"Minha senhora! O
INAC é aqui?"
"Bom dia também
se diz. Sim."
"Repito. O
Instituto Nacional da Criança fica aqui?"
"Também repito.
Sim. Aqui mesmo."
"Pronto, assim
fica mais fácil. É assim! Eu já desde a barriga da minha mãe que nunca fui de
falar muito. E só lhe digo uma coisa, minha senhora. Está aí a vossa criança.
Lhe eduquem bem! Estou a ir embora..."
"Desculpe-me,
caro cidadão. De quem é filho este menor?"
"Meu,
também..."
"Seu, também?..."
"Ya! Um gajo já
anda muito saturado! Esse miúdo, 10 anos, mexe que mexe, é faltador. Tudo o que
ele encontrou já antes de nascer, obriga que é dele e oferece a quem quiser,
não ouve ninguém. Já lhe reuni. Nada! Lhe bati uma surra de educar, na medida
da criança! Nada..."
"Mas mexe como?
Tem que mexer, é traquinice própria da idade."
"Furta, desvia,
subtrai, gamanço. Ó minha senhora, não faça isso! Assim vai dizer que não
entende o que é mexer?!"
"Já percebi.
Agora, faltador é o quê?"
"O problema dele
é boca! Refila muito, falta respeito, só vale palavra dele. Eu se tento mbora
conversar nossas coisas do fundo com a mãe dele no nosso kimbundu, ele faz
confusão. Só quer português. Na rua, tudo, tudo é lutar. Mas uma pessoa, que
quando nasceu, lhe vimos, é que vai se dar de bwé?!"
"Ok. Isso,
analisando até em nome dos interesses superiores da criança legalmente consagrados..."
"Aí, eu lhe
ultimei: você já como não me ouve, sendo eu teu pai, um dia, juro mesmo!,
vou-te cumprir!"
"Que horror!
Matar o próprio filho?"
"Mas o meu
vizinho, que passava caminho, disse que não, ah porque você não pode matar a
criança, senão o INAC vai cair em cima de ti, a criança é do Estado..."
"Isso é verdade.
O Estado conta com a criança, aliás, é prioridade absoluta."
"Aié? Quer dizer
que estamos lá os dois, eu e o Estado, né? Eu logo vi que esses vícios do miúdo
de mexer, faltador, aldrabão e tal, não vêm da minha parte. Só pode ser do
outro pai. Por isso trouxe a criança aqui. Vos devolvo! Pronto, EDUQUEM LÁ BEM
A VOSSA CRIANÇA, PÁ!, Ok?!..."
"Mas o senhor julga
que faz sentido abandonar o seu filho no INAC?"
"ENTÃO, MAS TAMBÉM
NÃO ERA CRIANÇA DO ESTADO?! Na doença, sou eu. Na propina da escola, sou eu.
Ai, o Estado só sabe ser dono, não assume nada?!"
Gociante Patissa. Aeroporto
Internacional da Catumbela, 31.08.2016 - 16.04.2019
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