"As
igrejas pedem a intervenção do governo, queixam-se da proliferação, pois surgem
a cada dia mais denominações, quais cogumelos. Mas a Namíbia, sendo um estado
secular [laico], respeita a independência religiosa. Meus compatriotas, não
queiram vocês perder isso. Porque se o Estado intervier, vocês mesmos é que se
vão queixar que o Estado está a imiscuir-se nos nossos assuntos. Portanto, a
auto-regulação deve ser a saída. Existe o Conselho de Igrejas, este deve fazero seu
papel."
(...)
"O governo namibiano não coarcta a liberdade
religiosa de ninguém. O que se passou foi um problema técnico. Ora, se um
obreiro vem para dar conferências e pregações, em função das quais receberá uma
remuneração, então tal como um cameraman ou qualquer outro profissional, este
obreiro tem de requerer um visto de trabalho; o de turista, não. Não pode
entrar no nosso país como um turista quando no final vem arrecadar
lucros."
-
Extracto da intervenção do presidente Hage Geingob durante um acto de interacção
com a sociedade civil, que teve lugar há 15 dias na capital namibiana. Tradução
do Inglês de Gociante Patissa, blog
Acabo de receber esclarecimento da parte de
alguém mais abalizado no que respeita ao Top dos Mais Queridos. Foi-nos
esclarecido que nos termos do regulamento, o público é que vota (no conjunto da
obra e não apenas em uma música) no artista, sendo que aqueles cuja máquina de
marketing for mais activa têm maiores hipóteses de figurar entre "os mais queridos". A questão que se coloca é de carácter dos direitos
autorais e conexos, quede qualquer modo escapa ao escopo
do regulamento do prémio. Conta ainda em desfavor de artistas fora de Luanda o
facto de em suas localidades terem pouca aparição por razões óbvias. De qualquer
modo, a nossa fonte reconhece que a realidade hoje está distante daquela que se
vivia, isso há 30 anos, quando o voto era apenas pelo cupão físico. Outro
factor ainda é que a faixa etária que mais domina a estética da música não
vota, o que depois favorece aqueles nomes que estão mais próximos de jovens e
adolescentes, que em termos demográficos são a maioria, considerando ainda,
isso em nossa interpretação, a esperança de vida mediana em Angola. Para isso,
foi idealizado o prémio da crítica para corrigir esta questão de artistas que,
não sendo populares, têm um nível de estética mais consistente. O Top,
resumindo, ainda é guiado pelas leis de mercado. A reconfiguração do formato é uma possibilidade que os organizadores
têm estado a ponderar. Gociante Patissa. Benguela, 28.09.15
Tenho estado a reflectir sobre os prémios de um
modo geral no campo das artes e da comunicação social, onde parece crescer o
cepticismo quanto aos critérios, sendo que, na voz de críticos diversos, a
conveniência parece suplantar a excelência. No caso do Top dos Mais Queridos,
tradicional e prestigioso concurso com a marca da Rádio Nacional de Angola, a
questão que se vem levantando nos últimos anos é a concorrência mais ou menos desleal que alguns de nós vemos
quando por exemplo se premeiam intérpretes de temas de si já muito populares,
quase sempre da década de 70. Foi assim com o músico Legalize, que
reinterpretou o tema "na gajajeira" (original de Urbano de Castro),
foi assim com Edy Tussa (que por acaso vem fazendo carreira na especialidade de
"ressuscitar os mortos", entre os quais Tony do Fumo), foi também
assim no ano 2003, em que Bessa Teixeira ficou em segundo lugar com a sua
reinterpretação de "sulunla", do cancioneiro Umbundu, perdendo para
Patrícia Faria que interpretou "caroço quente", lançado naquele mesmo
ano. A concorrência mais ou menos desleal reside no facto de concorrerem com
autores com temas originais, acabados de publicar no ano a que o concurso faz
referência. A edição 2015 não foge à regra, com a Ary a concorrer com um tema
relacionado com o abandono de lar, saído nos anos 1990. Não seria melhor optar
pela uniformização, definindo para já a natureza dos temas, se originais ou se
"emprestados"?
"Os pais só perdem tempo deles, acho, com isso de aconselhar os
filhos a parar de beber. Eu estou com 22. O meu pai já, 'ah, filho, cuidado; eu
só comecei a beber aos 24-26 anos'. E eu: está bem, pai (mas no meu coração: se
soubesses que comecei a beber com 14 anos..." (na fila do caixa de um
supermercado, hoje)
Entre as cenas que marcaram a minha
mentalidade profissional, trago hoje esta. Num dia que não pode ser considerado
belo, do distante ano de 1997, durante o meu curso de pedreiro no IED
(Instituto de Estudos para o Desenvolvimento), estava eu na secretaria quando
irrompeu um formador cujo nome não convém revelar. Era na verdade integrante
dos cérebros da instituição, além de outros factores sociológicos que o tornam
mais próximo do fundador da ONG. O formador, que por acaso era dos meus
preferidos porque leccionava teoria (fui sempre preguiçoso a lidar com os
braços), tinha em mãos um envelope. Toma, estou a pôr à disposição o meu lugar.
A secretária não acreditava no que ouvia, eu também não, se me permitem a
franqueza. Tinham acontecido coisas na relação com a liderança que a pessoa não
podia aceitar, pelo menos enquanto lhe restasse um pingo de dignidade. Na
verdade, ao longo destes anos de vivência testemunhei outros, com os quais só
posso estar de acordo. Quando se tem noção do próprio potencial, quando a
cadeira foi conquistada por mérito e não localizada com as nádegas (que na
sociedade angolana metaforiza encandear os olhos do líder com elogios e
conselhos que relativizam e até enobrecem o esquecimento dos ideais para o
próprio benefício), pode sempre a dignidade ser maior do que o cargo. A
propósito, volto a partilhar pelo toque de sátira que carrega uma experiência
que li há uns tantos anos num dos semanários publicados em Luanda, que vinha à
guisa de requiem à alma de um antigo governador do Banco Nacional de Angola,
salvo erro. Dizia a crónica que imediatamente depois de apresentar a sua carta
de demissão, aquele gestor veio a ser chamado para se justificar, afinal não é
bem todos os dias que alguém coloca à disposição um tão prestigiado cargo, ainda
mais nos primeiros anos do pós-independência. E aí, cedida a palavra, o homem
teria dito: «Chefe, se estamos numa festa a beber uns copos e, já embriagados,
o conviva mais próximo aponta para o chão ao mijar e me saltam para as calças
umas manchas, pronto... ali, vou ter de sacudir e me ajeitar. Mas a partir do
momento em que o conviva se põe a mijar directamente para as minhas calças, o
que tenho a fazer é ir para a casa.» Dizia a crónica que o Chefe teria largado
um inesperado sorriso, percebido a situação e procedido em conformidade.
O
que será que restou do pujante cantar kwanyama (oshiwambo), geração que na
década de 80 nos alimentava através da Rádio Nacional de Angola, coral (à
capella) rico de harmonia e conteúdo, apesar de engajado na luta pela
libertação liderada pela SWAPO? É a indagação de retórica que me ocorre quando
visito a vizinha Namíbia.
O
meu guia despede-se com a sensação de missão mais do que cumprida, ainda por
cima voluntária. Estou entregue ao taxista que atende pelo nome de DJ. Não gosto
muito do nome à partida, por me soar impessoal. De temperatura ambiente vamos
com 37º C. Ar condicionado? Nenhum. O vento é forte ao longo dos 60 Km entre Oshikango,
no Norte, e Oshakati, no Oeste. A música é servida em tom de ralhar. O DJ não
pára quieto no assento, e não é pelos saltos – a estrada até é impecável.
Entusiasmado,
fala-me do êxito empresarial de um cantor. Gaza é o nome. Está perto de me
chatear o volume quando ele acrescenta, orgulhoso, que o astro, a residir na
capital Windhoek, é natural de Oshakati. Por acaso, dele nada sei. O DJ quase
não acredita. Enfatiza que Gaza chegou a fazer dueto com algum angolano, mas ao
fim de um breve esforço mental, em vão, acaba reconhecendo que afinal só o fez
com sul-africanos. Neste instante, talvez para me alegrar, toca um dos mais
ocos temas de Yuri da Cunha, “atchutchutcha”. Aposto que ele não percebe a
mensagem, basta-lhe a batida.
Na
verdade, não é exagero nenhum dizer que não há intercâmbio cultural entre as
repúblicas de Angola e Namíbia, em termos de consumo de produtos artísticos, não
obstante o facto de haver povos de um mesmo grupo etnolinguístico dos dois
lados, com a divisão do então reino dos Kwanyama, fruto da conferência de
Berlim. O facto de se falar o português de um lado e o inglês do outro poderá
ser uma barreira considerável. E onde apenas o comércio fala mais alto (com os
angolanos a injectarem mais receitas na economia da Namíbia do que o inverso), o
intercâmbio cultural fica-se pelo superficial, com o risco de cada lado
importar o que de pior o outro tem, por ser mais o visível.
Com
a consagração da música electrónica nas duas últimas décadas, o mercado na
região sub-sahariana destaca-se cada vez mais pela percussão do que pela
harmonia, entre tambores e “beats”. Assim, os holofotes angolanos viram implantar-se
aos poucos estilos dançantes, entre eles o “kwaito” e o afro-house, oriundos da
África do Sul e Namíbia, lado a lado com o ku-duro. Lado a lado é uma forma
generosa de colocar as coisas, tão evidente que se desenha a decadência do
ku-duro, um pouco por culpa do perfil problemático e intelectualmente
inconsistente de proeminentes cultores do estilo.
Nada
tendo contra a ruptura estética consciente, que geralmente implica o domínio
dos padrões por parte de quem impõe a nova tendência, repugna-me todavia que
nos imponham como sendo do melhor que há numa determinada sociedade figuras que
mal dominam o elementar do que se propõem, não nos faltando em Angola verdadeiros
desastres vocais cuja visibilidade assenta em outras ideologias, que não a da arte.
No
caso da minha recente visita à Namíbia, foi pois com elevada satisfação que me
deparei com o trabalho da jovem Blossom (ou Ruusa
Ndapewa Munalye), melhor voz feminina e prémio revelação do Namibia Annual Music Awards 2013, com o
álbum “Komuthima Gwomeya”. A miúda
ousa remar contra a maré do seu mercado ao apresentar um produto com estética. Tem
melodia, ginga, harmonia e poesia. Uma desenvoltura que associa ao talento
várias horas de trabalho e aprendizagem. Canta em Inglês e em Oshiwambo, a sua
língua materna. Ah, e a esquebra: é bonita!
No
Youtube degustamos os temas “indikupapatele” (soul, que quererá dizer deixa-me
abraçar-te) e “ondjila yetu” (zouk, que significa o nosso caminho). Do primeiro
é digno de realce o verso “you are the reason I believe in love” (tu és a razão
pela qual eu acredito no amor). Se amanhã ceder às leis do mercado, que trocam
a intuição criativa pela mesmice do oco exigido pelo público, a artista Blossom
deverá ser “perdoada”, não é que não se tenha esforçado em remar contra a Maré.
Gociante
Patissa. Oshakati, Namíbia, 20 Setembro 2015 (foto: Namibian Sun)
Gosto de ver na TPA (por opção, não uso parabólica) a
faceta da diversificação da nossa economia que tem que ver com o investimento e
consequentemente resultados à vista na criação de peixe continental, concretamente
a tilápia, entre nós o cacusso.
Os termos é que –
confesso – de quando em vez me baralham
assim um bocado. É que se num noticiário gravo já assim no meu dicionário
mental "aquicultura" e coiso e tal, dia seguinte vem outro técnico (cheio
de know-how na boca) dizer que é "larvicultura".
Só que quando penso já que esses dois termos um gajo até atura, aí levo com a
"piscicultura", quer dizer, é começar de zero a caprichar no léxico.
Mas, pronto... isso também
não é bem a questão, até porque, à mesa, o único dicionário que conta são mesmo
só os olhos, não é verdade? Ora, tem bom aspecto? Cheira bem? Vai uma dentada,
e tudo já é comunhão e quê e tal!
O que de qualquer modo preocupa é notar que só
se fala de cacusso. Então se, até na cama, a pessoa varia a posição de dormir – um dia é pelo lado direito
do tronco, outro dia pelo esquerdo, amanhã de barriga para baixo e quando se está frustrado damos uma de decúbito – como é que não se fala em outra espécie de peixe para
aqueles dias em que o cacusso nos lembra a cara do patrão em lua de má
disposição?
Por acaso até, de peixes de
água doce, para além dos que apanhava no poço da lavra da minha mãe quando a
vala da açucareira transbordasse, os do rio que conheço são poucos. Também só
os conheço pelos nomes na língua materna. Neste caso, materna para mim e para os
próprios peixes porque, se falassem, uma vez que os conheci no kimbo, então
teriam de o fazer na língua de cujo barro comiam, o Umbundu.
Assim sendo, temos o "eponde",
que no Monte Belo abundava debaixo da ponte, e "ongungi", que na
Katombela aprendi que era bagre. Os nossos irmãos do Leste têm
"kakeya" ou tuqueia, não sei ao certo se é (ou não) a mesma coisa.
E não é que nos mova algo
contra o cacusso, com o qual aliás tenho uma ligação histórica. Para não dar muitas
voltas, diria que os irmãos do Norte é que sempre o viram como luxo. No
Lobito, onde cheguei em 1985, o “cipulu”[t∫i-pu-lu], como se lhe conhece pelo empréstimo
Umbundu, era de um valor abaixo da sardinha. Então porquê?
É peixe dos mangais, aonde as
águas negras de muitos ainda hoje desembocam. O preconceito viria a terminar entre
1993-95, altura em que abundavam corpos caídos, quais pétalas secas pela
calçada. O assassino em série? Penúria pós-eleitoral. Como diria o outro, urgia
alimentar a ilusão de se alimentar. Com os professores em greve, caminhava eu seis
quilómetros/dia para ir ter com um amigo estivador no Caminho-de-Ferro de
Benguela. De repente, o cacusso já era o peixe mais saboroso do mundo. O mundo
era o fim das nossas esperanças. A humanidade só vai por conveniência mesmo!
Enfim, ao governo e
parceiros, desejamos toda a força. De pesca, este cidadão não "pesca"
nada, é verdade. Mas, excelências, nessa vida que já nos acostumou ela mesma a
ser uma variável, vamos produzir só mesmo já assim um cacusso, sem alternativas?
Angop: A
União dos Escritores Angolanos (UEA) tem promovido diversas actividades ligadas
à maior divulgação da literatura angolana fora de portas, entre a quais o
reforço da cooperação com parceiros estrangeiros. Esta acção satisfaz as
pretensões dos homens ligados às letras em Angola?
João Melo: É,
obviamente, mais um exemplo da acção da actual direcção da UEA no sentido da
internacionalização da literatura angolana. É obvio que, do ponto de vista
individual, agradará todos os autores, embora
considere que os nossos leitores são em primeiro lugar os angolanos e depois os
estrangeiros. Seja como for, é sempre interessante vermos os nossos trabalhos
voarem mais alto e serem conhecidos por outros públicos. Neste sentido,
as iniciativas que a UEA tem levado a cabo no sentido de organizar antologias
em outras línguas é, sem dúvidas, sempre uma acção a destacar. Diria que é
preciso também complementar com uma maior divulgação e promoção do livro
internamente. O livro em Angola circula mal e, portanto, a par destas
iniciativas devemos também fazer um esforço para promover uma maior circulação
do livro dentro da nossa fronteira e nos mercados estrangeiros com a mesma
língua que a nossa.
Desafios
do livro em Angola: Preguiça de leitura, fraca acutilância das editoras ou
deficiente produção literária? São questões postas com alguma recorrência.
Ultimamente, entre acusações de preguiça
e desfile de algum narcisismo (que é comum no sector artístico, alimentado
quase sempre pelo conflito de gerações), parece-me a mim que o verdadeiro
problema do livro em Angola (muito mais do que os fracos hábitos de leitura) é
a DISTRIBUIÇÃO, quer por privados, quer pela UEA. Antigamente, no tempo do
partido único, a tiragem andava acima de 5 mil exemplares, o que alguém chegou
a considerar quantidade industrial. Hoje, com uma população acima de 24 milhões
de habitantes, a tiragem ronda, quando muito, em mil e 500 exemplares,
comercializados a partir de mil kwanzas, que por sua vez ficam encaixotados em
Luanda. Se conseguíssemos pelo menos levar 50 exemplares de cada livro tirado
às 18 províncias, teríamos pelo menos 900 exemplares a circular. O que vai
acontecer neste lapso é o grupo português Leya dominar o mercado, obviamente
com os autores que lhe convier. Se o livro produzido internamente não circula,
esperar que seja conhecido é pedir suculento abacaxi a um eucalipto. Gociante
Patissa, Benguela 13.08.15
Monique Seka, da República Democrática do Congo
e radicada em França, é uma das mais consistentes estrelas da música africana.
Com uma carreira que vem mais ou menos da década de 80, pratica zouk e alguns
ritmos mais africanos. Pela positiva, apontemos o facto de ser referenciada
mais pela sua competência e criatividade do que por problemas e escândalos, que
são uma espécie de prato preferido em nomes como Papa Wemba, Kofi, e por aí,
seus colegas e conterrâneos. Do ponto devista da imagem em palco na sua passagem mais recente por
Benguela, Monique Seka encantou com o seu já conhecido repertório, não deixando
de apresentar temas novos. O vestido é também merecedor de um elogio nosso, com
conceito africano e sóbrio. Em noite de inspiração, Seka puxou da sua
desenvoltura vocal, acompanhada por uma banda juvenil local, à qual fez o
merecido elogio. Duas notas negativas dignas de se lhe assinalar: a primeira
teve que ver com o facto de insistir no monólogo com a audiência, maioritariamente
formada por jovens, esquecendo-se da barreira da língua, pois entre nós os
falantes de francês contam-se aos dedos. (É que de um modo geral, os cantores
parece que se esquecem que não é para os ver dar comícios ou forçar humor que
pagamos as entradas.) A segunda nota negativa vai para a imagem, com uma
maquilhagem a roçar o exagero, sem falar já da pele clareada por força de
químicos, tendência que entre os nossos vizinhos da RDC já parece cultura, e dá
uma tareia aos fotógrafos na hora de regular a máquina e fazer a fotometria. A
nota final é positiva. Venha mais Monique Seka!
«Eu acho que talvez, ao escrever, eu também
esteja a criar um outro mundo para não ficar neste mundo e a sofrer com a
situação real. Depois, é uma forma de eu me evadir da realidade, criando uma
outra realidade. O acto da escrita é um acto de rebeldia. Sendo um acto de
rebeldia, quer dizer, nós ao escrevermos estamos a encontrar um outro mundo,
que é um mundo que não é este; mas ao mesmo tempo também a tentar encontrar um
espaço, que é um espaço ideal. A escrita também é a procura de um ideal, não é?
A procura do melhor texto, a procura da melhor palavra, a procura do melhor
cenário, e tudo isso dá-nos uma certa juventude, não é?» (Ungulani Ba Ka Khosa,
escritor moçambicano, entrevistado pela RTP, emissão de 06.09.15)
1.
"Esse jovem é meu miúdo. O rapaz é bom mas meeeeeeente!" (Benguela)
2.
"Olha, ele já mentiu tanto que qualquer dia até a saudação dele a pessoa
já duvida. Fala 'bom dia' e você se pergunta: será que saudou mesmo?"
(Huambo)
O que se receava acabou por acontecer. Aguardavam-se 11 obras que
seriam lançadas a 11 de Novembro. De recordar que na edição passada, os autores
dos livros inéditos apurados receberam uma bolsa em Kwanzas no valor de 250 mil, mais
a publicação e distribuição do livro, para além de publicidade no canal 2 da
TPA. O projecto, de iniciativa governamental, é coordenado pelo GRECIMA.
Somos chamados a manter um olhar optimista, ou o
silêncio por vezes, a propósito do nosso futuro enquanto sociedade, enquanto
país novo. Mas não é nada fácil quando indicadores e tendências aparentam
apontar para o oposto. Olhando por exemplo para a educação, faço parte dos que
se devem orgulhar do seu ensino médio no que ao perfil de saída diz respeito.
Os anos 90 foram em si mesmos um desafio para quem por acaso não tivesse
"padrinhos" para ir estudar ao estrangeiro (Europa ou no mínimo
Namíbia), um luxo que significava simultaneamente estar livre das rusgas para o
serviço militar obrigatório. Estudamos em condições complexas, caminhando
vários quilómetros a pé, sem manuais - porque não existiam mesmo -, apenas
fascículos, nunca uniformes. O acesso a computadores era só por milagre, a
Internet nem se punha. Muitos de nós tivemos de optar entre estudar e
trabalhar. Ainda assim, conseguimos criar instituições, dirigir departamentos
estatais, singrar em profissões mais determinantes. O país assentava sobre os ombros
de técnicos médios. Quando por fim chegamos à universidade, já a vida nos tinha
proporcionado uma considerável cultura geral. O sector voluntário, o da
sociedade civil, que por décadas servi, era globalmente aguentado por técnicos
médios. Hoje porém é com desespero que se observa o declínio em termos de
perfil de saída dos nossos estudantes do ensino médio. As bases são cada vez
mais fracas, títulos bwé, consistência muito coxe. É como afinal, ó sistema de
ensino? Teremos de recuperar a pedagogia do chicote? Sei que o país é novo, que
devemos manter um olhar optimista, só não digam que é fácil.
Em função de alguns pedidos que me chegam via
mensagem, que sendo poucos entretanto representam muito em termos de
consideração (e custos), gostaria de apresentar a minha justificação pública.
Gociante Patissa, 27 Março 2014 (poema
publicado na antologia «Di Versos – Poesia e Tradução, N.º 22». Edições
Sempre-em-pé. Maia, Portugal, Fevereiro, 2015.)
Nota: Por gentil convite da TPA Benguela, dirigida pelo sempre
afável Florêncio André, duas profissionais levaram-me à Praia Morena, enquanto
cenário de entrevista para um programa em carteira. Um dos desafios da dupla
produtora era rabiscar um poema de improviso para a emblemática praia. O título
inicial era "Diário à Praia Morena", que agora substituí pelo actual,
na sempre busca por imagens menos gastas.