segunda-feira, 15 de abril de 2019

Ensaio | Análise semântico-lexical dos termos “batuque” e “batuqueiro” na obra “o ocaso dos pirilampos”, de Adriano Mixinge


João Fernando André* 


“O que cuspimos ou urinamos
enche-nos de maravilhas.” 
 (Adriano Mixinge)


Para concebermos os termos “Batuque” e “Batuqueiro” na obra «O OCASO DOS PIRILAMPOS», precisamos [de] entender, a priori, alguns conceitos atinentes à Linguística, particularmente, ligados à Lexicologia e à Semântica: Termo; Neologismos; Tipos de Neologismos; Sema; Extensão e Intensão semânticas. Assim, é nosso desiderato defini-los na visão de alguns estudiosos de linguística, a começar:
1.      Termo
Dubois et al. (1973:586), na baila da Sintaxe, dizem que termo é a palavra que, em algumas frases, assume uma função determinada. Quando se quiser fazer uma descrição duma determinada forma, o mesmo emprega-se, nalgumas vezes, como sinónimo de unidade lexical, palavra, pois o termo implica uma forma definida pelas relações do elemento com outros da mesma estrutura.
2. Neologismo
De acordo com Dubois et al. (2006:431), chama-se neologismo «toda unidade de criação recente ou aquela importada há pouco de uma língua diferente, ou todo sentido novo de uma palavra já antiga». Xavier e Mateus (apud Chicuna, 2014:51), assemelhando-se à ideia de Dubois et al., fortalecem a ideia de que toda a criação recente de uma unidade lexical numa determinada língua, ou a nova interpretação de uma palavra já existente na língua é definida como neologismo. Os mesmos autores explanam que por neologismo entende-se também como a unidade lexical que, oriunda duma língua estrangeira, é adoptada por outra língua.
2.1. Tipos de neologismos
Para Caiado (s/d), existem quatro tipos de neologismos, a citar: neologismo fonológico; morfológico, sintáctico e o semântico.
2.      Sema
            Para o Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa (versão 2.0a, 2007), denomina-se sema a cada unidade mínima de significação, que, combinada com outras, define o significado de morfemas e palavras, pode também ser o traço semântico ou componente semântico.
3. Extensão e Intensão                          
João Fernando André (foto: Neovibe)
Em semântica, na visão das estudiosas Lopes e Rio-Torto (2007:23), a «Extensão» está ligada às classes de referentes ou denotados de uma unidade lexical, e a «Intensão» está ligada às propriedades semânticas de uma unidade lexical (vulgo “palavra”).
Explanados os conceitos relevantes para se compreender os termos «Batuque» e «Batuqueiro», na nossa visão, com a ajuda dos linguistas supracitados, passamos a defini-los, na obra em estudo, como Neologismos Semânticos, ou seja, uma palavra já existente no léxico português que, inserida em “O OCASO DOS PIRILAMPOS”, de Adriano Mixinge, ganha novas significações de acordo com o contexto de emprego.
Em seguida, passamos por apresentar quatro exemplos em que o escritor emprega ambos os termos:
(1)   “Com o batuque passei a ter em minhas mãos todos os pesadelos.”
(2)    “O batuque é a fonte de todos os rios do poder.”
(3)    “Somos os novos batuqueiros.”
(4)   “Eu sou o batuqueiro, (…) o homem de todas as cores.”
Em (1), o termo “batuque”, ora neologismo semântico, lexicologicamente, terá as significações de: “poder”, “cargo” e “chefia”. Semanticamente, assim, poderá ter a extensão e a intensão de [+abstrato]; [+pertença dos políticos]; [+confiança] e [+poder executivo].
Já em (2), a unidade léxica “batuque” equivalerá a “dinheiro” e “recursos naturais”. Desta feita, em semântica, terá as propriedades ou traços semânticos de [+concreto]; [+da terra]; [+recursos minerais]; [+petróleo] e [+diamantes].
No caso de (3), o significante “batuqueiros”, associado ao adjectivo ou qualificativo “novos”, será o plural de “(novo) batuqueiro”, neologismo semântico e sintáctico, que será compreendido, na égide da lexicologia, como “novo(s)-rico(s)” e “novo(s) representante(s) do poder executivo”. De acordo com a semântica, este neónimo possuirá os traços de [+concreto]; [+dinâmico], [+do ser humano].
E no contexto de (4) – o item lexical será um sinónimo de “deus”, “chefe”, “soba” e “representante”. À luz da semântica, será detentor dos traços de: [+/- concreto]; [+/-dinâmico], [+divino].
Em forma de conclusão, podemos dizer que o escritor utiliza ambos os termos para representar ou designar o poder e aquele(s) que o possui(em) em Angola. Outrossim, pelas várias representações mentais que os indivíduos leitores da referida obra possuem, no que tange ao conceito de “batuque” e “batuqueiro(s)”, poderão chegar à prototipicidade e contextualidade (semântica) e a neologia (lexical), dando novos significados às referidas unidades léxicas, como: batuque: n. poder, n. (nome) dinheiro, n. domínio, e batuqueiro: n.m (nome masculino) bandido, n. m. ladrão e n.m. gatuno.
   
*Professor, ensaísta, crítico literário e escritor
Cartaz originalEmbaixada da República de Angola em Portugal
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