quinta-feira, 22 de novembro de 2012

No dia do educador, uma crónica do arquivo: Ministério “da educação” ou “do ensino”?


Parafraseando o nosso astro da música infantil, Pedrito do Bié, eu nasci no “mato”, depois vim viver para a cidade. Então, tenho a educação do “mato” e tenho a da cidade. Mas, agora assim, quanto ao ensino fica como?

No “linguajar da vulgo”, como diria um velho companheiro, “educação” refere-se à transmissão de valores no lar, ao passo que chamamos “ensino” à instrução recebida no ambiente escolar. Os académicos, às vezes pedantemente, gostam de impor que num e noutro caso se trata de “educação”, ou seja, a “formal” e a “não formal”. Eu, que já não gosto de falar com sebentas à boca, fico mesmo pelo “linguajar da vulgo”.

Então é assim: moro já num anexo arrendado no quintal de uma família que partilha o muro com uma escola, né? Vai da primária até 9ª Classe. Fosse fontenário, e teríamos água em fartura. É escusado dizer que, se fosse gerador eléctrico, era direito fazermos puxada (ou gato, como se diz). Mas, a vizinhança com a escola só nos traz prejuízos…! Quando chega o fim-de-semana é normal, mas de segunda à sexta…! Te pago se consegues sair da cama acima das sete da manhã. Éh pá, é que aqueles miúdos são cá de um barulho nos corredores da escola!!!

Eles "barulham” de tudo um pouco. Umas vezes cantam, outras dançam, isso, quando não batem palmas, que estalam como se viessem de tacos de madeira. E para completar a fotografia, vão umas estridentes gargalhadas. Uma “mbwanjaria”, que só vista! Mas então, não há medidas disciplinares? 

Ainda há pouco, quando estacionava o carro no parque, ouvi do outro lado da rua um “FILHO DA P…, Ó TREZEGUÉ!!!”. Era uma mocinha, a poucos passos da sala, querendo atingir um seu colega. O que se seguiu foram risadas de gente à volta, e pronto. Estamos aonde, afinal? Claro está que é uma amostra apenas de milhares de outras escolas por essa Angola.

Posso ser (tão) ingénuo (quanto a minha idade permite). Mas, enfim, não dá para esquecer a figura do Director Pedagógico (e dos próprios directores de turma) nas escolas por onde passei. Já não falo do Director, “autoridade” que só por “milagre” interagia com os estudantes amigavelmente. E aos que virem nestas linhas apenas “conflito de gerações” deixo-os à vontade. Como, aliás, realçou um jornalista de Benguela, não entramos nessa coisa da escrita à espera de unanimidades. O facto é que, hoje, o comportamento de jovens e adolescentes na escola, generalizando, é bastante preocupante.

O Ministério da Educação tenciona inserir no currículo escolar a disciplina de Direitos Humanos. No entender de um colega nestas lides de sociedade civil, “é muito má ideia”. Receia que se venha a banalizar a abordagem, tal como aconteceu com a Educação Moral e Cívica. É garantidamente um fiasco a EMC render-se à lei da “gasosa”, em que o aluno suborna para ter boa nota. Alternativa seria, defendia o colega, criar e capacitar associações de estudantes para o exercício da cidadania, e não ficar-se pelos apontamentos e papaguear.

Um professor de filosofia, quando andávamos no Puniv em 1996, dizia que a escola era do “Ministério do Ensino”, da educação é que não! Inferíamos da sua indignação a corrosão de valores, da qual a escola é simultaneamente a vítima e a promotora. E a tendência é piorar. Haverá como inverter isso?

Gociante Patissa, Benguela 15 Julho 2010
Share:

2 Deixe o seu comentário:

Soberano Kanyanga disse...

Amigo Patissa, tal cmo o dizes, e bem dito, para mim o Ministério é do "Ensino Formal/Instrução". A Edcação, esta que como a irmã ensino andam de mal a pior é o que a família e a sociedade nos passam de forma informal.

Angola Debates e Ideias- G. Patissa disse...

Preocupante, de facto.

A Voz do Olho Podcast

[áudio]: Académicos Gociante Patissa e Lubuatu discutem Literatura Oral na Rádio Cultura Angola 2022

TV-ANGODEBATES (novidades 2022)

Puxa Palavra com João Carrascoza e Gociante Patissa (escritores) Brasil e Angola

MAAN - Textualidades com o escritor angolano Gociante Patissa

Gociante Patissa improvisando "Tchiungue", de Joaquim Viola, clássico da língua umbundu

Escritor angolano GOCIANTE PATISSA entrevistado em língua UMBUNDU na TV estatal 2019

Escritor angolano Gociante Patissa sobre AUTARQUIAS em língua Umbundu, TPA 2019

Escritor angolano Gociante Patissa sobre O VALOR DO PROVÉRBIO em língua Umbundu, TPA 2019

Lançamento Luanda O HOMEM QUE PLANTAVA AVES, livro contos Gociante Patissa, Embaixada Portugal2019

Voz da América: Angola do oportunismo’’ e riqueza do campo retratadas em livro de contos

Lançamento em Benguela livro O HOMEM QUE PLANTAVA AVES de Gociante Patissa TPA 2018

Vídeo | escritor Gociante Patissa na 2ª FLIPELÓ 2018, Brasil. Entrevista pelo poeta Salgado Maranhão

Vídeo | Sexto Sentido TV Zimbo com o escritor Gociante Patissa, 2015

Vídeo | Gociante Patissa fala Umbundu no final da entrevista à TV Zimbo programa Fair Play 2014

Vídeo | Entrevista no programa Hora Quente, TPA2, com o escritor Gociante Patissa

Vídeo | Lançamento do livro A ÚLTIMA OUVINTE,2010

Vídeo | Gociante Patissa entrevistado pela TPA sobre Consulado do Vazio, 2009

Publicações arquivadas