O escritor
angolano Gociante Patissa concedeu uma entrevista a Sky Culture e-Magazine, na
qual falou, entre outras coisas, da literatura angolana; da relação cultural
Brasil/Angola, e é claro, das suas obras. Conheça mais sobre Gociante Patissa,
lendo a entrevista abaixo. Boa leitura!
Sky Culture
e-Magazine:
Fale-nos quem é Gociante Patissa.
Gociante
Patissa: Daniel
Gociante Patissa nasceu na comuna do Monte-Belo, município do Bocoio, província
de Benguela, em Dezembro de 1978. Tem licenciatura em Linguística, especialidade
de Inglês, pelo Instituto Superior de Ciências da Educação da Universidade
Katyavala Bwila (ex-Agostinho Neto). É membro efectivo da União dos Escritores
Angolanos e colaborador do Jornal Cultura, da Edições Novembro. Foi distinguido
com o Prémio Provincial de Benguela de Cultura e Artes 2012, na categoria de
Investigação em Ciências Sociais e Humanas, «pelo seu contributo na divulgação
da língua local Umbundu, na perspectiva das tradições orais, através do conto e
novas Tecnologias de Informação e Comunicação». Foi a participar num programa
infantil da Televisão Pública de Angola que em 1996 se revelaram as inclinações
para o jornalismo e a literatura. No sector da sociedade civil serviu como
gestor de projectos de desenvolvimento comunitário, tradutor/intérprete
(Umbundu-Português-Inglês) e jornalista free lance. Entre 2003-2010, foi
realizador e moderador de mesa redonda radiofónica sobre cidadania e saúde
preventiva, editando ao mesmo tempo o Boletim informativo, educativo e cultural
A Voz do Olho, ao serviço da AJS (Associação Juvenil para a Solidariedade), ONG
angolana que ajudou a fundar em 1999. Serviu ainda a Save The Children e a
Handicap International nas províncias do Huambo e Benguela.
Sky Culture
e-Magazine: Qual o seu
gênero literário? Quais obras publicadas?
Gociante
Patissa: Eu escrevo
contos, poesia, crónicas. De prosa mais extensa tenho uma novela.
OBRAS
PUBLICADAS:
— Consulado
do Vazio (poesia), KAT - Consultoria e empreendimentos. Benguela, Angola, 2008.
— A Última
Ouvinte (contos), União dos Escritores Angolanos. Luanda, Angola, 2010.
— Não Tem
Pernas o Tempo (novela), União dos Escritores angolanos. Luanda, Angola, 2013.
— Guardanapo
de Papel (poesia), NósSomos. Luanda, Angola / VN Cerveira, Portugal, 2014.
—
Fátussengóla, O Homem do Rádio que Espalhava Dúvidas (contos). GRECIMA.
Programa Ler Angola. Luanda, Angola, 2014.
— O Apito
que não se Ouviu (crónicas).União dos Escritores Angolanos. Luanda, Angola,
2015.
— Almas de
Porcelana (poesia reunida). Editora Penalux. São Paulo, Brasil, 2016.
PARTICIPAÇÃO
EM ANTOLOGIAS:
— III
Antologia de Poetas Lusófonos. Folheto Edições, Leiria. Portugal 2010.
— Conversas
de Homens no Conto Angolano - Breve Antologia (1980 – 2010). União dos
Escritores Angolanos, Luanda, Angola, 2011.
— Balada dos
Homens que sonham - Breve Antologia do Conto Angolano(1980 – 2010). Clube do
Autor, Lisboa, Portugal 2012.
— Di Versos
- Poesia e Tradução, nº 18. Edições Sempre-em-pé. Maia, Portugal, Fevereiro
2013.
— A
Arqueologia da Palavra e a Anatomia da Língua – Antologia Poética. Movimento
Literário Kuphaluxa. Maputo, Moçambique, 2013.
— 800 ANOS /
O Futuro da Língua Portuguesa. Bela e o Monstro, parceria entre o jornal
PÚBLICO e o «Movimento-2014». Lisboa, Junho de 2014.
— Di Versos
- Poesia e Tradução, N.º 22. Edições Sempre-em-pé. Maia, Portugal, Fevereiro
2015.
— Pássaros
de Asas Abertas. A.23 Edições & União dos Escritores Angolanos. Lisboa,
Portugal, 2015.
— Angola 40
Anos - 40 Contos - 40 Autores.Mayamba Editora, Luanda, 2015.
Sky Culture
e-Magazine: Atualmente
o Senhor está se dedicando a escrever algum livro? Se sim, fale-nos um pouco a
respeito. Tem previsão de lançamento?
Gociante
Patissa: Diria que
sim, embora não possa avançar muito mais em termos de pormenores, enquanto
ainda aguardo o resultado da avaliação por uma editora fora de Angola à qual
sumeti sob sua proposta um livro de contos.
No ano
passado tive uma grata experiência com a Editora Penalux, com sede em São
Paulo, Brasil, que me contactou e fizemos uma parceria que resultou na
publicação de «Almas de Porcelana», que reune a minha poesia publicada em dois
livros e também em antologias dispersas, sem deixar de incluir textos inéditos.
Sky Culture
e-Magazine: O que o
Senhor tem a nos dizer a respeito da literatura angolana neste momento? Que
autor ou autores o Senhor destacaria?
Gociante
Patissa: A
literatura angolana neste momento anda a dois tempos descompassados entre
aquela produzina no país e a que é feita em Portugal (que é o mais visível
canto da diáspora angolana). O principal problema da literatura feita em
Angola, para todos os efeitos a mais representativa, tem que ver com a
distribuição. O livro praticamente não circula. Como não temos uma indústria do
papel, tudo por cá é importado e o produto acaba custando caro. O genérico é
sairem mil exemplares de cada título publicado, quando o país tem mais de 20
milhões de habitantes. Já sem falar de uma inexistente crítica literária
interna, uma vez que os estudiosos de letras enveredam logo para a docência,
não havendo grandes estímulos para a pesquisa. Por outro lado, aqueles mais
próximos de Portugal, por proximidade cultural ou por nele residirem, acabam
beneficiando da acutilância de grupos editoriais europeus. A isso soma-se o
“filtro” do lobby editoras-academia-imprensa (o que em certa medida se extende
ao mercado brasileiro quando se olha para produção literária africana), o que é
redundante em termos de autores visíveis. Temos assim um quadro em que mais
facilmente se conhece como bom escritor angolano alguém que se estreie em
Portugal do que os nomes internamente confirmados de uma geração que despontou
ainda na geração de 80.
É difícil
indicar nomes de autores a destacar, tendo em conta que os bons não são poucos.
Dos autores angolanos mais “injustiçados” pelos critérios da visibilidade
internacional, destacaria João Tala (médico e militar), que é um contista de
mão cheia e internamente o mais premiado membro da União dos Escritores
Angolanos. Abreu Paxe tem-se destacado também pela rotura constante em termos
de forma. Mas há outros nomes, tais como Adriano Botelho de Vasconcelos,
Roderick Nehone, entre vários.
Sky Culture
e-Magazine: Como o
Senhor ver a relação cultural entre Angola e a América Latina, especialmente o
Brasil?
Gociante
Patissa: Creio que
podia ser melhor. Em certa maneira seria a meu ver mais fecundo que o Brasil
não dependesse tanto da influência portuguesa quando o assunto é colher
literatura africana. E neste capítulo, julgo que as áreas de cultura da
embaixada brasileira deixam um tanto a desejar.
Sky Culture
e-Magazine: Que autor
brasileiro é mais conhecido pelos angolanos?
Gociante
Patissa: Como o nosso
sistema de educação (ainda) não obriga a leitura de obras inteiras, senão
excertos, então é difícil aferir que autores internacionais são mais
conhecidos. Penso que Jorge Amado pode ser o mais referenciado, muito em função
de telenovelas brasileiras, acho eu. Há ainda, embora longe do campo da
literatura, o nome de Paulo Freire. Paulo Coelho não deixa de cá dar o ar da
sua graça, sempre envolto em debate quanto ao seu (não) valor literário. De
qualquer modo, esse olhar a autores brasileiros também é bastante superficial,
excepto para aqueles que se tenham formado no Brasil ou tenham dado na
universidade a cadeira de literatura brasileira.
Sky Culture
e-Magazine: Como
o Senhor ver o escritor e as novas mídias? O Senhor tem algum blog?
Gociante
Patissa: As novas
mídias são um recurso valioso. Para autores como eu, que não têem para já
aquela máquina de agenciamento, um blog é uma janela útil para conhecer e
dar-se a conhecer. Tenho feito determinantes amizades. Tenho dois blogs, sendo
o www.angodebates.blogspot.com mais generalista (cidadania, literatura e fotografia)
ao passo que o www.ombembwa.blogspot.com incide mais sobre o compromisso na
pesquisa, tratamento e divulgação da tradição oral da língua/cultura umbundu,
da qual sou originário.
Sky Culture
e-Magazine: Deixe sua
mensagem ao público brasileiro.
Gociante
Patissa: Deixo
gratidão pelo tempo que vão dedicar a este trabalho. Aproveito também agradecer
a cordialidade de amigos brasileiros que tenho conhecido, quer inicialmente
através dos meios virtuais, quer através do contacto durante a passagem por Salvador
da Bahia, onde em 2013 participei na sexta Bienal de Jovens Criadores da CPLP.
Obrigado!
Sky Culture
e-Magazine: Muito
obrigado!
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