Hoje
acordei ouvindo gritos com cheiro dos quatro pontos do meu país. Eram vozes
conhecidas e tinham um nome comum. Cá na banda, os gritos, as lágrimas do
vizinho são nossas pelo que movi-me para certificar-me do que realmente se
estava a passar. Não podia tanta, mas tanta tristeza! Eram inúmeras filhas
deste chão vestindo andrajos em forma de protesto, pois entendiam ser assim que
todo mundo as via.
Com vozes de saudades e repulsa, choravam, chorava, choravam e gritavam num tom uníssono: "Servimos a pátria, revolucionamos e libertamos este país e hoje nos matais, nos chamais anacrónicos. Seus homicidas! Atrasados sois vós! E as vozes vozeavam infinitamente. Diziam-se cansadas de ser mero passatempo e vistas como um descartável jogado ao lixo depois de animar banquetes e outras insignificâncias que enterrava sua identidade que visa tão-somente definir identidade.
Mas quem eram mesmo aquelas senhoras e de onde vinham? A quem faziam aquelas graves, vergonhosas e até comprometedoras acusações? Eram estas perguntas que todo o mundo no bairro fazia, até elas exibirem um cartaz onde se podia ler: SOMOS AS LÍNGUAS NACIONAIS.
Ninguém as detinha e não obstante serem ignoradas elas gritavam em mais alto a medida que o sol raiava: " VAYONGOLA OKUTUPONDA! OPUTU ELIMI LYACINDELE, WATOPI NDETI!
Quando as tentei indagar, levaram numa visita guiada para as escolas, centros culturais, aos lares, à toponímia aonde tinham sido acantonados para sua ascensão. O estado de abandono era indescritível. É preciso voltar às nossas tradições como quis Manguxi. É preciso dialogar com as nossas línguas. Não deixemos nossas línguas, nossa identidade morrer! É preciso resgatar a consciência que se orgulhe delas para as vermos espalhar seu perfume pelas ruas da cidade.
RODINO
SAPATEIRO
SOBRE O AUTOR
Rodino Satelo
Ngumbe, natural do Lobito. Professor, licenciado pela UKB, faculdade de
Ciências da Educação. Exercita-se, há já alguns anos, escrevendo sobretudo
crónicas e poemas.
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