A história da rádio em Benguela é rica em exemplos de
técnicos de som que resultaram em locutores de carreira. É também este o
desafio assumido recentemente por Dinho Carlos ao décimo sexto ano de casa na
Rádio Morena Comercial, que emite nas frequências de 97.5 e 96.0 FM. O que reserva
o futuro é ainda uma incógnita, mas uma certeza por enquanto lhe basta: era
preciso ousar. Dinho vem de uma família com tradição em rádio e sucesso na arte
de representar em televisão. Como principais referências, é filho do discotequeiro e actor João
Carlos Kavitutula (já falecido) e irmão do actor e DJ Celso Roberto, que deram
corpo a personagens diversos da teledramaturgia pela Televisão Pública de Angola (TPA) nas
últimas três décadas.
Blog Angola, Debates
& Ideias (Angodebates): O Dinho Carlos é o
mentor, vamos lá dizer, do programa. É um operador de som da rádio com uma
história vasta e portanto este ano está a exercitar também a parte da locução. Como
é que está a ser esta experiência?
Dinho Carlos (DC): É uma experiência
boa, uma experiência boa, embora muitas vezes também já esperada. Então estamos
a tentar galgar uma aventura diferente do habitual, que é a aventura da
locução, embora também um pouco difícil para quem está há muito tempo atrás das
máquinas.
Angodebates: Quantos anos de casa?
DC: Dezasseis.
Angodebates: Dezasseis anos. Quase todos os locutores passaram por
si. (risos)
DC: (risos) Sim. Dezasseis
anos. Comecei muito jovem, hoje tenho metade daquilo que é minha vivência na
rádio. Então toda esta experiência fez com que viesse essa idealização de um programa
um pouco diferenciado dos outros, não fugindo, claro, às normas radiofónicas. Então
criamos o «Karaoke na Rádio».
Angodebates: Em que consiste, vamos lá dizer em termos concretos, o
vosso programa? O que é que acham que trazem de diferente?
DC: A divulgação dos
músicos anónimos, não é? Mas anónimos, músicos que também podem fazer
interpretação de músicas alheias, conforme se diz, e cantar as próprias
músicas. Vimos que é um mercado tendencioso, ultimamente a febre do karaoke tem
estado a tomar conta do mercado. Então sentimos a necessidade de criar este
espaço para os músicos venderem a sua voz.
Angodebates: Há quanto tempo é que o programa está no ar?
DC: Estamos no ar há três
meses.
Angodebates: Como é que tem sido a receptividade por parte do
público? Ou como é que vocês avaliam se estão a ser bem, ou não, recebidos pelos
ouvintes?
DC: Está média. Está média
porque somos miúdos ainda, não é? As críticas estão a ser bem-vindas, estamos a
procurar melhorar com isso. A aceitação tem sido aceitável. Temos agora um
número de músicos elevado [comparado] ao que começamos. Então temos vindo a ter
feedback, conselhos, propostas, para implementarmos no programa e talvez, quem
sabe, lá para frente também fazermos valer essas ideias.
Angodebates: Dinho, eu pessoalmente, embora não sendo ouvinte
assíduo do vosso espaço, já ouvi vocês mais ou menos no ar a lamentarem
dificuldades técnicas. Quando vocês falam em dificuldades técnicas que
contribuem negativamente, ou seja, para um programa airoso vosso, estão-se a
referir a quê? Internet ou o quê?
DC: Também. A internet
é um problema, não é? Porque nós temos um limite de transmissão que com a
internet ajudar-nos-ia a irmos mais longe, passaríamos do nosso limite mas,
claro, de forma legal. A outra questão é a questão técnica interna, não é? Porque
a gente quer ir um pouco além do habitual, conforme a gente fala ‘nos bairros’,
ir aos municípios, há muitos músicos nos municípios que não conseguem chegar
até aqui. Então queríamos ser nós a chegar até lá. É um pouco isso.
Angodebates: Há uma queixa generalizada, embora depois oficialmente
ninguém a assuma, que as rádios locais não têem feito o suficiente para a
divulgação das músicas locais. Concorda com essa apreciação?
DC: Não concordo. Não concordo
porque eu tenho estado, ou antes do karaoke, fiz também durante muito tempo o
programa “Aiué, Sábado”, com a pessoa do Ekumby David e do Rui Fernandes. Fizemos
esse trio durante muito tempo e nisso fez-me ter muitas vezes contacto com músicos
e produtores. A questão é que muitos dos produtores não aconselham os músicos a saírem
dos estúdios para as rádios. Logo, outros são os próprios produtores –
não estou a culpá-los, não é? – que não fazem um pacote de promoção para dar
espaço ao músico. Na verdade, as rádios existem, os espaços estão postos. Um deles
é este do Karaoke. Nós todos os domingos fazemos o chamativo, todos os domingos
pedimos que os músicos venham…
Angodebates: E é grátis ou há uma cobrança?
DC: Não, não! Tudo grátis.
Não se paga nada. A nossa preocupação é com a arte, é com a divulgação da cultura,
é com o músico, é com a divulgação da música. Mas nos temos [a limitação com] o
espaço físico. Por exemplo, a Rádio Morena é só Lobito, Catumbela e outros
municípios [do litoral]. Mas quem vai fazer ouvir as músicas do músico
em Luanda, no Lubango, no Huambo? Isso não é a Rádio Morena. Nós temos um Blog
na internet mas o músico tem que pôr lá o seu trabalho e pedir que as pessoas
partilhem. Isso já não é o nosso trabalho. Nós fizemos a nossa parte, mas os
músicos, os promotores, os produtores, têem que fazer muito mais. Então não concordo
muito com a ideia de que há uma tendência de fechar os músicos.
Angodebates: Vamos voltar a falar, uma vez mais, da sua trajectória
profissional. Já se imaginou noutra profissão que não a da rádio, que não a de
lidar com botões e sons e engenharia de som?
DC: (risos) Já. Por acaso
já me imaginei muitas vezes, também já me aventurei noutras profissões, mas…
Angodebates: (risos) Sempre volta à rádio?
DC: (risos) Sim. Eu
dou muitas voltas, até porque nem saio. Já me aventurei por outras profissões,
já fiz outras coisas mas nestes dezasseis anos, nunca me desliguei da rádio.
Angodebates: Sei que pratica também desporto. Qual é a sua
modalidade? Ou já deixou de praticar?
DC: Não, não. Não deixei
de praticar. Minha modalidade é artes marciais. (risos)
Angodebates: Quer dizer, falar consigo é sempre melhor a dois
metros de distância? (risos)
DC: (risos) Não,
nããão. (risos) É defesa pessoal só. Sabes que é para exercitar a mente e o
físico. Só para manter a forma, não é para atacar.
Angodebates: Obrigado.
Reportagem: Gociante
Patissa | Benguela, 02 Julho 2017
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