Quando uma notícia surge com destaque pelo
facto de a vítima ser parente desta ou daquela figura, fica-se com a impressão
de que, diante da justiça, quem não tiver uma entidade na família parte logo na
condição de desamparado. Recentemente, no que ao nosso meio diz respeito, o
exemplo é o da queixa de uma cidadã por agressão envolvendo militares da
academia do Bairro da Luz, no Lobito. O destaque foi pelo ângulo de ser filha
de um antigo deputado. Somos a
condenar as agressões na relação entre os cidadãos e as forças da ordem, e é
legítimo esperar que se investigue para se apurarem as responsabilidades. Mas,
neste caso, e da maneira como a imprensa colocou as coisas, a agressão doeria
menos se fosse sobre a filha de camponês ou de um professor anónimo? Ora, o
jornalismo, a meu ver, tem uma obrigação até cívica de não reproduzir tais
estereótipos. Ainda nesta senda, em tempos vi uma matéria na imprensa
brasileira, onde toda a notícia e consequente reportagem do cortejo era pelo
ângulo de "o irmão do cantor fulano ter falecido" (no caso, vítima de
paragem cardíaca após consumir bebidas alegadamente energéticas). Rara era a
vez em que se pronunciava o nome do finado. Partindo do princípio de que somos
todos iguais perante a lei, julgo que o jornalismo tem a obrigação moral de
destacar "o quê" (facto) e "quem" (vítima/protagonista),
evitando ancorar-se no parentesco, que podia bem surgir como detalhe apenas e
não valor da notícia, sob pena de andarmos perto do sensacionalismo. Um cidadão
devia valer pelo nome próprio, pelos seus actos, não pelo sobrenome. Ou não?
Gociante
Patissa, Luanda, 13.01.15
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