1993.

À chegada, António Veremos testemunhou a mais voraz anarquia de sempre, a de saquear tudo, mormente no centro urbano. Disbundar, era esse o verbo. Em quase duas semanas, as pessoas cuidaram de açambarcar tudo, tornando-se difícil distinguir os escombros da guerra civil (de 1975 a 1991) das ruínas da disbunda (uma semana mais ou menos). E não faltaram flagrantes hilariantes. Houve quem roubasse monitores de computador, confundidos com televisores a cores, algo raros na altura… e até sanitas, com autoclismo por carregar, andaram à cabeça para negócio.

Era tentação temerária ir à disbunda, cujo fim custava calcular. Uma anarquia que desmentia a existência de forças da ordem, que atravessavam um défice de recursos humanos, dado o recente processo de desmobilização. Havia assassinatos impunes, tanto por armas de fogo, a granel em posse de civis e ex-militares, como por arma branca.

Veremos quase desfaleceu ao tomar conhecimento da tragédia na Tintas Cin. Custava-lhe afastar da imaginação o estertor de conterrâneos sobreviventes das escaramuças, porém impotentes diante do incêndio que os engoliria em fracção de segundos, um incêndio resultante da imprudência de quem entendeu beijar o cigarro no armazém de produtos inflamáveis. No momento em que a Rádio Benguela passava tal notícia, Veremos passava pela fábrica de montagem de electrodomésticos, no bairro da Kanata, onde conseguira disbundar caixinha de duzentos botões de roupa".

In «Não Tem Pernas o Tempo», pág. 69.
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