Figueiredo F. Casimiro, à época repórter da TPA Benguela, entrevista-me enquanto editor do Boletim Informativo, Educativo e Cultural “A Voz do Olho”, veículo comunitário alternativo de informação para a cidadania e saúde preventiva, publicação mensal (2006-2011) de uma ONG angolana com sede no Lobito. |
Estive recentemente numa repartição. Depois de suportar uns 15 minutos na fila para que chegasse a minha vez, a senhora recebe a papelada, para o meu alívio, alívio este que mais não durou do que uns poucos segundos.
A atendedora, com cara que lembrava roupa não engomada, embora tolerável por ser do desgaste natural de quem levava já três horas a lidar com papéis e requerimentos, disse: “Vais ter que passar mais tarde para levantar o recibo. Se for para te atender, vai-se acumular a bicha. Aqui vai encher, porque o teu nome não está no sistema e inserir demora”. Por um instante fiquei a me perguntar se era o sistema que demorava, ou se era pelo pouco domínio do teclado. Por outro lado, refilei cá comigo, sendo inútil iniciar discussão com a senhora que me tratava por tu no primeiro contacto: então se eu esperei para que chegasse a minha vez, os que vêm atrás não podem esperar?
Na sequência, ela me dá uma folha para eu anotar meus dados, o que a instituição obviamente já tinha. Qual é a tua profissão? É das mais complexas perguntas que alguma vez me colocaram. E qual é mesmo? Bem, tenho certificado do curso de pedreiro de construção civil padrão europeu, mas nunca exerci; meu passaporte diz que sou operador de computador, mas isso valia antes do ano 2000, quando as maquinetas eram novidade; sou formado em ciências da educação, com licenciatura para dar aulas de inglês, mas não tenho vocação para o efeito. A senhora aguardava, quase se impacientando, mas eu não via a resposta. Aí ocorreu-me advertir com certa subtileza a senhora quanto ao atendimento longe do bom que me estava a dispensar, escrevi jornalista. Olhou para as letras e senti uma ligeira mudança de postura.
Saí daí convicto de que ela não abandalharia o meu processo, por um lado. E resultou. Já por outro, foi inevitável uma sensação de ter incorrido em falsa qualidade. Mas será? Bloguista não é profissão. O que os jornais e revistas publicam não é de modo regular, ao passo que viver da literatura nem vem à conversa. Por acaso já realizei e conduzi programas radiofónicos, mas vínculo como tal (ganha-pão) nunca cheguei a ter.
A Rádio Mais chegou inclusive a “rotular-me” como jornalista sénior para cabeça de série da sua abertura no Lobito, mas a relação acabou por não acontecer porque eu exigi que me fossem requisitar aonde tenho vínculo mais antigo (fracasso que entretanto agradou alguns familiares meus “pelos riscos da profissão, conhecendo-me como conhecem”). E lá se foi a oportunidade de ter profissão formal.
Então já sabem, quem tiver aí uma profissão a mais faz favor de emprestar.
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