Passei
recentemente uma semana no Reino Unido. Fiquei em Hemel, a 25 minutos de carro
de Londres, que visitei umas três vezes. Saí várias vezes para Watford, que
dista menos de meia hora de carro.
O
bilhete de avião é caro, mas é um investimento útil, tendo em conta que a
língua é uma questão de uso e prática, de outro modo me arrisco a congelar no
subconsciente os quatro anos de universidade na licenciatura em Linguística,
especialidade de Inglês. Daí que de vez em quando "salte" a fronteira
para uns dias na Namíbia.
Durante
a intensa semana na Inglaterra, visitei de máquina fotográfica em punho lojas
(das pequenas às grandes superfícies comerciais), jardim zoológico, hospital,
frequentei o metrô subterrâneo, etc. Para a minha grata surpresa, não senti
aquele aparatoso espectro de insegurança que se verifica nos EUA, onde em 2010
gozei um mês a convite do Departamento de Estado, no âmbito do programa de
intercâmbio Líderes Juvenis Visitantes Internacionais, com uma semana em cada
Estado: Washington DC, Portland-Oregon, Salt Lake-Utah e Miami-Florida.
Longe
de mim fazer apologia à negligência na luta contra o terrorismo, acredito que
os ingleses terão é outros métodos de vigilância, permitindo um equilíbrio com
o direito dos seus cidadãos e estrangeiros a uma maior sensação de conforto. É
este diferencial que torna a visita à Inglaterra mais prazerosa, pelo menos
para pessoas não acostumadas a redundantes submissões a detectores de metais e
aquele tira cinto, põe cinto, abre axilas, deita fora a comida, no típico tom
autoritário americano.
Do
ponto de vista da comunicação, que é afinal o que move um estudioso, sou
partidário do Inglês americano (fora a linguagem do gueto, a do RAP). Gosto da
clareza na articulação, da liberdade em pronunciar o /r/, da musicalidade. É um
conforto que não se tem na dicção dos ingleses, que à primeira vista falam como
se não quisessem ser percebidos, o que remete visitantes aos constantes
“pardon”, “say again?”
A
minha relação com o Inglês data de 1993, meses antes do 15.º aniversário,
quando se despertou a meta de emigrar em busca de melhores condições de
formação, o que nunca se realizou, literalmente falando. Seguiram-se anos de
muita leitura e exercícios de diálogo, inicialmente com ajuda do Paulino Sõi
(primo-irmão materno de primos-irmãos paternos meus), do bairro da Pomba no
Lobito, que dista provavelmente uns 10 Km do bairro Santa Cruz, onde morava eu,
ligação que fazia quase sempre a pé, muitas vezes só com água no estômago.
Nesta época o país enfrentava uma penúria alimentar brutal, resultante do
reacender da guerra civil pelo fracasso eleitoral de 1992.
O
Paulino tinha já livros e uma monumental paciência que me permitia passar
longas horas no seu habitáculo a transcrever vocábulos e expressões. Ao mesmo
tempo, a fim de resgatar o televisor, retido em casa do mestre, passei a vender
estátuas de madeira lá de casa a capacetes azúis britânicos da ONU e com isso
praticar com falantes nativos.
O
domínio do Inglês tem sido tão determinante na minha afirmação, como o têm sido
a educação de berço e a mente criativa. Acredito que a língua de Shakespeare já
me compensou com o que de melhor podia – como digo a brincar –, o que inclui
ter amado, sonhar, bem como traduzir reuniões comunitárias directamente para
Umbundu.
Gociante
Patissa, Benguela, 18 de Abril de 2015
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