Quando já não tivermos o fulgor do pintor, nada estará
perdido enquanto restar a plasticidade… do pincel. O contrário é chorar por
algo que nunca foi nosso - a vida - não celebrando, por involuntária justiça
que seja, o que de tangível possuímos - a obra.
No mês em que se assinala um ano desde que o pintor Délio
Batista faleceu, volto a partilhar a relevância que ele teve na minha
trajectória. Quando em 2008 precisei, por recomendação da editora, de um quadro
para capa do «Consulado do Vazio», o livro de poemas com que me estreei, e após
fracasso com outros artistas, Cláudio Silva “Pepino” apresentou-me a Délio
Batista, um artista plástico de curriculum vastíssimo. Eram nove e tal da
manhã. E por volta das 11h00, o kota Délio já me havia cedido «De Pernas
Cruzadas», com que me enamorei dentre o seu acervo. Tudo a custo zero.
Passei a tratá-lo por tio Délio a partir dali, de tal sorte
que o tive como um padrinho, carinho que de resto era retribuído. Tive o privilégio
de ser a pessoa que mais o fotografou nos últimos anos de sua passagem pelo
mundo, quase sempre com a finalidade de elaborar folhetos para exposições em
perspectiva.
Junto ao meu o testemunho do veterano jornalista da RNA,
Lilas Orlov. «O Primo Délio Batista é uma acácia de ouro que não tombou. Não
tombou porque a sua mestria na arte das cores continua viva nas telas, nas
pinceladas de amor e de protesto. Em casas e escritórios desta Angola ainda
observamos com carinho, retratos das crianças carentes, dos deslocados de
guerra, da mulher privada do verdadeiro amor, das lágrimas choradas que fizeram
dele o “nosso Picasso”. Tinha uma devoção pela solidariedade e a defesa dos
mais fracos para quem sempre irradiava aquele simpático sorriso de “primo”. Eternizou
o seu pincel ao documentar com a sua arte livros de escritores como Raúl David,
Nuno de Menezes, Carlos Gouveia “Goia”, José Guerreiro, entre outros».
Não deixando de ser actuais, vêm a propósito os dizeres do Coordenador e
co-fundador do Núcleo de Jovens Pintores de Benguela e membro da União Nacional
dos Artistas Plásticos (UNAP) José António Júnior “Ducho”, para quem a morte de
Délio representa uma grande perda, porque «além de ser um grande mestre, era
também um grande conselheiro, estava sempre disponível a dar o seu contributo
para o desenvolvimento das artes. Délio foi isso! Não podemos esquecer que ele
foi o primeiro representante da UNAP em Benguela».
Sem
pretensões biográficas como é o género crónica, vale realçar apenas que Délio
Baptista, que Luanda viu nascer em Setembro de 1947, teve em Benguela seu berço
adoptivo, onde viria a falecer por prolongada doença a 19 de Julho de 2013.
Teve mão numa interminável lista de exposições, muitas das quais associadas aos
apelos ao fim da guerra e conquista da paz e estabilidade, exerceu jornalismo
na Angop, rádio e no Jornal de Angola, além de proeminente figura da UNAP.
Entre
milhares de dialécticas razões pelas quais nos podemos lembrar da passagem de
alguém pela Terra, eu retenho o seu monumental exemplo de solidariedade
artística. Délio está entre nós, presença tão certa como a imortalidade da sua
pintura.
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