Quando em 1996 descobri minhas inclinações para a escrita e a comunicação social, não tendo conquistado simpatias na segunda porque possuía apenas uma camisola, duas calças e sapatos emprestados pelo António, passei a carregar uma certeza: ainda não sou a pessoa que nasci para ser, nem estou no lugar que nasci para estar.
Doze pessoas tomaram posse, ontem (21/11), como novos membros da União dos Escritores Angolanos, eu sou uma dessas pessoas. Não tive tempo ainda de plastificar o cartão de membro, também ainda vibro de satisfação pelo efeito encorajador que representa para mim (não fui credenciado a falar pelos outros) pertencer à nobre colectividade de escritores do país.
«O que para uma pessoa “normal” seria mentira, para um(a) escritor(a) é imaginação», disse certa escritora ocidental à revista “Granta” em resposta à pergunta «de onde vem a imaginação?»
Decidi, tinha eu 17 anos e meses, participar das gravações de programa infantil televisivo na cidade de Benguela, o que me custava três horas em ida e volta de Comboio (Caminhos de Ferro de Benguela), já que morava no bairro da Santa-Cruz, Lobito.
Lá, olhei a plateia, linda, obviamente os mais bonitinhos sentados na fila da frente, e havia figurantes que mais se pareciam comigo. O programa era gravado no recinto do Museu de Arqueologia, à Praia Morena. Uns cantavam, outros dançavam, alguns contavam anedotas, cada caprichando para merecer filmagem. Regressei à casa e escrevei um poema intitulado “O Nosso Comboio”, que teve os elogios dos apresentadores e lançou a “minha marca”. Nunca mais parei.
Tudo o que consegui ser e construir devo a duas instituições: uma, a Associação Juvenil para a Solidariedade (AJS), ONG que fundamos quando frequentávamos ainda o ensino médio de ciências sociais. A AJS é, como nós, uma força pequena com vontade de contribuir para o crescimento da consciência do exercício da cidadania através de exercícios permanentes de educação e comunicação. A outra instituição, que vem antes de tudo, chama-se Emiliana Chitumba Gociante, minha mãe. «Por muito que o galo cante, não pode é esquecer que veio do ovo» (provérbio bakongo).
Benguela passou por um longo período sem publicação de obra de jovem residente, jejum que foi quebrado, em 2008, com o lançamento do meu livro de estreia (poesia) “Consulado do Vazio”. Seguiu-se o livro de Martinho Bangula. E porque merecemos, somos quase sempre “convocados” para assistir a lançamentos. E num desses lançamentos, peguei no livro do confrade, que ardia de emoção pela realização do sonho, e vi que o outro era escritor mais ou menos… escritor, fica já assim… porque escritor é quem tem um livro, não é isso?! O que se passa é que a juventude tem pressa de publicar, e não custa juntar um textos (sem rigor nem observação editorial) e levar à gráfica mais próxima, e pronto!, uma foto do autor na capa…
Mas terei legitimidade para criticar? Em 2003, levei para meu estágio à Rádio Morena Comercial uma rubrica de enigmas, em que os ouvintes podiam telefonar e sugerir o final mais aconselhável. Aí surgiu a ideia (peregrina) de adaptar os enigmas e compor um (suposto) romance com 100 páginas e tal. Submeti logo a uma das maiores editoras privadas de Luanda. Alguns meses depois, ligo e o editor me responde com o devido profissionalismo: «epa!, eu aposto em obras que me garantam retorno, e aquela em princípio não», ao que ingenuamente pergunto: «mas, assim em jeito de conselho, onde é que falhei?» E outra vez profissionalmente, o editor me responde: «eu não sou pago para ensinar a escrever». Mas, então, a juventude vai aprender como, aonde, se não há escolas de capacitação de potenciais escritores?
Eu faço parte da geração de teimosos (autodidactas). Assim é que, cinco anos após fiasco da primeira tentativa de prosa, consegui convencer a mesa de leitura da União dos Escritores Angolanos, e será publicado brevemente um livro de contos meu.
Voltando à emoção da tomada de posse como novo membro da União dos escritores angolanos, devo dizer que mudou-se algo no meu eu profundo: finalmente, já sou quem nasci para ser, falta é estar no lugar que nasci para estar.
(…)
Aquela luz
para lá do mar
útero da mesma aragem
que outras velas vai apagar
ainda há-de ser minha
antes que caia do céu a manhã e o fim do cenário
ou façam-me tudo então
menos perdoar
para lá do mar
útero da mesma aragem
que outras velas vai apagar
ainda há-de ser minha
antes que caia do céu a manhã e o fim do cenário
ou façam-me tudo então
menos perdoar
Gociante Patissa
Luanda, 22 de Novembro 2009
(Foto 1-recebendo o cartão de membro das mãos do secretário-geral, Adriano Botelho; 2-mandando umas bocas; 3-Frederico Ningi e eu)
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Há caminho para percorrer.
Quanto ao caminhante, já sabemos que está pronto e cheio de força para o percorrer.
Parabéns.
Meu Amigo Gociante Patissa!
Muitos Parabéns!
Estou tão orgulhosa de ti!
Fiquei emocionada..., porque finalmente alguém te reconhece o valor que te deviam há muito tempo!
E que lindo...Dona Emiliana Chitumba Gociante..., os meus parabéns pelo filho que tem!
Tenho um pedido a fazer-te..., sabes dizer-me se há cá em Portugal alguma livraria que tenha os teus livros à venda ( na cidade do Porto)?
Mais uma vez parabéns!
Um beijo enorme!
P.S. e podias publicar o poema "o nosso comboio"!
Oi, amiga AC, na verdade acho que o livro não chegou a Portugal. Mesmo cá fez-se um número limitado de lançamentos, que não garante grande divulgação.Estou esperançado na força da divulgação do livro que sairá pela União dos Escritores. Mas se ainda usas, podes dar-me tua caixa postal por e-mail e mando-te por correio.
Abraços
PS: Tentei reconstituir o poema, mas já não me lembro da sua sequência. Recordo algumas palavras, mas lamentavelmente perdi o caderno.
Oi, Agridoce
Obrigado pelo encorajamento e pela luz.
Até ja!
Parabéns amigoa!
É sem dúvidas uma conquita sua e ganho de todos os jovens escritores
de Benguela, e que qui sá de todos
os que estão "nas provincias".
Valeu!
Martinho Bangula
nao quero repetir o que foi dito pelos demais. viva para sempre o caminho e longo.
asg
Parabens Patissa. O ser membro da UEA pode dar um "empurrao", pois o talento 'e NATO. Sucessos
Parabéns Patissa!!!!
Tenho certeza que acabou de dar o primeiro passo em cima do trampolim que o arremessará ao sucesso!
Beijos
Dulce
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