Sua
excelência eu acaba de dar uma olhada ao programa do inovador primeiro simpósio
nacional sobre a mulher zungueira, realizado em Luanda ontem, 14 de Maio,
conforme reza o documento. Tudo muito a preceito, doutores e jornalistas e
ministros, e tal e tal, é capim. Uns palestrantes, outros moderadores. Até já
estou a ver gente a sair da sala engripada, tal é a confluência de perfumes e
aromas e ambientadores de orçamento rebuscado. Porque não é para gente com fragrância assim da cantina do mamadou ou do asiático, não.
Até você
se pergunta mesmo se um terço dos oradores alguma vez mercou algo na zunga,
onde não há garantias de chamar o Inadec por qualquer motivo. Mas pronto, iria faltar
um big brother para fazer fé à coisa. Se calhar, é melhor só não avaliarmos por
excesso ninguém, não é? E cá está a verdadeira maka do exercício cá das
conjecturas, não havendo até ao momento alguma linha na imprensa sobre o êxito
ou não do certamente, que nos valha como ponto de partida. Ora pois, não
podendo nós partir para a futurologia, uma vez que o evento já aconteceu, e não
tendo sido inventado ainda o critério da passadologia, estamos de mãos atadas. Seja
como for, o programa nos põe à vontade para reivindicar a ausência dos actores.
Pelo menos parte relevante deles.
Primeiro,
lê-se que a intervenção daquela que seria o motivo está acondicionada no
genérico "Voz da Zungueira - Testemunhos. Preocupações", dando assim
uma ideia de papel passivo. Alguma vez um doutor levou bofetada do fiscal,
andou com criança febril às costas ao sol e chuva, ou sabe a dor muscular de
desfilar com uma ventoinha a tiracolo e não aparecer cliente? Ah, era preciso
estudo? Não seja por isso, excelências. Mas então e a escola da vida?!
Ainda há
dias circulou nas redes sociais um vídeo muito revelador de uma compatriota que
quase parava o bairro, sem precisar de microfone nem de orçamento para o
coffee-break nem ar condicionado, como seria de esperar numa palestra macro (teve
de ir a imprensa atrás da senhora para se aproveitar da audiência). Parar um
bairro por conta de um pregão é proeza que nem os best sellers conseguem sem a
máquina da propaganda e marketing.
A senhora
chegava, poisava a bacia de peixe fresco e puxava dos pulmões o seu pregão
prolixo, mas de uma cadência melódica a dar para a missa: homem kunanga é
corno! Essa não merecia o palanque para uma prelecção também, ainda que de 15
minutos? Não há sabedoria popular a ser passada para a classe académica? Olhe,
que a coisa não termina por aí.
Em segundo
lugar, o reverso da moeda. É que tratar do assunto zungueira sem incluir o seu
"carrasco" de estimação, os fiscais das administrações municipais, que
ocupam maior espaço nos pensamentos e sonhos das zungueiras do que os maridos e
amantes destas, por todos os motivos óbvios, é como assistir a uma partida de
futebol que termina nos primeiros 45 minutos, pelo que teríamos um simpósio
mais ou menos inclusivo.
Porque até
como forma de homenagear o saudável lado fundista do ofício, não seria demais
sondar a "Voz do Fiscal - Testemunhos. Preocupações", ou do libanês ou
do maliano, ou do marido que espera a esposa em casa para lhe patrocinar do
vício do copo e à madrugada calibrar o ventre dela com mais um filho para vir a
ser sustentado unilateralmente pelos rendimentos da zunga. Afinal, estamos na
era da participação de todos os actores, ou não é isso?
Aos
organizadores, fica o nosso encorajamento, afinal o assunto é transversal e
querendo ou não, como diria alguém, cada um de nós tem um zungueiro ou uma
zungueira na família. Há que estender a reflexão para fora de Luanda, pelo que
qualquer pedrada à vossa árvore, já sabem, é derivada dos frutos que carrega. Ainda
era só isso. Obrigado.
Gociante Patissa, Benguela, 15 Maio 2017
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