Uma das coisas que me desesperam é a
cada vez mais acentuada postura dominante (para dizê-lo de maneira simpática) em
pré-jovens e jovens angolanos. Desespera-me por ser quase sempre pelas piores
razões que tal atitude se destaca. Tanto que até povoamos (os bons pagando
pelos ruins) no anedotário namibiano, como cheguei a acompanhar pela televisão
daquele país vizinho, onde me encontrava em gozo de férias.
O angolano é descrito como alguém que
atropela normas sociais tão elementares, como respeitar o silêncio e a ordem de
chegada. Nas relações comerciais, o angolano é conotado como sendo boçal e
mandão, algumas vezes até avaliando o valor de outrem a partir dos bens
materiais que (não) tem, entre outras coisas. É claro que generalizar é
injusto, mas não se pode ignorar que as tendências alimentam culturas.
Já por esta via cheguei a deplorar a
passividade com que aceitamos que dentro de um Hiace (táxi mini-autocarro)
qualquer passageiro decida ouvir em mãos livres a música do seu telemóvel. Lá
vamos nós construindo um "homem novo" cujo horizonte mais distante é
o que o umbigo permitir. É ver como, no trânsito, vai caindo em desuso a ordem
de prioridade, substituída no mais das vezes por aquele sorriso sarcástico de
quem se julga o maior. No meu tempo de retratista ambulante, já cobri festa de
aniversário numa residência que ficava a menos de 20 metros de uma outra em
óbito.
Se eu não cometo erros? É natural que
sim, que sou parte do problema, do mesmo modo que a utopia me obriga a pensar
que faço parte da solução. Esta ladainha foi despertada por uma cena de breves
minutos, hoje. Para não incomodar a senhora que cuida da higiene do meu
habitáculo, geralmente faço o compasso de espera na serventia, em companhia da
minha viola, do iPad e do dispositivo de internet, levo o telefone também.
Às tantas chegam quatro moços, um deles
saúda: Boa tarde, meu kota, para a minha alegre correspondência (pois na
cultura Bantu, em que a hierarquia etária é um estatuto relevante, ele fez o
que lhe cabia, tratar-me por kota, irmão mais velho, pessoa mais velha). Logo pergunta
se um dos jovens do quintal está e, enquanto eu gaguejo, uma senhora (governanta,
maior de 50 anos) responde que sim: Está mesmo ali, entra só.
A senhora borrifa o pátio, de balde à
mão, desfazendo-se da água de lavagem, na crônica inexistência de
infraestruturas de drenagem na periferia. O jovem, entretanto, impõe-se: Mãezinha,
faz favor, vai só lhe dar um toque. E a mais velha repete que ele podia muito
bem entrar pelos próprios pés. Seria mais fácil, insiste o visitante, a mãe
entrar e dizer a ele que estou aqui. Ora, "cumprir" a ordem do rapaz
implicaria da parte da trabalhadeira interromper a sua tarefa. Ela, tal como eu
em repúdio tácito, não recua: Vou dar mais toque de quê? Entra só mesmo. Aí,
obrigado a engolir a sua supremacia, o visitante disfarça: Ah, mas não tem cão
ali? E ela: Não. Entra só, bate à porta.
Onde estarão a falhar os agentes de
socialização mais representativos, nomeadamente a família, a igreja e a escola?
Será que a disciplina de Educação Moral e Cívica (EMC), introduzida no
currículo escolar depois de 1992, tem produzido algum impacto no perfil de
saída dos nossos estudantes? Que tal excluir o ensino da EMC? Um abraço.
Gociante
Patissa. Benguela, 18.06.2015
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Bem. É uma nota tão veridica e muito preocupante. Ao nos deparar com discursos de dirigentes de soberania, vemos uma guerra contra Idéias de ouro mas, por ser um atentado à verdade caiem por águas baixos. Devemos reflectir.
Por acaso o quadro é preocupante, muito mais por não sabemos se o pior é o que vemos ou que ainda está para vir, meu caro Efraim. Aquele abraço
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