“Em
termos de grelha de partida, como país, partimos mal. Partimos muito mal, para
um país novo, na utopia da unicidade, assumidamente como princípio director da
revolução moçambicana, isso de «vamos matar a tribo para
fazer nascer
a nação». Ora, isso, num país com a
diversidade cultural como a nossa, representou um etnocídio. Penso que mais
tarde é que o próprio partido [no poder, FRELIMO] se deu conta do erro grande
com essa utopia da unicidade e considerou reverter o quadro, valorizando a
identidade dos vários grupos que temos.”
(…)
“Em
termos de identidade, ainda não vivemos uma cidadania plena. Isto porquê, meus
senhores? Porque durante estes 40 anos, vivemos como país um discurso político.
E um país que nasce politicamente precisa de se reencontrar culturalmente. Um país
faz-se de vários discursos.”
(…)
“Durante
estes 40 anos, fomos criando cidadãos de primeira, de segunda, de terceira
classe. Não chegamos à realização da cidadania plena. Ainda não tivemos a
coragem de nos olharmos ao espelho e cada um ouvir a sua voz interior.”
(Fragmentos
da intervenção do escritor moçambicano Ungulani Ba Ka Kshosa. Apontamentos de
telespectador do programa «Debate da Nação», emitido pela STV Noticias, na
noite de 03.08.15)
NOTA
DO BLOG ANGODEBATES:
Enquanto
por cá insistimos em que «a colonização em Angola foi diferente de qualquer
outra colonização», como ouvi há dias de uma importantíssima figura da nossa
história cultural – como que a legitimar o perpetuar de determinados padrões
herdados da assimilação (ainda reinantes, da língua à toponímia, por exemplo),
já outros povos, também colonizados por Portugal, discutem, questionam e
assumem questões que lhes intrínsecas. Mas dada a nossa natureza «especial», é
ponto de partida e chegada a ideia de que o Português não é uma língua alheia
em Angola, o que de facto não é, assim como o seu papel de língua de união não
devia negligenciar a necessidade de se investir no estudo, classificação e normatização
de outras de matriz Bantu e pré-Bantu. O sonho de nação, mais do que apoiar-se
na língua, moeda e autoridade comuns, era suposto implicar essencialmente o
conhecimento e a valorização do “outro” que conforma o mosaico dentro do mesmo
espaço. Isso far-se-ia com políticas concretas para visibilizar e estudar
hábitos e costumes (não necessariamente em pequenos documentários televisivos
ou em efemérides) e a transmissão de geração em geração, assegurando bases
antropológicas, sociológicas, enfim. Oficialmente dizemos que tem sido assim,
só que disso não passamos. Tenho dito que a luta contra o tribalismo (que deve
continuar, claro está) criou efeitos colaterais nefastos, sendo um deles a
quebra da ponte do diálogo intercultural entre a cidade e o campo. Urge debater
a Nação! Gociante Patissa,03.08.15
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