segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Língua suja mancha crescimento do teatro

Tem-se observado com inusitada frequência o uso de palavrões em doses exageradas por parte de diversos grupos teatrais que desfilam pelos principais palcos da província de Benguela. A situação não deve fugir muito daquilo que acontece nas restantes partes desta imensa Angola, na medida em que não é apenas prática de grupos emergentes. O flagrante mais recente deu-se com a exibição da peça “Galinha do mato” pela Companhia de teatro Oásis, ligada à Força Aérea Nacional e radicada na capital do país.

Não é preciso ser perito para perceber que no afã de arrancar gargalhadas da plateia, os actores parecem aproveitar-se da tendência do público vibrar mais quando propositadamente se erra na pronúncia das palavras, se usa palavrões ou se abusa no uso de gestos obscenos.

Cai-se então no imediatismo oportunista, comprometendo-se desta forma toda uma necessidade de inculcar em próximas gerações a cultura do teatro. E é aí onde seguramente se está a pecar. Que impressão é que queremos semear? De que o teatro feito em Angola é “palhaçada”, tal como o considerou em Portugal o actor Orlando Sérgio, o “Moisés”, do “Conversas no Quintal?”

Será que não se leva em conta que os apelos dos artistas por via da imprensa fazem alguns encarregados levar filhos a cultivarem o gosto por teatro? Colocou-se a questão no final da peça ao actor do Oásis e assistente de encenação, Adão de oliveira “Rolf”. O teatro é o contraste da vida e tal como ele é, – defendeu – nós nos preocupamos muito seriamente com as técnicas que ele exige; não estamos muito preocupados com os palavrões, porque, até certo ponto, esses palavrões fazem parte do dia a dia. E eles só surgem para enriquecer, até certo ponto, uma determinada cena”.

Não seria arte obviamente se ocultasse os disparates ditos no dia a dia. Mas usá-los para “enriquecer”!? E o nosso entrevistado contradiz-se, quando de seguida afirma que “os palavrões não fazem parte da cena”, mas que estes dependem da “liberdade artística” do actor, embalado na emoção do personagem. “Mas nós também estamos preocupados com isso. Por exemplo na peça de amanhã não poderá haver palavrões”, dizia.

Também questionado pelo AV-O enquanto promotor do espectáculo e falando como professor, António Pedro “Ratinho” advogou que o uso de palavrões não é bem próprio das artes cénicas, não sendo também algo de ruim. E argumenta: “Nós somos artistas e a nossa é uma arte viva. O teatro é uma ilusão de naturalidade, de acordo com a época e a personagem a representar. E uma vez que é o teatro como se fosse um flash do dia a dia, nem sempre estamos em condições de ocultar os factos.

Até se poderia levantar como argumento o facto de acontecer de noite, conquanto em condições normais já as crianças estariam a dormir. Mas seria ainda assim um falso argumento.

Afinal, o crescimento do teatro angolano é um processo que hoje lança as bases, com o crescente surgimento de grupos e palcos. Enquanto coisa “nova” é ainda maior a responsabilidade educativa do artista, na medida em que não há limites de idade para massa assistente. (Fonte: Boletim "A Voz do lho, Julho/2007)

Share:

0 Deixe o seu comentário:

A Voz do Olho Podcast

[áudio]: Académicos Gociante Patissa e Lubuatu discutem Literatura Oral na Rádio Cultura Angola 2022

TV-ANGODEBATES (novidades 2022)

Puxa Palavra com João Carrascoza e Gociante Patissa (escritores) Brasil e Angola

MAAN - Textualidades com o escritor angolano Gociante Patissa

Gociante Patissa improvisando "Tchiungue", de Joaquim Viola, clássico da língua umbundu

Escritor angolano GOCIANTE PATISSA entrevistado em língua UMBUNDU na TV estatal 2019

Escritor angolano Gociante Patissa sobre AUTARQUIAS em língua Umbundu, TPA 2019

Escritor angolano Gociante Patissa sobre O VALOR DO PROVÉRBIO em língua Umbundu, TPA 2019

Lançamento Luanda O HOMEM QUE PLANTAVA AVES, livro contos Gociante Patissa, Embaixada Portugal2019

Voz da América: Angola do oportunismo’’ e riqueza do campo retratadas em livro de contos

Lançamento em Benguela livro O HOMEM QUE PLANTAVA AVES de Gociante Patissa TPA 2018

Vídeo | escritor Gociante Patissa na 2ª FLIPELÓ 2018, Brasil. Entrevista pelo poeta Salgado Maranhão

Vídeo | Sexto Sentido TV Zimbo com o escritor Gociante Patissa, 2015

Vídeo | Gociante Patissa fala Umbundu no final da entrevista à TV Zimbo programa Fair Play 2014

Vídeo | Entrevista no programa Hora Quente, TPA2, com o escritor Gociante Patissa

Vídeo | Lançamento do livro A ÚLTIMA OUVINTE,2010

Vídeo | Gociante Patissa entrevistado pela TPA sobre Consulado do Vazio, 2009

Publicações arquivadas