(I)
“Senhor inspector, tem uns cinco minutos? Gostaria de ter uma palavrinha…”
“Claro, senhor pedagógico…”
“Senhor inspector, como apesar de ter o superior de pedagogia fui sempre uma voz pragmática, vou directamente ao ponto…”
“Sim, pode pontuar… Estamos aqui para isso.”
“Pois, você me desculpe, mas… quer dizer… o trabalho já está concluído?”
“Se se refere ao inquérito, sim, está arrumado…”
“Mas há qualquer coisa que não bate certo…”
“Como assim? Usamos as técnicas e métodos todos em vigor no sistema de educação…”
“A questão até não é sistémica…”
“Senhor director pedagógico, não sei se sabe e não pretendo assim, tipo, tecer alguma ameaça, mas o tempo está a contar…”
“Meu caro Inspector, compulsada a papelada, notamos que há fortes indícios de fraude no resultado do inquérito. Senão vejamos. Dispusemos um dossier com irregularidades, certo? Inclusive aquele caso da chave interceptada em flagrante delito em mãos de aluno. Então, assim de repente a evidência desaparece e o professor em causa é ilibado?”
“Não estou a acreditar, ó Jesus! Estas palavras assim estão a ser dirigidas à minha pessoa?…”
“Senhor inspector, onde estão as provas que incriminam o colega que passou para os alunos a chave com as respostas do exame? Então só esteve consigo, agora não aparece?”
“Vocês ainda não me conhecem, né? Vão ver só!…”
(II)
“Bom dia, chefe. Quer dizer… Ainda boas entradas, um ano novo recheado…”
“Pronto, já percebi. Vamos encurtar as cortesias, o tempo é dinheiro. Já agora, meu compatriota, lhe desejo o mesmo, à sua família, os seus colaboradores, vizinhos, enfim, entes queridos, as melhores venturas. Que o Poderoso derrame a sua luz para a saúde dos enfermos, o juízo dos presos, o amor ao próximo e que tenhamos uma Angola comprometida com o desenvolvimento e a justiça, custe o que custar. Ah! Mas você ainda é quem mesmo?”
“Eu sou o director pedagógico da Escola da Torre, fui notificado para vir responder ao Excelentíssimo Inspector Geral Provincial…”
“Afinal é você?! Só estamos já a ouvir a vossa fama… conta! O que se passou afinal de contas?”
“Chefe, é assim. Notamos graves indícios de contaminação de evidências, tão graves que chegaram a condicionar a lisura e desfecho no inquérito que solicitamos por fraude.”
“Como assim?”
“Depois do trabalho do inspector, verificamos que haviam desaparecido do dossier evidências estrondosas…”
“ESTRONDOSAS SÃO AS VOSSAS INSUBORDINAÇÕES, PÁ!!! Estrondosas, estrondosas…”
“Não estou a apanhar a ideia, chefe…”
“Você acha que um simples professor de carreira, mesmo já que é director pedagógico, tem respaldo para inspeccionar um inspector em funções?! Estás bem no teu lugar, filho…”
“Mas devíamos proceder como perante tão flagrante indício?”
“Quem determina flagrante, ou não, somos nós, amigo! ESTÁ A OUVIR BEM, NÉ?! O que é vosso é deixar o homem fazer o trabalho dele, depois, se for o caso, reportar aqui à chefia o fora da norma para devido tratamento, ok?! Nunca ouviu falar em paradigma ou quê?!”
Gociante Patissa. 03.01.2017, Aeroporto Internacional da Katombela
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