A pior das partidas que nos pode alguém
chegado pregar é, certamente, partir.
Eliseu Mondi Pedro Figueiredo confunde-se com a língua inglesa, à qual viria a
dedicar duas décadas de auto-didactismo, chegando a dar aulas no terceiro nível
dos Bambus na Katombela, onde residia, e mais tarde no católico Instituto de
Ciências Religiosas de Angola (ICRA), no bairro da Caponte, Lobito, onde veio a
residir. O extrovertido, criativo e brincalhão Mr. Elisha (por si próprio
pronunciado /elitsha/) abraçou o inglês por influência do irmão mais velho, dos
poucos tradutores benguelenses no contexto de emergência, resultante do
fracasso eleitoral de 1992, a época dourada da ONU e demais agências
internacionais de caridade.
Já na sexta classe, dava o Eliseu nas vistas pelo vício das contagens em voz alta, qual récita a Shakespeare, pelos corredores da escola Comandante Dangereux, na Katombela. E pregava bwé de partidas aos colegas, eles que mal sabiam o que era o verbo «To Be». Mesmo já quando o conheci na sétima classe, onde começava o ensino de inglês antes de surgir essa coisa chamada reforma educativa, foi com o inevitável receio de lidar com ele, pois era reinante o espírito de competição entre os falantes. A empatia foi à primeira vista!
Já na sexta classe, dava o Eliseu nas vistas pelo vício das contagens em voz alta, qual récita a Shakespeare, pelos corredores da escola Comandante Dangereux, na Katombela. E pregava bwé de partidas aos colegas, eles que mal sabiam o que era o verbo «To Be». Mesmo já quando o conheci na sétima classe, onde começava o ensino de inglês antes de surgir essa coisa chamada reforma educativa, foi com o inevitável receio de lidar com ele, pois era reinante o espírito de competição entre os falantes. A empatia foi à primeira vista!
De carteira acabamos sendo colegas até
ao primeiro ano do ensino médio, optando pelo curso de ciências sociais no
Centro Pré -Universitário (PUNIV) do Lobito. O Eliseu pregaria outra partida a
professores e alunos com uma suposta habilidade em conjugar o «To Be» na língua
Umbundu, quando na verdade dizia o verbo defecar. E ria-se à brava, para o meu
desgosto.
Estamos em 1996 e eu, que gozava já de
certa notoriedade mediática por colaborar num programa infanto-juvenil da
Televisão Pública de Angola, não via como continuar os estudos.
Como se não bastasse andar de ténis com
a sola gasta ao ponto de o polegar beijar o chão, impunha-me o professor Barros
um ultimato; não tolerava o bloco de facturas para os apontamentos do seu
sagrado português. Só podia ser indisciplina, acreditava ele. Por seu turno, o
professor Kupuiya, com quem me havia incompatibilizado pela imaturidade com que
o corrigia em plena aula, decidira ser pai; isentou-me de pagar as folhas de
prova de inglês. Como compensação, eu partilhava com ele jornais e livritos que
me chegavam por correspondência. Mas… e as outras provas? Eram dez disciplinas,
e o Eliseu teve a providencial ideia de custear boa parte delas. Financiava de
vez em quando um lanche na cantina da professora Belinha. Ofertou-me também uma
camisola lilás com a qual fui a tempo de fazer bonito na TV.
Bem, depois de o agradecer no meu livro
de estreia, Consulado do Vazio, entendi metê-lo na primeira versão deste livro
de crónicas, enquanto personagem de uma cena da vida real num texto que está lá
mais para diante, que ele iria a tempo de ler se o salto entre o fim da escrita
e a colheita em papel fosse menos elástico. Muito longe de imaginar que tivesse
tão cedo de traçar esta outra crónica panegírica.
Julgava-se no direito de arranjar um
emprego que prestigiasse a minha vocação e aptidão. Há dois meses, falou-me da
oportunidade numa promissora multinacional japonesa no Huambo como tradutor e
assessor de comunicação. Fiquei à espera de mais dados. E o Eliseu foi hoje a
enterrar, derrotado por um estado de saúde que há muito titubeava. Ninguém faz
ideia dos últimos suspiros do homem. Espero que tenham sido sob um sonho com
diálogos em inglês. Seja como for, Eliseu, não te perdoo essa partida de
partires!
Lobito, 9 Junho 2014
Gociante Patissa. In «O Apito Que Não Se
Ouviu», 2015. Pág. 56-57. União dos Escritores Angolanos. 1.ª Edição. Luanda,
Angola . 2015 Colecção: «Sete Egos»
___________
(*) livro de crónicas disponível na
Livraria Sucam e na Tabacaria Grilo, em Benguela, ou na sede da União dos
Escritores Angolanos, em Luanda, sita no Largo das Escolas. Mil Kwanzas o
exemplar
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