Texto de Felisberto
|
Depois do
chamamento iroso e arrogante dela, todos ficaram sentados (numa única cadeira
que havia no jango lá em Kalweyo), a madrasta perguntou com toda energia:
— Quem tirô o cem
que tava na banca?
— Não sabo, mamã!
—
respondia assim o tímido enteado Cornelinho, um novinho irmão vindo do
Etaholwa!
— Eu também nô vi
quem tirô, tia — replicou o orelhudo Kahiva, primo por excelência.
— Vou perguntar
di novo: quem tirô o cem que deixi na banca?
— Mãe, na banca?
Dentro ou fora? — respondi com ironia por ser filho
legítimo e também por coincidir com uma aula de localizações das coisas que
tive naquele dia.
— Ó cabrão, vô ti
matar com purrada! Estava na banca eu também não mi lembro bem se tinha ficar
na cima ou na baixo. Só quero o cem que estava na banca!
— hahahahahahahahahahahahah
—
As meninas (Rosália e Laurinda) morriam de gargalhadas, porque ainda tinham a
energia voraz da gramática que a professora Júlia da Escola 10 lhes
transmitira, embora com seus dentes podres que às vezes confundem a fonética.
— Pufa! Pufa! Pufa! — Os dois enteados mais um sobrinho
levaram logo de primeira umas palmatórias do cassetete do mano Ernesto Kamwele,
coitado!, que sua alma descanse em paz e Deus o tenha…!
Lá no meu
cantinho eu tremia de susto (ao mesmo tempo mijando nos calções como era de
hábito para esvaziar o medo) e dali continuou a sova aos três azarados da nossa
casa, por sinal os mais crescidos, em fase própria de furtoszinhos domésticos.
— Pufa!
Puh!Puh!Puh! Páh!Páh!
— Aiué! Aiué! — Vô na minha
mãe! Vô na minha mãe! Eu sô órfão! Aqui me odeiam! — gemiam assim as
vítimas dos açoites do dia.
— Eu não vi o
cem, mas era só cinquenta! — Gritou o Tchipepe.
— Então, era
mesmo este dinheiro cem de cinquenta-cinquenta! — disse ela.
— Mas não sou eu
que tiri, fali que só vi. Estava na mão do Cornelinho.
— Eu também não
vi, mamã. Só o Cornelinho me mostrou um cinquenta roto que colamos com
tchimbungú para comprar califi doce! — Assim clamou o Kahiva.
— Então foi você
que tirô nem? Só estás a deixá batê os otros! Não, pensei bem, todos vocês são
culpados porqui cumeram o dinhero juntos.
— Eu só comi
califi e assistimos filme do Jerry e Avô Nombo no Dinis que mi pagarom lá!
— E você
Cornelinho onde tiraste o dinheiro?
— Então se a mamã
já sabe onde estava o dinheiro, porque pergunta onde tiraram? —questionei.
— Pufa! Pufa! — Me deram umas
bofetadas mais dolorosa e cai chorando.
— Mamã, encontri
dois cinquentas no chão e não na banca, só tiri dinheiro do chão, mas mesmo eu não fazi nada, mamã, só tirí. — concluiu o
Cornelinho, quando já havia acabado a sova. ___________
Nota do Blog Angodebates: No ano em
que completa o 10.º aniversário, o nosso Blog lançou um desafio de crescer
junto com os seus leitores, abrindo para o efeito uma oficina para a divulgação de
contos, crónicas e poesia de autores com ou sem livros. Como é natural, teremos
colaboradores principiantes, pelo que lá onde for necessário, a gestão
editorial do Blog fará ou sugerirá arranjo. O que esperamos é no futuro olhar
para o primeiro texto de cada colaborador e festejarmos o progresso que for
alcançando. Caso queira participar, pode mandar textos (crónica, poesia, conto)
para patissagociante@yahoo.com
0 Deixe o seu comentário:
Enviar um comentário