Sabino Nunda Casaco (facebook) |
A história das
instituições, a partir do momento em que estas saltam da esfera do sonho para a
materialização, legitima várias perspectivas. E como só podia ser de uma
ingenuidade gigante esperar que exista apenas uma versão de registar a
trajectória e o impacto junto da sociedade, que é em fim último o beneficiário
do altruísmo, a história da AJS (Associação Juvenil para a Solidariedade) é
passível de ser colhida pela perspectiva dos protagonistas, pela das
testemunhas, pela dos continuadores, pela das vítimas (aqui um lamentável fruto
de umas e outras escolhas).
Neste apontamento
ressalta-se outra perspectiva muito valiosa que não se encontra em actas de
reuniões, na glória dos relatórios de projectos implementados e ainda menos na
beleza dos dólares ao bolso. Falo de parceiros desinteressados que se mantêm
anónimos, aqueles que na primeira hora abraçaram o que para muito boa gente
roçava o lunático. Um destes é Sabino Nunda Casaco. A AJS é faísca do sector da
sociedade civil, Organização Não Governamental de âmbito local, nascida do
inconformismo de estudantes do ensino médio (tinha 21 anos o fundador), num
quadro complexo de guerra civil e carência urbana de vária ordem.
Enfim, depois de
conhecer a Okutiuka, coordenada por José Patrocínio, no ano 2000, através da
qual foram adquiridas habilidades em elaboração e gestão de projectos de
desenvolvimento comunitário, chegou-se a delinear linhas de acção, uma delas
sendo a da prevenção de doenças sexualmente transmissíveis. A oportunidade
consistia em "infiltrar-nos" em excursões de jovens para no destino
improvisar palestras e debates sobre o assunto. Mas havia depois um problema,
que era a falta de material de apoio.
Estamos em 2000 e
nessa altura tudo o que a AJS tem é a determinação de quem vende ideias e crê
que mais cedo ou mais tarde apareceria um doador para financiar projectos em
gaveta. Não havia fundos para adquirir material de divulgação e preservativos
junto da ADPP-Esperança ou do PSI (as quotas dos membros mal cobriam as
despesas com táxis entre Lobito e Benguela à procura de estabelecer parcerias).
E do nada surgia o para-médico Sabino Nunda Casaco, da 7.ª Região Militar, e o
seu colega Alexandre Camongua, que durante meses apoiaram o projecto com o tão
precioso material informativo e preventivo.
Casaco, um homem alto,
de falar terno mas também conhecido pelo punho militar firme (criou-se o mito
de ter dado uma bofetada a certo jovem que lhe teria molestado durante uma
festa, tão valente fora a famosa bofetada que o destinatário da mesma desmaiou de
imediato e acordou sóbrio) na altura morava no bairro da Kalumba. Viria a bater
à porta da AJS por influência do seu amigo Simão Marques Marques, membro co-fundador.
Foi na verdade graças
ao impulso do mano Casaco que ganhou corpo a série de projectos "Viver
Contra a SIDA" (financiados de início pela Oxfam em 2003/4 e introduziu a
dinâmica dos activistas voluntários, dos quais cito o João Nunda, o Ricardo Amado Calengue e a Celma Yaveleka Tungalavo Canduli). O maior
"bolo" viria com o financiamento do Fundo Global*PNUD e afins, que
suportou o Boletim "A Voz do Olho" e o programa radiofónico
"Viver para vencer", produzido e conduzido por quadros da AJS via
Rádio Morena Comercial, através do pagamento do espaço de antena.
A natureza melindrosa
da disciplina militar fez com que o patrocínio tão determinante fosse mantido
discreto ao longo destes 18 anos de existência. Obrigado, mano casaco! Teria de
ser amnésia colossal não lhe ter em conta como um membro honorário.
Gociante Patissa,
Benguela, 01 Fev 2017
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