A
semana que amanhã finda voltou a colocar na agenda o secular e fracturante
tópico do que é (ou não) ser (e/ou sentir-se) angolano, tendo como factores de
excitação, por um lado, a hipotética ideia da contratação de professores cabo-verdianos
e, por outro, o vídeo de cidadãos congoleses que teriam adquirido por via
ilícita o passaporte angolano e postos no Brasil alegam ser vítimas de
perseguição política (coisa que qualquer angolano com o mínimo de coerência sabe
que não cola, na medida em que as mais sonantes vozes discordantes
passeiam pelo país. É verdade que temos um registo recente de assassinato de
líderes de partidos da oposição no interior do país, parte deles ainda por
esclarecer, o que é vergonhoso. Mas, não haja dúvidas, a diatribe daqueles dois
“langas” do vídeo, só mesmo no mundo da fantasia). Havendo a condenar obviamente
as saídas extremadas, também não podemos (em defesa de seja que direito for)
ignorar que a corrupção endémica em Angola tem permitido a “venda” (de
forma escandalosa) de documentos que habilitam a obtenção da nacionalidade, pondo
em causa as conquistas de todos os que lutaram e suaram para construir este
país, não se sabendo desde já o que o governo/estado pensa fazer para corrigir esse mal. Temos depois, ao que tudo indica, que os restantes
países de expressão portuguesa têm o direito de, através de políticas da
natureza migratória e outras de natureza pública, salvaguardar a sua soberania
e deixar claro quem é e quem não é nacional, com toda a acuidade de recurso à socio-história.
Só Angola não pode (digamos, antes, não deve) porque é ofensivo. Quem viaja para
lá do território da sua teia cultural facilmente se convence (ou é levado a
convencer-se) de que, salvo em casos de dupla nacionalidade, ou somos nacionais
ou somos estrangeiros. Até na Namíbia, os angolanos que lá residem desde a era dos contratos (antes da independência) continuam sem o direito a se naturalizarem, por mais namibianos que assim se identifiquem. Os outros têm a prerrogativa de dar vez à vontade de ser
ou sentir-se angolano, o que seria ainda mais nobre se estrada de vários
sentidos fosse. Os congoleses fazem questão de tratar o angolano exactamente
como angolano, não poupando, como se deu recentemente, na violência para
escorraçar até famílias que lá residiam há mais de 40 anos. Já o oposto (excluímos
o critério da violência) não é válido. Torna-se ofensivo. Em Cabo-Verde, o
angolano é angolano. O inverso do paradigma não se coloca, porque ofende. Bom,
pondo de parte essa coisa das filosofias expansionistas (tendentes à reedição
de paradigmas algumas vezes já desmontados), e recolhidos ao limite da nossa pouca
formação, tentamos dar um contributo mais para o sensorial. Sendo líquido que
nos queixamos de na ementa dos restaurantes em Angola predominar uma
gastronomia que dá pouco espaço aos pratos “típicos” locais, ante o risco de qualquer
dia os nossos patrões chineses dominarem o negócio, sua excelência eu achou por
bem incentivar a afirmação dos pratos africanos que timidamente são servidos. O
funji (há quem lhe chame pirão, shima, no leste) é a iguaria mais imediata. Embora
o melhor seja o de casa, o do restaurante merece a nossa atenção como forma de
elogiar o arrojo da gerência em coloca-lo entre as opções de buffet, sabendo à
partida que vai sobrar, pois não está entre as prioridades dos hábitos de
consumo do segmento de clientes do ramo da restauração. Ali é que entra o
problema. Acontece que o funji, sendo uma massa feita com farinha do milho e
água, torna-se pesado na balança, encarecendo o preço do prato. Paradoxalmente,
o alimento mais barato de produzir (1 Kg de milho não deve estar acima de 200
kwanzas), acaba jogando o papel de repelente, já que pela lógica da balança
fica mais caro do que o peixe, a carne, o arroz, o esparguete, o marisco, o
feijão, enfim… A sugestão é os estabelecimentos taxarem um preço fixo para o
funji, do mesmo jeito que fazem com a sopa. Pesar-se-ia só o respectivo conduto
(em outras paragens, molho). E em nosso entender, o preço justo devia andar
abaixo dos 400 Kwanzas. Ainda era só isso. Obrigado
www.angodebates.blogspot.com Gociante
Patissa | Benguela, 16.02. 2018
0 Deixe o seu comentário:
Enviar um comentário