Em 2005, ao serviço da inglesa Save The
Children, recrutamento no meu caso feito pela urbanista australiana Susan Dow,
passei um mês em recônditas localidades do município da Cikala Colohanga,
província do Huambo, recolhendo dados qualitativos na metodologia de grupos
focais sobre "Crianças Órfãs e Vulneráveis", pesquisa apadrinhada
pelo Ministério da Reinserção Social. Foi enquanto consultor e assessor de
líder de pesquisa o primeiro
contrato mais alto, USD 1.600,00. As quatro semanas foram repartidas, sendo
duas de observação participante no interior (Sambo e Mbave) e as duas restantes
para o processamento de dados na capital. O mês era Outubro e chovia bastante,
agravado com as vias inacessíveis para viaturas e não havia cobertura
telefónica. Maior ainda era o medo de accionar uma mina terrestre, uma vez em
troços sem asfalto e com águas residuais. Enquanto isso, as regras eram mais do
que rígidas: não desviar do caminho, não seguir viagem depois das 17 horas.
Do ponto onde a viatura nos
deixava (na comuna do Sambo, destaco esta por ter sido a que piores condições oferecia) até à Ombala de Tchiaia, caminhávamos cerca de 8 Km, trajecto que devia ser feito duas vezes por semana a pé no sentido de se ir ter contacto com a viatura para "radio check" em ponto de situação com a base. Como se pode imaginar, tais caminhadas podem ser fáceis de mãos a abanar, mas com utensílios e víveres é um calvário. À nossa chegada, os populares receberam-nos no desvio, alegres, com bicicletas e carroças puxadas por bois. Da nossa parte era um desconforto, tendo em conta a logística mais ou menos farta e de luxo, que incluía refrigerantes, latas de leite, e mais produtos de loja, quando na verdade o grupo alvo pouco menos tinha do que uma refeição ao dia, crianças sobreviviam produzindo carvão (eram refugiados provenientes da Zâmbia e "recém-desmamados" em assistência pelo Programa Alimentar Mundial, da ONU). De condições de sanidade, abaixo de zero era pouco. Já 11 anos passaram e não tenho problemas em partilhar um pequeno incidente que enfrentamos. Acontece que na interacção com as senhoras e suas agruras sociais, uma das integrantes do grupo entendeu (às escondidas) fazer mobilização política em prol do projecto de governo do seu partido, que dizia ter as soluções para os excluídos. Aquele acto isolado e próprio do oportunismo do bicho político viria a custar-nos caro no dia de regresso, pois as senhoras foram levar o conteúdo do assédio às autoridades tradicionais. Ouviram-se pequenos cochichos de repulsa, mas julgávamos que se ficaria por ali. Por fim, tivemos de carregar os nossos haveres, sem mais apoio no transporte com carroças. Como nota final, revelo que esta experiência inspirou o conto OS DENTES DO SOBA, do livro A ÚLTIMA OUVINTE.
Do ponto onde a viatura nos
deixava (na comuna do Sambo, destaco esta por ter sido a que piores condições oferecia) até à Ombala de Tchiaia, caminhávamos cerca de 8 Km, trajecto que devia ser feito duas vezes por semana a pé no sentido de se ir ter contacto com a viatura para "radio check" em ponto de situação com a base. Como se pode imaginar, tais caminhadas podem ser fáceis de mãos a abanar, mas com utensílios e víveres é um calvário. À nossa chegada, os populares receberam-nos no desvio, alegres, com bicicletas e carroças puxadas por bois. Da nossa parte era um desconforto, tendo em conta a logística mais ou menos farta e de luxo, que incluía refrigerantes, latas de leite, e mais produtos de loja, quando na verdade o grupo alvo pouco menos tinha do que uma refeição ao dia, crianças sobreviviam produzindo carvão (eram refugiados provenientes da Zâmbia e "recém-desmamados" em assistência pelo Programa Alimentar Mundial, da ONU). De condições de sanidade, abaixo de zero era pouco. Já 11 anos passaram e não tenho problemas em partilhar um pequeno incidente que enfrentamos. Acontece que na interacção com as senhoras e suas agruras sociais, uma das integrantes do grupo entendeu (às escondidas) fazer mobilização política em prol do projecto de governo do seu partido, que dizia ter as soluções para os excluídos. Aquele acto isolado e próprio do oportunismo do bicho político viria a custar-nos caro no dia de regresso, pois as senhoras foram levar o conteúdo do assédio às autoridades tradicionais. Ouviram-se pequenos cochichos de repulsa, mas julgávamos que se ficaria por ali. Por fim, tivemos de carregar os nossos haveres, sem mais apoio no transporte com carroças. Como nota final, revelo que esta experiência inspirou o conto OS DENTES DO SOBA, do livro A ÚLTIMA OUVINTE.
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