A crítica literária (que é uma competência da academia) deve aos poucos simplificar ferramentas para que os fazedores de divulgação (no caso a imprensa) saibam olhar e valorar as artes pela sua essência, evitando com isso redundâncias de nomes e rostos.
sábado, 30 de junho de 2012
sexta-feira, 29 de junho de 2012
quinta-feira, 28 de junho de 2012
terça-feira, 26 de junho de 2012
Crónica: Missang mais de quiêêê?
Os políticos e os experts em relações
internacionais, que têm o defeito das estratégias e das ciências, andam agora a
discutir o regresso, ou não, da Missang à Guiné-Bissau. Eu gosto mais de
missanga, que as mulheres usam ao pescoço para, de quando em vez, servirem de
brinquedo do bebé ao colo. Missang sempre me pareceu incompleto, e sempre rezei
para não entrar nunca no dicionário de língua portuguesa (sim, porque a língua
portuguesa cresce mais em África do que em qualquer parte, de tanto que
abocanha de expressões e mambos daqui). Bem, também nunca já gostei mesmo de
saber com que peças se forma essa missang(a) insidiosa. Então, se o pescoço
turbulento chamado Guiné-Bissau, que gosta mais de solavancos do que do suave
dom de respirar, entendeu que os angolanos "tunda!", já não voltamos?
Agora vem mais é porque "enju!"? E, é verdade, ainda vêm esses
sabichões dizer que o melhor seria voltar para lavar nossa cara diplomática? E nós
precisamos de cara diplomática? Diplomática não é aquela pasta que rima com gravatas, cheia das
vaidades e cujo conteúdo geralmente não sabemos, de vez em quando escuso mesmo?
Falo como homem do kimbo, não dado às mundivicências modernistas, mas tenho
palavra. Não vá nenhum soldado mais à Guiné-Bissau. Exijo. Mas de onde vem a
legitimidade? Indagarão uns. Ora, do facto de a minha mãe ter levado um tiro de
raspão na bocheca, quando me trazia às costas, nos anos em que essa Angola andou
em guerra. Não fosse a péssima pontaria do outro, era na minha cabeça a bala e
pronto!, seria um anónimo, uma quase existência. E ainda me vão dizer que o
soldado vai lá para garantir a paz, logo na Guiné-Bissau, onde esquartejar
inimigos é coisa banal?! Os soldados angolanos por acaso não nasceram de mães,
quantas delas camponesas e lutadoras pela vida (enquanto os maridos serviam a
pátria, vivos ou mortos ou quase isso, algures), na esperança de ver o filho
com um pouco de escola e ofício?! Eu até não gosto de polítiquices, mas
chega!!!
Gociante Patissa
segunda-feira, 25 de junho de 2012
domingo, 24 de junho de 2012
Crónica: O Teorema do Absurdo versus Ambliopía Civilizacionômana - Em alusão ao dia Internacional da Criança
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Foto "roubada" ao Facebook do autor |
__ Eu sou o mundo! __ Disse-lhe eu, sem vontade, sentindo-me com a alma
descalça. A criança mirou e remirou-me de cima a baixo, e as lágrimas rolaram
pela sua face rosada:__ o mundo?__sim__volvi eu.__ o mundo assim?__insistiu
ela.__Assim como?__inquiri, perplexo.__mundo assim, fardado, com patentes,
dinheiro a abarrotar os bolsos e sangue por todo lado? Não o senhor não pode
ser o mundo! __ disse a criança.__ …bom, não sei o que será que esse tal velho
barbudo te disse sobre mim, ou que mentira terão escrito sobre mim na Bíblia,
mas dentre todos os planetas, eu sou o único que responde pelo nome de
Terra-Mundo, quer gostes ou não, eu sou isso, e assim mesmo! Amo tanto a paz
que invisto excessivamente no ódio. Sou tão alegre que sigo promovendo a
tristeza. E é por amor á vida que mais me vicio na arte de lamber a morte!...
Fridolim Kamolakamwe, 1 de Junho de 2012 (Kaula10@hotmail.com) In http://fridolimkamolakamwe.blogspot.com/
sábado, 23 de junho de 2012
Por «roubo» de músicas de Artur Nunes, Irmão do «Espiritual» exige indemnização a Yuri da Cunha
Fonte:
Semanário Angolense EDIÇÃO 471, 23/06/12, assinado por Pascoal Mukuna
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Foto: SA |
«O Mano não gostava que mexessem nas suas músicas,
como é que esse indivíduo qualquer mexe nas coisas do meu irmão, que são sagradas, e oferece uma garrafa de bebida alcoólica, quando a minha mãe
nem sequer consome álcool? A Mãe, Maria Luísa José Neto Fernandes está doente desde o dia em que
Yuri da Cunha lançou o disco com músicas de Artur Nunes, pois a tensão
subiu-lhe.
Falando
ao SA, a anciã contou que naquele dia, Yuri da Cunha prometeu-lhe dar «alguma
coisa», que não especificou. «Vou-me embora para Londres, onde está um meu
filho, para me tratar», anunciou. Entretanto, quando regressar ao país, vai
exigir a merecida compensação a Yuri da Cunha. «Yuri da Cunha é useiro e
vezeiro nesse tipo de comportamento», apontou o presidente da SADIA, Lopito
Feijó. Havendo quem se sinta lesado, deve dirigir-se à SADIA para uma
negociação razoável, com o objectivo de reparar o abuso de se oferecer uma
garrafa de bebida alcoólica a uma mais velha de 90 anos, cinco chaves e um
único disco.
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Foto: Platina Line |
Um
irmão do malogrado músico Artur Nunes exige que Yuri da Cunha indemnize a
família do «Espiritual», por o jovem cantor ter gravado músicas do segundo sem autorização
da família, soube o Semanário Angolense de Domingos João Faustino «Mingo
Nunes», prometendo recorrer a instâncias internacionais, caso o problema não
seja resolvido internamente.
«Estou
ferido e revoltado, porque Yuri da Cunha gravou abusivamente as músicas do meu
irmão, não consultou previamente a família e abusou do património familiar», protestou
o também cantor, acrescentando que, o que ele fez «foi roubo das músicas do ‘Mano’
(alusão a Artur Nunes). Tem de nos indemnizar», asseverou.
Foto: Platina Line |
Yuri
da Cunha está a comercializar um disco com nove composições de Artur Nunes, «ainda
por cima, mal interpretadas e num quimbundo sofrível», que há dias apresentou
publicamente. Mingo Nunes fixou em o equivalente a cem mil dólares o valor que
Yuri da Cunha terá de pagar por cada música, pelo «uso abusivo» das músicas de
Artur Nunes. », questionou.«Isso nem é plágio, é roubo, tomara que mantivesse a
voz de Artur Nunes e mudasse somente a instrumentalização. Ele não contactou
previamente a minha mãe», frisou.
Artur
Nunes, que morreu aos 29 anos, nasceu no Bairro Cuba, Sambizanga, tendo começado
a cantar em turmas. Mingo recorda-se de o irmão lhe ter oferecido uma camisa de
Congo em 1977. Deu a conhecer que ele está a lutar para que a família beneficie
de reforma musical e militar.
O seu
irmão, que deixou 23 músicas, disse-lhe, em sonho, para interpretar somente a
canção «Peixeiras do Sambizanga», lembrando que Artur Nunes sentava-se num beco
junto a casa e cantava, ao mesmo tempo que tocava viola e compunha as suas músicas,
enquanto ele o apreciava. Se vez em quando levava-o a alguns espectáculos.
Mingo
segue as pegadas de Artur Quando, em 1977, foi assassinado, o Espiritual integrava
o agrupamento musical FAPLA-POVO, formando o chamado «Trio da Saudade»,
juntamente com David Zé e Urbano de Castro. Era noivo de uma na altura moça, de
nome Lena.
A veia
musical Artur Nunes herdou-a dos avôs da mãe, Maria Luísa Fernandes, que também
cantavam. Esta conta que, quandoesteve concebida de Artur Nunes, deslocou-se ao
musseque Camama, onde o avô lhe amarrou um pano preto à cintura e revelou que o
futuro filho seria «um grande cantor». Seu pai foi um norte-americano que,ainda
muito novo, emigrara para Angolae falava fluentemente o quimbundo. Em 1970 Mingo
Nunes cantou numa matiné infantil, acompanhado pelo agrupamento África Show.
Recordou que Moreira Filho também já gravou uma música de Artur Nunes, «Mana»,
assim como Puto Português fez com «Zinha». «Aquilo é nosso, vou levar o caso a
tribunal», reiterou.
Percussionista,
Mingo Nunes participa do Carnaval no Ombembwa do Chinguar, Bié, mas, agora, vai
optar pela música moderna urbana. Já tocou igualmente no União Povo do Marçal,
União Povo do Rangel, sendo É pintor de profissão e também marinheiro de 2ª.
A Mãe,
Maria Luísa José Neto Fernandes está doente desde o dia em que Yuri da Cunha
lançou o disco com músicas de Artur Nunes, pois a tensão subiu-lhe. Falando ao
SA, a anciã contou que naquele dia, Yuri da Cunha prometeu-lhe dar «alguma
coisa », que não especificou. «Vou-me embora para Londres, onde está um meu
filho, para me tratar», anunciou. Entretanto, quando regressar ao país, vai
exigir a merecida compensação a Yuri da Cunha.
Mingo
Nunes aproveitou para dar a conhecer a criação da «Arte da Urbe», uma associação
cultural promovida por seu irmão cassula, Fernando Sebastião e que envolve familiares
dos restantes membros de David Zé e Urbano de Castro.
SADIA quer reparar «abuso»
Contactado
por este jornal, o presidente da Sociedade Angolana de Direitos de Autores (SADIA),
Lopito Feijó, afirmou que a posição da SADIA é de convidar os familiares de Artur
Nunes a procurarem a sociedade para legalizá-lo, a título póstumo, como membro da
organização que dirige, para pôr termo a esses abusos. «Yuri da Cunha é useiro
e vezeiro nesse tipo de comportamento», apontou.
"Antigamente música se fazia com músicos, poesia, talento e sonho... Agora basta um micro!"
Catarina Maul
Catarina Maul
quinta-feira, 21 de junho de 2012
Regulamento do Prémio de Literatura Sonangol revelação
Para quem quiser arriscar num concurso que lhe habilite a publicar seu primeiro livro e ainda angariar algum dinheiro...
Clicar para ler aqui
quarta-feira, 20 de junho de 2012
Antologia de Contos Angolanos lançada na feira do livro do Porto
António Quino organizador da antologia que surge do interesse da instituição em promover as letras angolanas a nível internacional |
A União dos Escritores Angolanos (UEA) aproveitou a 82ª Feira do Livro do Porto, que decorreu de 31 de Maio a 17 deste mês, para continuar a divulgar e difundir a literatura angolana a nível internacional, servindo-se de uma antologia do conto de autores nacionais, lançada em Fevereiro último no decurso das “Correntes d’Escrita”, na Póvoa de Varzim (Portugal).
Durante a cerimónia de apresentação, que aconteceu no dia 16 deste mês, animada pelo som do batuque da dupla Roque e André, uma angolana e um português, a representante do Clube do Autor, Cristina Ovídio, agradeceu a confiança depositada pelo secretário-geral da UEA, Carmo Neto.
Na qualidade de editora, Cristina Ovídio disse aos presentes que “o som do batuque convida, com a sua força, magia e encantamento, a leitura dos contos sobre um mundo onde cabe toda Angola”.
“Num mundo às avessas dos afectos, do calor dos braços e das longas horas de conversas à volta das estórias que entretecem a vida, este livro surge como um bálsamo. A Balada dos Homens que Sonham mostra-nos também que a ‘vida não é suficiente’ para quem encontra na literatura um espaço de evasão, a licença para mentir a realidade sentida nestes textos”.
António Quino, organizador da antologia, começou por destacar o papel do embaixador angolano em Portugal, Marcos Barrica, que aceitou o desafio lançado pela UEA para patrocinar o projecto no âmbito da diplomacia cultural.
Sobre a pertinência do livro, António Quino disse que a obra “nasceu do interesse da UEA em promover mais a literatura angolana a nível internacional. Organizámos esta Antologia de Contos Angolanos com o objectivo de condensar, em caderno, textos literários em prosa, iniciando um volume de textos de autores que se tenham revelado ou publicado entre 1980 e 2010 e cujo teor expresse interesse, contexto, realidade, consciência colectiva, escolhas estéticas e temáticas de Angola e dos angolanos. E tanto para a UEA como para nós, organizadores da Antologia, e provavelmente para os catorze contistas que acederam à nossa solicitação, a Antologia será um instrumento valioso para o estudo do conto angolano através dos vinte e três títulos que a compõem”.
No livro, que tem recepção positiva junto do público leitor português, participam catorze contistas: Timóteo Ulika, Eduardo Bettencourt Pinto, Eduardo Bonavena, José Luís Mendonça, António Fonseca, Frederico Ningi, João Tala, Zetho Gonçalves, José Eduardo Agualusa, Carmo Neto, Roderick Nehone, Albino Carlos, Ondjaki e Gociante Patissa.
A versão portuguesa foi lançada pela UEA em Agosto de 2011, sob o título “Conversas de Homens no Conto Angolano”. Está em vista a tradução em hebraico, inglês, alemão, italiano e espanhol. O livro faz parte da aposta da direcção da UEA em dar a conhecer a literatura e escritores angolanos que, como referiu António Quino, “permite a criação de analogias, paradigmas e relativismos importantes aos estudos literários”.
Nessa parte, Isaias Samakuva é como eu, e cito: "Não contraí empréstimos e não tenho dívidas de qualquer espécie para com nínguém."
Agora acrescento: os que me devem (há anos que não pagam), aproximadamente 55 mil kwanzas no total, não têm o mínimo de vergonha, pois ganho com suor digno os meus kumbús hahahahaha
sábado, 16 de junho de 2012
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Foto retirada do Facebook de Reginaldo Silva |
Dizem-se eleitos pelo povo os deputados, conforme o espírito da democracia representativa. Nada a contestar, embora, pessoalmente, não me sinta representado (enquanto cidadão) na arruaça com que o acadêmico, João Pinto, vinha actuando no parlamento. Mas como os humanos são diferentes, ele com certeza agradará a outros gostos.
sexta-feira, 15 de junho de 2012
Há uma onda de apriorismo nos últimos tempos, um pouco por culpa, a meu ver, da ausência de intercâmbio entre gerações, bem como entre editores e novos valores. Então, é comum fazer-se a auto-identidade começando pelo rótulo "poeta" antes do nome próprio. Ou seja, escreve-se mais do que se lê e parte-se de casa com a certeza de sermos muito bons poetas, em clara advocacia em causa própria.
quinta-feira, 14 de junho de 2012
Acho que mereci! Essas crianças….
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Nesse dia levei os netos da velha Emiliana Citumba Gociante ao gelado. |
Minha sobrinha Nair (ao centro) tem seis anos de idade e anda na segunda classe. Entrou para a iniciação aos quatro, um anos antes da idade oficial. Gosto de lhe contar estórias e conversar com ela. Da outra vez falávamos sobre o facto de ela estar já habilitada a ler, aliás desde o último semestre da primeira classe, o que se deve também às explicações caseiras da mãe dela, que é professora:
– Nair já sabe ler, né?! – digo, babado de orgulho.
– Sim tio. – responde-me, calma e aparentemente indiferente.
– A tua turma tem muitas crianças?
– Mais ou menos.
– Sim tio. – responde-me, calma e aparentemente indiferente.
– A tua turma tem muitas crianças?
– Mais ou menos.
– Quantas mais sabem ler?
– Eu só ando a ir estudar, não costumo contar os outros.
Bem feito, acho que mereci! Essas crianças….
Gociante Patissa
quarta-feira, 13 de junho de 2012
terça-feira, 12 de junho de 2012
Crónica: De Mario Quintana, professor convidado em aula magna "sobre poesia, falsidade ideológica"
Do Blog Poesia: Falsidade Ideológica
Carta
Meu caro poeta,
Por um lado foi bom que me tivesses pedido resposta urgente, senão eu jamais escreveria sobre o assunto desta, pois não possuo o dom discursivo e expositivo, vindo daí a dificuldade que sempre tive de escrever em prosa. A prosa não tem margens, nunca se sabe quando, como e onde parar. O poema, não; descreve uma parábola tracada pelo próprio impulso (ritmo); é que nem um grito.
Todo poema é, para mim, uma interjeição ampliada; algo de instintivo, carregado de emoção. Com isso não quero dizer que o poema seja uma descarga emotiva, como o fariam os românticos. Deve, sim, trazer uma carga emocional, uma espécie de radioatividade, cuja duração só o tempo dirá. Por isso há versos de Camões que nos abalam tanto até hoje e há versos de hoje que os pósteros lerão com aquela cara com que lemos os de Filinto Elísio. Aliás, a posteridade é muito comprida: me dá sono. Escrever com o olho na posteridade é tão absurdo como escreveres para os súditos de Ramsés II, ou para o próprio Ramsés, se fores palaciano.
Quanto a escrever para os contemporâneos, está muito bem, mas como é que vais saber quem são os teus contemporâneos? A única contemporaneidade que existe é a da contingência política e social, porque estamos mergulhados nela, mas isto compete melhor aos discursivos e expositivos , aos oradores e catedráticos. Que sobra então para a poesia? - perguntarás. E eu te respondo que sobras tu. Achas pouco? Não me refiro à tua pessoa, refiro-me ao teu eu, que transcende os teus limites pessoais, mergulhando no humano. O Profeta diz a todos: "eu vos trago a verdade", enquanto o poeta, mais humildemente, se limita a dizer a cada um: "eu te trago a minha verdade." E o poeta, quanto mais individual, mais universal, pois cada homem, qualquer que seja o condicionamento do meio e e da época, só vem a compreender e amar o que é essencialmente humano. Embora, eu que o diga, seja tão difícil ser assim autêntico. Às vezes assalta-me o terror de que todos os meus poemas sejam apócritos!
Meu poeta, se estas linhas estão te aborrecendo é porque és poeta mesmo. Modéstia à parte, as disgressões sobre poesia sempre me causaram tédio e perplexidade. A culpa é tua, que me pediste conselho e me colocas na insustentável situação em que me vejo quando essas meninas dos colégios vêm (por inocência ou maldade dos professores) fazer pesquisas com perguntas assim: "O que é poesia? Por que se tornou poeta? Como escrevem os seus poemas?" A poesia é dessas coisas que a gente faz mas não diz.
A poesia é um fato consumado, não se discute; perguntas-me, no entanto, que orientação de trabalho seguir e que poetas deves ler. Eu tinha vontade de ser um grande poeta para te dizer como é que eles fazem. Só te posso dizer o que eu faço. Não sei como vem um poema. Às vezes uma palavra, uma frase ouvida, uma repentina imagem que me ocorre em qualquer parte, nas ocasiões mais insólitas. A esta imagem respondem outras. Por vezes uma rima até ajuda, com o inesperado da sua associação. (Em vez de associações de idéias, associações de imagem; creio ter sido esta a verdadeira conquista da poesia moderna.) Não lhes oponho trancas nem barreiras. Vai tudo para o papel. Guardo o papel, até que um dia o releio, já esquecido de tudo (a falta de memória é uma bênção nestes casos). Vem logo o trabalho de corte, pois noto logo o que estava demais ou o que era falso. Coisas que pareciam tão bonitinhas, mas que eram puro enfeite, coisas que eram puro desenvolvimento lógico (um poema não é um teorema) tudo isso eu deito abaixo, até ficar o essencial, isto é, o poema. Um poema tanto mais belo é quanto mais parecido for com o cavalo. Por não ter nada de mais nem nada de menos é que o cavalo é o mais belo ser da Criação.
Como vês, para isso é preciso uma luta constante. A minha está durando a vida inteira.
segunda-feira, 11 de junho de 2012
Crónica: Os semáforos
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A luz do dia acabava de entregar a primeira manhã ao
grupo de visitantes, com alegre promessa de chuvisco. Começava uma jornada de
sete dias na cidade de Portland, do Estado de Oregon, que dista aproximadamente
três mil quilómetros e meio de Washington, DC.
O clima,
longe embora do tropical, saía-se menos gélido do que o da paragem anterior. De
avião, foram cinco horas ininterruptas, somadas à disparidade de fusos
horários, levando o dia a engordar para vinte e sete horas. Fosse o que fosse,
era preferível ao inverno de Washington, DC. Mas quem disse que era linear o
mito americano?! Talvez faça sentido que, ao contrário do que um dia critiquei,
as leis de um mesmo país variem de estado para estado, como se uns fossem mais
americanos do que outros. Bem, mas justo seria, por exemplo, que Miami, tão quente
e festivo, se guiasse pelas mesmas bitolas de outros lugares mais fleumáticos?
O grupo viria
a seguir para Salt Lake, estado de Utah, e culminar a turné em Miami, Florida. Portland
é de todas a mais inspiradora. Como se já fosse pouco conseguir juntar em Janeiro
um pouco de inverno com outro pouco de verão, tem ainda paisagem montanhosa e
um rio que passa pela cidade, esta, que combina com perfeição o bucólico com o cosmopolita.
É certo que América, até mesmo como país, é vastidão demais para caber numa
crónica.
Dois anos
depois, dou-me a ser transportado pelos semáforos acabados de montar na cidade
de Benguela para as memórias de Portland, suas paisagens, os inevitáveis
choques culturais, enfim, tudo o que de maravilhoso se ganha nesse renascer que
é viajar.
Estava anteontem
a jantar no “Tudo na Brasa”, escolhendo a parte a céu aberto para fotografar
com a mente a vida que caminha pelo calçadão. Lá dentro, a esmagadora maioria
de clientes, portugueses certamente, angustiava-se pela derrota no Euro diante
da Alemanha. Na estrada, alguns automobilistas e motociclistas marimbam-se para
as regras do semáforo. Nenhum regulador de trânsito por perto para o correctivo.
De errar em errar, não faltam peões que se metem a atravessar a estrada quando
o sinal luminoso não lhes é favorável. Parece que custa esperar. Mas quanto
tempo dura a luz até chegar a nossa vez? Depende, que em Portland pode durar o
ano todo.
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Tal fórmula,
que veio obviamente a servir em Salt Lake, só reforçou a minha tese. A segurança
rodoviária é essencialmente uma questão de comunicação. A tecnologia pode lá
estar e ser funcional, mas não passa de complemento; determinante mesmo é o
toque humano.
O semáforo
como metáfora serve para outros sectores da vida. Lembro-me de como, em ameno
debate, uma amiga canadiana dizia que não gostaria de fazer filhos em Angola, por
entender que o nível de moralidade é baixo. Contra-argumentei então, conhecendo
a sua condição económica, que podia matricular os filhos nas mais reputadas
escolas. E ela retorquiu que a escola em si não resolvia, que a linguagem e
outras discrepâncias estavam na interacção com outras crianças.
De facto,
os semáforos, como as escolas, dependem da comunidade e do nível de cidadania
desta.
Gociante Patissa, Benguela, 11 de Junho de 2012
domingo, 10 de junho de 2012
Faleceu por doença ontem, 9 de Junho de 2012, o rasta Orlando Lukongolo Soares. Funeral está marcado para as 10h30 de hoje
Venho tendo ligação com Orlando Lukongolo Soares desde o ano 2000, enquanto activista cívico pelo Círculo Rastafari de Benguela (CRB), juntamente com os brothers Kafundanga (já falecido), o Praga e o Dickyamini Bocolo, entre outros. Tal como eles, integrei (pela AJS-Associação Juvenil para a Solidariedade) a Rede Municipal da Criança de Rua do Lobito e a Coligação "Ensino Gratuito, Já", em advocacia e acção social.
Pêsames à família, colega e amigos.
sábado, 9 de junho de 2012
Ontem aceitei o convite de ir almoçar à casa de Martinho Bangula, no que posso chamar de primeiro almoço de suas mãos depois de ele se ter licenciado em Sociologia. Entre internet e TV, vimos CSI e quejandos, mas me chamou mais atenção o filme "Venus Negra". A história é "pesada", geralmente não vejo até ao fim, mas resisti, talvez por se tratar de filme biográfico. «A triste e real história da sul-africana Saartjie Barman, símbolo da segregação racial, é protagonizada por Yahima, que estreia como atriz com um papel forte e difícil, ao qual oferece sem reservas seu corpo nu. "Mesmo o filme exigindo cenas de nudez, aceitei porque denunciava o racismo que ainda existe no mundo", admitiu em conversa com a AFP a jovem cubana, de 30 anos, que chegou a engordar 13 quilos para o papel».
http://www.c7nema.net/index.php?option=com_content&view=article&id=6337:a-proposito-de-la-venus-negrar-bem-vindos-ao-freak-show-por-paulo-portugal-com-entrevista-a-abdellatif-kechiche-&catid=1:cinema-internacional&Itemid=8
http://www.proceso.com.mx/?p=288619