domingo, 5 de fevereiro de 2017

Divagações | À espera que os movimentos associativos literários façam o impossível

A história do panorama intelectual angolano está mais ou menos rica de episódios de criação de associações e/ou movimentos literários, caracterizados pelo legítimo entusiasmo juvenil. O carisma, o bicho do talento, a fome do estrelato e também algum seguidismo engrossam a argamassa da utopia (da qual nunca devíamos abrir mão). Os movimentos do pós-independência, até melhor opinião, diríamos que são movidos pelo combustível da luta contra a exclusão perpetrada por segmentos elitistas, o que até a geração de 1980 enfrentou para ser aceite na União dos Escritores Angolanos, que obviamente era um clube de um punhado de privilegiados. Porque a união faz a força, chega-se ao entendimento de que de braços dados com a socialização, as declamações com alguma vaidade excessiva à mistura, publicações periódicas, e acima de tudo com a institucionalização, se chega ao reconhecimento do potencial de cada um. E os ciclos repetem-se. Criam-se grupos, surgem roturas por incompatibilidade de temperamento ou por causa da não renovação de mandatos ou por isto e aquilo. O exemplo mais emblemático é o da idosa Brigada Jovem de Literatura, cuja direcção em média etária anda pelas 45 velas apagadas e talvez já não se recorde do ano em que chegou ao poder, que se calcula ter sido sob promessa de uma próxima assembleia ao fim dos anos que o estatuto prevê. Mais para cá, às vezes dou por mim a ser contactado por jovens que pedem ajuda para influenciar a sua entrada a um determinado movimento e/ou associação literária porque querem, imaginem, ser escritores. Como quem não chegou a pertencer a movimentos literários, o grande receio é se não se estará eventualmente à espera de suculentos milagres. É que para além da oportunidade de um crescimento conjunto, não creio que os movimentos/associações produzam escritores como tal, actividade que aliás é algo bastante individual e exige talento, experiência de vida, domínio rigoroso da língua em que se escreve, isolamento investigativo e criativo. E ancorados no benefício da dúvida, estaremos aqui para ver quantos escritores emergirão com potencial e consistência nos próximos quinze anos dos movimentos (pertinentes, naturalmente) mais notórios e mediáticos por Luanda, Huila e Benguela. Até lá, ficam eventuais desculpas a quem se sentir injustiçado por estas linhas dominicais. Ainda era só isso. Obrigado.
Gociante Patissa. Benguela, 5 Fev 2017
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