Foto: Visão (sapo) |
Sua
Excelência Eu olhou para a chamada perdida e pensou: tendo em conta que a lista
de nomeações e exonerações beira o fim, será que vamos a tempo de apanhar uma
deportação para Seicheles em comissão de serviço? Seria melhor que nada, não é?
Mas aí depois assentou o cu à realidade e se convenceu do quanto, em termos de
protagonismo mediático, nem para uma deportação fez o suficiente por merecer.
Seja como for, se há algo de que o angolano nasceu já talhado a gostar e seguir
empolgado é de coisas novas. De sorte que Sua Excelência Eu se juntou também a
esta fila de expectativas transversais, em certos casos irreflectidas. João
Lourenço (JLo) é o renascentista desta Angola que, garantidamente, nunca mais
será a mesma.
Seja
bem-vindo, caro leitor, à crónica inaugural neste desafio que nasce do convite formulado
pela Direcção deste jornal no sentido de animar uma coluna que Sua Excelência
Eu espera duradoira. O registo aqui será coloquial q.b.
Ouviu-se
há dias o impopular analista Gildo Matias chamar atenção para a racionalidade
na leitura sócio-política das medidas e roturas que o novo presidente leva a
cabo, porquanto, frisou, “antes de João Lourenço, havia país”. Realmente é
preciso alcançar a profundidade nesta asserção que à primeira vista parece
tautológica. Todo este entusiasmo mais não é, afinal, do que um hiato entre o
manifesto de intenções e um passado agridoce. O passado é tudo o que de concreto
temos. E o futuro? Ora JLo “orientou” aos recém-empossados gestores da comunicação
social pública a dar mais voz à sociedade civil, no que se infere um
levantamento da cortina tácita e maniqueísta que equipara voz discordante à
oposição política efectiva.
Os
festejos da independência nacional ganharam mais animação com a notícia dos
cortes nas mordomias dos deputados que, sabe-se já, ficam sem os tão
contestados Lexus. O mês de Novembro, há que dizê-lo, não tem sido aconselhável
para automobilistas. É tanta emoção colectiva que distrai a atenção necessária
na rodovia, quanto mais não seja pelas repentinas viagens às memórias, como de
resto ocorre com Sua Excelência Eu ao rememorar o emblemático João Baptista
Cafumbeiro, percursor das greves de fome no início da década de 2000, pese
embora sem a mesma mediatização da geração posterior.
Líder
de ONG de apoio aos carentes e com cariz messiânico, também dono de um carisma
de antigo praticante de futebol, Cafumbeiro começava a celebrizar-se pelos
jejuns de mais de três dias, no Mercado Municipal do Lobito, onde acampava.
Usava túnicas e era acorrentado por discípulos. No seu ar cómico, dizia
incomodar-lhe que houvesse em Angola demasiados carros mas que nenhum era dele.
Chegou a projectar um jejum de dimensão internacional que teria lugar diante da
Assembleia nacional, onde acamparia agrilhoado durante sete dias, ao fim dos
quais seria desacorrentado pelo então presidente de parlamento, Roberto de
Almeida. O certo é que nunca mais se ouviu falar dele nem da ONG. Perdeu-se por
Luanda?
Quanto
ao que está para vir de JLo, o renascentista à mwangolé, ao contrário de
muitos, Sua Excelência Eu até não é nada contra as promessas, sejam elas
eleitorais ou do exercício administrativo. Elas dão indicadores de cobrança de
resultados e de coerência, sob o ponto de vista do exercício da cidadania e da
ética social, desde que garantidos os pressupostos para esta monitoria: uma
imprensa que escrutina arquivos (para lá do facto do dia), uma sociedade civil
consistente e uma mentalidade cidadã participativa. Ainda era só isso.
Obrigado.
Gociante
Patissa | Benguela, 17 Novembro 2017
(*)
Texto inicialmente escrito para a edição inaugural de um jornal semanário luandense
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