A
chinesa, baixinha, pernas arqueadas, abriu a porta do restaurante, ares inquiridores, levantou a tampa da
cuba do buffet e dirigiu-se à garçonete com a voz já alta: "Amiga, é
soco?" E não se sentindo percebida, e enquanto o companheiro se via
consumido pela troça malandra por quão magro era, rabinho feito tábua, a
asiática levanta a voz, agora em tom de ralhar, sem no entanto evidenciar
impaciência como tal, e exige: "AMIGA, EU QUELO SOCO! SOCO! UM SOCO, FAZ
FAVOR." Estupefacta, a balconista replica: quer soco, amiga, a sério? Deve
ter pensado que há realmente pessoas que não sabem o que pedem. Fez-se um
silêncio frio, vazio, a transcender o ruído fonológico. A garçonete levou a mão
à testa, apalpou o lugar que a sua mão devia conhecer com precisão e, sentindo
ainda presença do caroço do galo, rapidamente tentou disfarçar com o guardanapo
de papel a lágrima que se antecipara e quase lhe fugia ao controle. Por acaso
um soco era precisamente o tipo de coisas que nunca lhe passou pela cabeça
querer mas que na noite anterior acabou levando no seu lar, no caso dois socos
e bem puxados, tudo por uma briga estúpida qualquer. E a chinesa continuou a
exigir soco e mais soco, é que lhe apetecia qualquer coisa do mar que não fosse
peixe, um choco mesmo.
Gociante Patissa, Benguela, 25.07.2018 | www.angodebates.blogspot.com
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