"Tio
Alfredo veio!!!"
"É mentira, não veio nada!"
"Claro que veio. Você teima à toa!"
"Ia vir como, se a coluna [comboio rodoviário]
dos cubanos [militares] ainda este ano [1983] não passou para o Wambu?! Você
acha que ele consegue escapar na emboscada? Só se ele é colaborador dos kwatcha
[então exercito guerrilheiro de rebelião]..."
"Não precisam se lutar política, meus
sobrinhos. O tio Alfredo, a pessoa que vos fala, não é se gabar, não é pessoa
pequena, não!"
"Hum! O tio veio como? O tio não tem medo?
Ainda os mortos estão a lhes desenterrar os porcos, porque a comuna está cheia
de medo, cemitério está minado..."
"Meu rapaz, minha rapariga, isso é assim
mesmo: as famílias não valorizam os tios que têem..."
"O tio também se gaba muito..."
"Eu fui da ODP [Organização da Defesa Popular,
milícia], ouviu bem?"
"Ó tio, FAPLA [Forças Armadas Populares de
Libertação de Angola] e a ODP, ODP é mais?"
"Vocês são mesmo crianças do mato, ya?
Crianças da cidade, lá no Lobito, como não passa a vida a comer ratos com pirão
de milho, essa hora assim não fica a perguntar à toa, vai no lixo apanhar
brinquedos novos, novos em folha. Lixo da cidade não é isso vosso daqui, lá até
cheira bem, hã?..."
"Jura?"
"Eu lá na província, onde passo levantam da
cadeira, batem palmas..."
"Assim porquê, tio?"
"Eu jogo muito futebol. Número sete. Na minha
camisola, em cima do número, escreveram lá 'mexe a bola com o pé!'"
"Mas, ó tio, então se é futebol, assim queria
que escrevessem 'mexe a bola com o nariz?'"
GP, Benguela, 01.12. 2015
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