Qual é o lugar da palavra, que é o rosto do sonho? Que “as acções valem mais que as palavras”, lá está um ditado que se afigura bastante pragmático na nossa “vida real”. Do jeito: matar a cobra e mostrar o pau. O que se quer hoje (em qualquer parte do planeta) é julgar obras, pensamentos, enfim, a vida, de uma perspectiva de resultados. Ou não seria a nossa era comandada pelos ventos da industrialização e da ciência.
Entretanto, “encaixados” neste paradigma, esquecemo-nos por vezes que as tais “grandes” acções, “brilhantes” pessoas, ou seja, as realizações de modo geral, nascem de sonhos, que mais não são do que a expressão da palavra, livre, viva e ilimitada. E aqui, convenhamos, haveríamos que dizer que mais forte do que as acções só mesmo a palavra (com o poder de vir a ser).
Frequentávamos a iniciação ou a primeira classe ainda no Monte-Belo/Bocoio e ouvíamos com agrado nossa mãe, Emiliana Tchitumba Gociante, dizer: “se você estudar, o governo vai te dar carro”. Podíamos não ter ideia clara de “governo” nem da distância/futuro, mas ter carro era um sonho doce…! Que belas memórias!
Medo da utopia? Que mal tem ela? Como dizia um académico durante um dos debates radiofónicos que realizo, “a utopia é que dá sentido à vida do homem”. Mesmo que custe “aceitar”, despidos da utopia não passaríamos de “máquinas” com os passos, o tempos e as manobras dentro de uma “caixa” rigorosamente esquematizada. A esperança, a mesma que nos faz levantar e sacudir a poeira em cada queda que levamos, é prima-irmã da utopia.
Na década de 90 em que soavam bem alto as armas e o fumo da pólvora espalhava lágrimas por esta Angola, “evadir-se” para o estrangeiro era o sonho de muito boa gente. Como se já não bastasse a guerra, humilhavam muito mais as rusgas e as consequentes corridas fugindo do recolher obrigatório para o cumprimento do serviço militar obrigatório (para aqueles cuja consciência rejeitava entregar-se voluntariamente - e ainda bem que já terminou e o pensamento é reconstruir e desenvolver nosso amado país).
Todo o mundo desejava abandonar Angola o mais rápido possível. Mas o problema começava mesmo pela falta dos “famosos” USD mil e 200 de passagem. “Nós” ambicionávamos ir para além de Portugal, pelo que nos dedicamos ao aprendizado da língua inglesa, recorrendo a gramáticas velhas em qualquer parte (às vezes até recuperando folhas usadas como canudo para venda de ginguba nas praças). É que nem dinheiro para frequentar um curso na “Ciliestre” tínhamos. Não chegamos a sair do país para formação, como tal, mas ganhamos imenso aperfeiçoando “mais uma” língua estrangeira, para além de engrossar a cultura geral (como diz o professor de francês da Universidade Pública, Nzau Suka, “cada língua veicula uma cultura”).
Em 1999, quando frequentávamos o médio ainda, decidimos entre amigos fundar uma Organização humanitária, tendo como principal “combustível”, a capacidade de intervir face aos os imensos problemas sociais. Experiência? Zero! Dinheiro? Quase-nada! Idade? Menos de 22! Depois de mobilizados mais de oito membros e feita a formalização junto do Notário, revelavam-se dois grandes problemas: falta de espaço para reuniões e a recusa de alguns membros em servir algo para fins não lucrativos, numa altura em que ONG era sinónimo de “bwé de Dólares”! “Queríamos agradecer a vossa comparência. Hoje, mesmo depois de pedir a sala, parece que o guarda não trouxe as chaves. Mas isso vai acabar, estamos a lutar para termos já a nossa própria sede/escritório”, era frequente dizermos enquanto líderes da "coisa" (na verdade, a única certeza que tínhamos era a nossa palavra). Contudo, umas ideias somadas a parcerias viriam “oferecer” um escritório alugado em 2001.
Fora disso, a mais “trágica” das palavras foi quando em 2000 tive um “fim-de-contrato” da Sonamet, numa altura em que muito precisava trabalhar, ao ponto de ter desistido de estudar (a proliferação de fotógrafos ambulantes havia feito baixar o meu rendimento enquanto fotógrafo e tive de encostar a milagrosa “cannon” AF-8 do meu irmão Amos Patissa). “Se até aos 35 anos a minha vida não mudar, eu me mato”, desabafava com pessoas mais próximas. Não me lembro de ter visto um rosto indiferente toda vez que o dissesse. Naturalmente, com o trabalho, humildade e empreendedorismo, a página está consideravelmente virada…!
Os meus exemplos não serão os maiores do mundo (logicamente!), mas são os que melhor domino e posso partilhar por enquanto. Não há nada mais forte do que a palavra. Ou, já para meio-termo, a sugestão é de Marcel Proust: “se sonhar um pouco é perigoso, a solução não é sonhar menos e sim sonhar mais”.
Fica mais um abraço do vosso
Gociante Patissa
Entretanto, “encaixados” neste paradigma, esquecemo-nos por vezes que as tais “grandes” acções, “brilhantes” pessoas, ou seja, as realizações de modo geral, nascem de sonhos, que mais não são do que a expressão da palavra, livre, viva e ilimitada. E aqui, convenhamos, haveríamos que dizer que mais forte do que as acções só mesmo a palavra (com o poder de vir a ser).
Frequentávamos a iniciação ou a primeira classe ainda no Monte-Belo/Bocoio e ouvíamos com agrado nossa mãe, Emiliana Tchitumba Gociante, dizer: “se você estudar, o governo vai te dar carro”. Podíamos não ter ideia clara de “governo” nem da distância/futuro, mas ter carro era um sonho doce…! Que belas memórias!
Medo da utopia? Que mal tem ela? Como dizia um académico durante um dos debates radiofónicos que realizo, “a utopia é que dá sentido à vida do homem”. Mesmo que custe “aceitar”, despidos da utopia não passaríamos de “máquinas” com os passos, o tempos e as manobras dentro de uma “caixa” rigorosamente esquematizada. A esperança, a mesma que nos faz levantar e sacudir a poeira em cada queda que levamos, é prima-irmã da utopia.
Na década de 90 em que soavam bem alto as armas e o fumo da pólvora espalhava lágrimas por esta Angola, “evadir-se” para o estrangeiro era o sonho de muito boa gente. Como se já não bastasse a guerra, humilhavam muito mais as rusgas e as consequentes corridas fugindo do recolher obrigatório para o cumprimento do serviço militar obrigatório (para aqueles cuja consciência rejeitava entregar-se voluntariamente - e ainda bem que já terminou e o pensamento é reconstruir e desenvolver nosso amado país).
Todo o mundo desejava abandonar Angola o mais rápido possível. Mas o problema começava mesmo pela falta dos “famosos” USD mil e 200 de passagem. “Nós” ambicionávamos ir para além de Portugal, pelo que nos dedicamos ao aprendizado da língua inglesa, recorrendo a gramáticas velhas em qualquer parte (às vezes até recuperando folhas usadas como canudo para venda de ginguba nas praças). É que nem dinheiro para frequentar um curso na “Ciliestre” tínhamos. Não chegamos a sair do país para formação, como tal, mas ganhamos imenso aperfeiçoando “mais uma” língua estrangeira, para além de engrossar a cultura geral (como diz o professor de francês da Universidade Pública, Nzau Suka, “cada língua veicula uma cultura”).
Em 1999, quando frequentávamos o médio ainda, decidimos entre amigos fundar uma Organização humanitária, tendo como principal “combustível”, a capacidade de intervir face aos os imensos problemas sociais. Experiência? Zero! Dinheiro? Quase-nada! Idade? Menos de 22! Depois de mobilizados mais de oito membros e feita a formalização junto do Notário, revelavam-se dois grandes problemas: falta de espaço para reuniões e a recusa de alguns membros em servir algo para fins não lucrativos, numa altura em que ONG era sinónimo de “bwé de Dólares”! “Queríamos agradecer a vossa comparência. Hoje, mesmo depois de pedir a sala, parece que o guarda não trouxe as chaves. Mas isso vai acabar, estamos a lutar para termos já a nossa própria sede/escritório”, era frequente dizermos enquanto líderes da "coisa" (na verdade, a única certeza que tínhamos era a nossa palavra). Contudo, umas ideias somadas a parcerias viriam “oferecer” um escritório alugado em 2001.
Fora disso, a mais “trágica” das palavras foi quando em 2000 tive um “fim-de-contrato” da Sonamet, numa altura em que muito precisava trabalhar, ao ponto de ter desistido de estudar (a proliferação de fotógrafos ambulantes havia feito baixar o meu rendimento enquanto fotógrafo e tive de encostar a milagrosa “cannon” AF-8 do meu irmão Amos Patissa). “Se até aos 35 anos a minha vida não mudar, eu me mato”, desabafava com pessoas mais próximas. Não me lembro de ter visto um rosto indiferente toda vez que o dissesse. Naturalmente, com o trabalho, humildade e empreendedorismo, a página está consideravelmente virada…!
Os meus exemplos não serão os maiores do mundo (logicamente!), mas são os que melhor domino e posso partilhar por enquanto. Não há nada mais forte do que a palavra. Ou, já para meio-termo, a sugestão é de Marcel Proust: “se sonhar um pouco é perigoso, a solução não é sonhar menos e sim sonhar mais”.
Fica mais um abraço do vosso
Gociante Patissa
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