segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Opinião: O nosso pesadelo e o cabo das tormentas


Inácio Gil Tomás, Benguela, 28/01/2013 - Não são poucos os angolanos que tiveram na véspera do CAN a esperança de que a nossa selecção fosse transitar para a fase seguinte da competição. Num dos seus artigos na rubrica Ponto de vista da Rádio 5, Arlindo Leitão dizia que "em função dos resultados estaríamos a atravessar o Cabo da Boa Esperança ou o Cabo das Tormentas" tal como os auto-proclamados descobridores o convencionaram chamar.

Agora já o sabemos, afinal baqueamos, não conseguimos transitar do Atlântico para o Índico como os Tubarões Azuis. E o que devemos fazer? Analisar as causas profundas da eliminação, as consequências e tirar lições para colher frutos saborosos no futuro.

Uma série de situações envolveram a nossa participação, com realce para o desejo de alcançar o melhor resultado possível (chegar à final não é - neste caso não era - proibido), manifestação clara do imediatismo. Imediatismo também nas propostas financeiras apresentadas para estimular os jogadores, conforme certa empresa que prometeu um milhão de Kwanzas por cada golo marcado. Julgo que o dinheiro (não sei qual o valor disponibilizado para o efeito) seria melhor aplicado no financiamento de uma escola de futebol, contribuindo desta forma para a formação de novos talentos.


A continuar assim, difícil será voltarmos a ter craques da dimensão de Joaquim Dinis, Januário Kanenganenga, Garcia, Luvambo, Chibí, Batata, Kambiona, João e Eduardo Machado, Lutandila, Praia, Meco, Alves, Jesus, Ndunguidi, Abel Campos, Saavedra, Lutukuta, Maria, Ndisso, Tandu, Napoleão, Capeló, Sayombo, Santo António, Chico Dinis, Vata, Maluka, Sarmento, Fusso Nkossi, Nzuzi André, Vicy, Mavó, Lufemba, Mona, Paulão, Castela, Zico, Amaral Aleixo, Carlos Pedro, Túbia, Joní, Akwá e outros.

Com os campos e espaços para as crianças e jovens poderem praticar futebol e não só desaparecendo nos bairros das cidades e vilas, substituídos pelo betão, não chegaremos lá, para parafrasear o Eng.º Fernando Pacheco. Exemplo prático é o Bairro da Goa. Até princípios dos anos 90, havia ali cinco campos: o do Centro (infantil), o do Sr. Flora, o do Clube “O Pescador”, o da Praia e da EMPA[1]. Nas áreas vizinhas havia os campos da Escola Primária Nº 30, da ST[2], o da Rádio Benguela e o do Palácio. Tudo desapareceu e com isso a equipa Marítimo da Goa que participava do Girabairro.

Mais do que reconhecer o fracasso, é preciso repensar as metas a alcançar no Futebol. À Selecção de Cabo Verde vão as minhas felicitações pelo êxito. Aos nossos jogadores vai uma mensagem de carinho e de solidariedade, pois deram o seu máximo e, acredito, pretendiam estar na fase seguinte. Tal como diz Augusto Cury “bons pais preparam seus filhos para receber aplausos, pais brilhantes os preparam para enfrentar suas derrotas… estimule seus filhos a ter metas, a procurar o sucesso no estudo, no trabalho, nas relações sociais, mas não pare por aí. Leve-os a não ter medo dos seus insucessos[3]. É preciso ter forças para levantar depois de tropeçar.


[1] Assim designado por estar, na época do partido único, defronte à loja de bens alimentares EMPA.
[2] ST – Serviço de Tropas era responsável pela fiscalização dos militares que se encontravam fora das suas unidades. As suas guias de marcha eram visadas nesta estrutura militar.
[3] Augusto Cury (2003): Pais brilhantes, Professores fascinantes – a educação inteligente: formando jovens pensadores e felizes; Rio de Janeiro – Sextante.
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