São
19h45 quando a boleia chega à porta do Hotel. O destino é pertinho, cinco
quilómetros talvez. O evento inicia às 21h00. A antecedência seria, em termos
aritméticos, tempo excessivo, mas… isto é Luanda. A margem de erro para qualquer
prognóstico de chegada atinge os 90%, tal é o engarrafamento. Mais cedo, melhor.
Embarco
no Jeep do amigo Lauriano Tchoia, que fez questão de me pagar o ingresso. “Mano,
a cultura merece todo o nosso apoio”, sublinha ele, ladeado pela esposa. No rádio,
o som de Teta Lando. Evidente é a minha ansiedade. Seria o meu primeiro “Show do
Mês”, iniciativa do projecto “Nova Energia”, que tem no polivalente Yuri Simão um
peixe na água do espaço mediático, uma vez profissional de comunicação e agente
Fifa.
Já
são 20h20. Tudo a correr bem. Até espaço para estacionar ainda fomos a tempo de
achar. Estamos numa das unidades hoteleiras de Talatona, distinta zona residencial
e comercial de ocupantes com grande capital na capital. Vamos a meia hora de
ver ao vivo e com suporte da Banda Maravilha o Robertinho (Fernandes Lucas da
Silva, Malange,
1958), proeminente voz da música angolana nos anos 80 e 90 do século 20. Artista
convidado é tão-só Jacinto Tchipa, carismática voz militar do mesmo período.
“Pode
olhar no seu relógio, são 21h00.”, ouve-se uma voz incógnita, algo radiofónica,
a confirmar a pontualidade que só prestigia ainda mais a organização. Isso, se
tivermos em conta que eventos do género – e até outros de natureza oficial, académica
e/ou cívica – costumam começar com “ligeiros atrasos”, às vezes, superiores a duas
horas.
Abrem-se
as cortinas. Entra o grande Robertinho em muito boa forma e sóbria interacção
com o público, longe daquele humor rasca e mecânico de jovens estrelas do semba.
Ao terceiro número, “uma homenagem a Zécax, meu amigo”, até porque “amanhã é
fim-de-semana”. Pouco depois, embarca a plateia numa viagem a Cuba. Outra homenagem
a uma voz amiga que já não está em vida. Para grandes missões, grandes comandantes.
É o que demonstra a corista residente, cubana de nacionalidade.
A
entrega do público é impecável, auditório quase lotado, acústica muito boa,
entrosamento da banda uma “maravilha”. De repente, há um movimento misterioso.
Robertinho, que ainda a meio do show teria razões para estar inebriado,
abandona o palco, sem se despedir. A banda permanece. Corta-se o som. Começa o
solo. A plateia rasga-se em palmas. “Cartinha de Saudades” traz Jacinto Tchipa,
verdadeiro hino, um clássico indissociável da nossa história, feliz elaboração
estética sobre a mobilização para a defesa da pátria. A balada chega ao fim,
fim este que a plateia não aceita. Bis!
Segue-se “Maié, maié”, já mais ritmado. Antes, Tchipa, Vencedor do Top dos Mais Queridos duas vezes consecutivas (1986/87), hoje entre os excluídos da miopia da ribalta, deixa apelo por mais oportunidades: “Eu sou o músico convidado do Robertinho; também espero um dia estar com vocês.” São 22h00. Tchipa despede-se, sala ainda ao rubro, pedido entretanto indeferido pelo anfitrião, que impõe um bis. A banda acata. Agora é Tchipa e Robertinho dividindo as palmas. Às 22h30 fecham-se as cortinas que viram desfilar “Kiowa”, “Problemas”, “Joana Mu Kua Di Fuba”, “Ka Kinhento”, “Desespero”, para só citar estes temas. Foi um grande show e recomenda-se!
Gociante Patissa, Luanda 2 Agosto 2014
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