terça-feira, 31 de julho de 2012


Meu pai tinha comprado uma motorizada de um amigo seu. Devia chamar-se Mbweyo. Da Bela-Vista, um daqueles bairros mais visuais do Lobito. Os pais por vezes compram bens como amigos, não com olhos de clientes. Em casa, o vehículo não teve recepção feliz. Podre, velha e outros adjectivos. Eu cá acho que a mota até era generosa para as crianças. Muito. No quintal, calhava ser atingida com a nossa bola de saco, e a mota deixava cair uma peça. Assim, a brincadeira que era só nossa, passava a ser dela também.
Gociante Patissa (conto em construção)
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segunda-feira, 30 de julho de 2012

Se aprenderem com políticos em campanha eleitoral, não sei como os maridos farão para mostrar à sociedade que completam orgasmos às suas esposas.
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Uns fazem (outros cantam o) amor (outros, menos loucos, reinventam confusões). Apenas uma questão de aproveitar o tempo.
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Um conto da oratura de Cabinda: "Cabeça de pungo destrói casamento"


Por Seke Ia Bindo (texto e ilustração do Jornal de Angola)

Era uma vez uma menina muito bela e delicada, que os pais tratavam como uma princesa. A mãe queria ensinar-lhe a cuidar da casa mas ela só gostava de brincar e quando saía da escola, ia para as praias de Lândana contemplar as ondas do mar e imaginar castelos e príncipes encantados, para além do horizonte. O mar era a casa grande de Nyongo, o pasto dos seus olhos sonhadores.

O pai era pescador e trazia todos os dias para casa o melhor peixe que apanhava no alto mar. Umas vezes trazia corvinas, outras vezes pungos e garoupas de águas profundas. Como gostava muito de zifu zi yangu, a mãe arranjou uma pequena grelha onde preparava as refeições da família. A grelha era tão pequena que ela tinha que cortar a cabeça do peixe, quando ia assá-lo no carvão de fogo brando. Nyongo detestava aquele trabalho e quando via a mãe cortar a cabeça do peixe, ia para a rua e só regressava quando sentia o cheiro do peixe grelhado.

Um dia apareceu um rico homem, pedindo a mão de Nyongo em casamento. Os pais ficaram muito felizes, porque a sua princesa ia ter uma casa grande, boa vida e havia de ser respeitada por ser esposa de um homem poderoso. A mãe aconselhou Nyongo a aceitar o pretendente mas ela pôs uma condição:
- O meu marido tem que arranjar quem cozinhe. As minhas mãos não servem para lidar com o fogo e os meus olhos não podem ser toldados pelo fumo. Eles só gostam de se espraiar no mar.

Os pais disseram ao pretendente qual era a condição da menina e ele aceitou.
O novo lar de Nyongo era mesmo grande e rico. Ela deixou de ser a filha do pescador de Lândana e passou a ser uma verdadeira princesa. Uma mulher foi contratada para cozinhar, mas ela lembrou-se do que a mãe fazia ao peixe, antes de colocá-lo na minúscula grelha da família. Tudo naquela casa era grande, até a grelha, onde cabiam vários peixes inteiros ao mesmo tempo. Mas Nyongo toda a vida viu a mãe cortar a cabeça dos peixes e disse à cozinheira:
- Antes de assares o pungo tens que lhe cortar a cabeça! 

E a cozinheira obedecia, embora ficasse admirada. Não conseguia compreender porque razão a patroa mandava cortar as cabeças dos peixes, quando o patrão gostava tanto deles assados com fubia.  Um dia o marido disse à esposa:
- Quando grelharem o peixe, não lhe cortem a cabeça, porque essa é a melhor parte e o que eu mais gosto é de chupar as espinhas.
- A minha mãe corta sempre a cabeça do peixe e eu aqui vou fazer o mesmo. Não devemos  mudar os hábitos, só porque gostas de chupar as cabeças dos peixes.

Nesse dia houve a primeira discussão entre o casal. Mas Nyongo não cedeu e exigiu à cozinheira que cortasse a cabeça do pungo, como fazia a sua mãe. Se na sua casa era assim, no lar que constituiu tinha que ser igual.

O rico homem ficou muito zangado e, um dia, farto de ver desperdiçar a parte de que mais gostava no peixe, levou Nyongo de volta para casa dos pais. Quando a mãe lhe perguntou por que razão cortava as cabeças dos peixes, ela respondeu:
- Porque toda a minha vida de solteira te vi cortar a cabeça do peixe, quando cozinhavas para a nossa família. Não posso afastar-me do que vi em minha casa, só porque o meu marido é caprichoso. A mãe ficou pensativa e depois disse à filha:
- Cabeça de pungo é muito bom! Mas eu tinha que cortá-la porque somos pobres e a nossa grelha é tão pequena que não cabe lá um peixe inteiro.

Moral da estória: não devemos imitar os outros, cada qual tem a sua agilidade: bika landa bunka salila buna zabili. 
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domingo, 29 de julho de 2012

Achado na Feira do livro em Benguela: “Pequeno Dicionário Antroponímico Umbundu” (Francisco Xavier Yambo, 2003, Editorial Nzila, Luanda)


Em 116 páginas, o livro de bolso "não pretende ser um ensaio filosófico sobre a filosofia Bantu, mas sim uma pista, uma referência para os cultores da língua Umbundu; e é sobretudo uma demonstração para aqueles que recorrem à adopção de nomes estranhos sem qualquer contexto histórico nem cultural do protagonista", lê-se na introdução.

Da pág. 7 à pág. 30, Yambo discorre sobre pressupostos sobre os quais assenta o nome tradicional entre os Bantu, quase sempre proverbial como se sabe. 


Já da pág. 31 em dianteo autor entra propriamente para a descrição dos nomes, uns grafados de acordo com a ortografia convencional Bantu aprovada pelo CICIBA (Centro de Investigação das Civilizações Bantu), outros apresentados também com a corruptela resultante da conhecida por “grafia Católica”, aquela instituída pelo regime colonial português – esta última é a que predomina nas instituições de registo civil e outras oficiais, sem que no entanto a pronúncia “aportuguesada” (porque determinados sons não encontram correspondente em português) tenha relevância alguma no meio de origem.

Mas como obviamente não podem caber aqui todos, vamos dar uma amostra apenas, começando com o primeiro nome da lista:

Bongue – deriva de Mbonge:
1.      Uma planta medicinal que cresce nos morros fazendo alusão à autoridade estabelecida.
2.      Lugar elevado e ao qual tudo se submete.
3.      Por extensão, Fortaleza, Administração colonial.
4.      Como nome de criança, talvez tenha nascido num momento em que o pai se encontrava detido na administração do Posto ou enviado como contratado para os serviços forçados, longe dos seus. Convém assinalar que este nome não se registou no período pré-colonial.

Breve nota biográfica do autor

Francisco Xavier Yambo, nasceu no Dundo (Lunda-Norte) em 1945. Fez os estudos secundários no Colégio de St. André (Tshikapa, junto dos Frères de Tilbourg, Bélgica) e especializou-se em ciências Antropológicas e Técnicas Documentais (Biblioteconomia, Museologia, e Arquivologia) na Universidade de Lumbumbashi – República Democrática do Congo, em 1973.

Trabalhou na Recuperação do Museu Regional do Planalto, do qual foi director de1979 a 1997, foi colaborador do núcleo do ISCED (Huambo), na cadeira de História de Angola e Professor de Antropologia Regional (Cultura Bantu) no Seminário Maior do Cristo Rei (Huambo).

É ainda autor do Dossier Ngangela – Motivo Suficiente para um Estudo Científico de Etnonímia Angolana (INALD, Luanda, 1997).
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sábado, 28 de julho de 2012

Vieram todos com a pontualidade de fim do mês, os dias, os planos, os aborrecimentos, a ansiedade, menos ele, o salário.
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Tenho esse defeito de caçar verdades, que pode soar chato de vez em quando. É só aturar.
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sexta-feira, 27 de julho de 2012

"Ir para a caixa de entrada (0)"
e não é que não lhes tenha sido aberta a via
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O dinheiro é a mais espirituosa das bebidas, digo eu.
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quarta-feira, 25 de julho de 2012

Fiquei com a impressão que a porta-voz da CNE (no encontro do sorteio para os espaços de antena, transmitido em directo pela Televisão Pública de Angola) devia (ainda que por mera formalidade) procurar saber dos representantes de partidos políticos e coligações ali presentes se aprovavam, ou não, a acta do acto... e não simplesmente lê-la, dar por concluída a sessão e agradecer a presença.
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(Do arquivo) Crônica: “Os direitos humanos do cão”


A banalidade dos assuntos é relativa, a inalienabilidade dos direitos também.

Man’Filas é kota já, angolano de pai e mãe. É fixe, mesmo que alguns se assustem porque ele quase nunca ri – o espelho é que lhe disse um dia que ficaria feio pela falta de dois dentes logo à entrada da boca. Então, mas é obrigatório rir para ser simpático?! Se nasceu (ou não) quando, isso não importa.

Man’Filas nunca tratou ninguém por “cão!” nem por “cadela!”, porque – e todo o africano sabe disso! – boca de mais velho pode até ter dentes podres, mas dela sai sempre sabedoria. Aliás, ele já ouviu várias vezes a metáfora “tu és um cão, aquela gaja é uma cadela!”, algo que nunca conseguiu digerir. Às vezes parece que tem razão ao considerar injusto o rótulo de “cadela!” a eventual mulher promíscua ou com excessiva frequência na prática do sexo – já que cadela só pratica coito quando está no período fértil, portanto nada de “fornicar” por passatempo (ou desporto, há quem o diga). Bom, são ideias dele e é melhor não se meter!

Ora, se pessoa tem direito a não ser aviltada, neste caso da cadela fica só assim?! Bom, talvez não seja sensato recorrer ao vector da igualdade de circunstâncias, afinal, pessoa é pessoa, cão é cão! Eis um debate constante no secretismo da imaginação do Man’Filas.

A amizade entre o homem e o cão tem a idade do preto-e-branco da zebra. Man’Filas até gosta da lealdade do cão, que no rigor da palavra é raríssima entre os humanos para consigo mesmos, mas ainda assim o cão é inferior ao ser humano. Tanto que, sendo o homem malfeitor rotulado de “cão!” como sanção, já o contrário não é válido; cão virtuoso não é chamado “pessoa!” como recompensa.

A guerra é um parágrafo transversal na história de cada angolano. Man’Filas também foi valoroso combatente durante o conflito armado. Mas não foi o patriotismo que o moveu. Ele apresentou-se (voluntariamente?) revoltado pelo repto “só restará civil de cão, quem não quiser ir à tropa terá de retroceder ao ventre da sua mãe”. Recuamos aos anos 80 e dizem ser Kundy Paihama o autor do repto, na época comissário provincial de Benguela (bom, já disse tanta coisa o mais velho, que meter mais uma palavra na boca dele não custa nada…). Pior que isso foi suportar a recruta, onde se ouvia dos instrutores que um mancebo estava abaixo de cão morto.

As eleições de 1992 viriam resultar num fracasso (impossível de esquecer, chato de lembrar) com profundas implicações, entre as quais uma dramática penúria alimentar… E foram surgindo as ONG’s internacionais, e com elas as nacionais. Man’Filas, cujo fundo nunca já chegou para as propinas escolares, quanto mais para passagem para as estranjas!, abraçou a causa do aprender-fazendo! E não se surpreendeu poucas vezes enquanto acompanhou a escola de futebol infanto-juvenil do francês Jacques (logístico da CRS) no Compão. É que, no estágio, os atletas jantavam às vezes leite com sanduíche mista, quando os cães monopolizavam massa guisada com carne, entre outras iguarias… muito longe do paradigma carne-para-gente, ossos-para-cães! Aonde vamos parar?, indagava-se. Será que chegaremos neste século 21 a ver cães comendo à mesa?!, continuava.

O aprender-fazendo é a magia que potencia o pessoal envolvido no sector da sociedade civil, que ganha aqui em workshops e seminários o know-how vindo das universidades de lá. E o bom das ONG’s é ainda a sensação de liberdade/autoridade, acrescida à automática busca pela justiça em prol dos que não têm voz. Mas a oportunidade e a visibilidade fizeram surgir uma espécie de “elite”, composta por intelectuais (voluntários?) tentados a brilharem mais que a causa defendida através de acções directas de advocacia social.

Tarde de 11 de Setembro. Para trás ficava o quintal da embaixadora dos Estados Unidos, após a cerimónia da assinatura do acordo de financiamento de micro-projecto. O Land-cruiser serpenteava no engarrafamento luandense a caminho da “província”. Uma breve paragem impunha-se para visita de cortesia a uma excelente assessora. Uma vez lá, Man’Filas torcia o nariz ao som incoerente da gaita do marido, que era uma "ilha" na sala. E veio o cão, com aquele aspecto feroz de cães de ricos, sem no entanto alterar a descontracção da conversa. Às tantas, o dono da casa, por sinal um distinto activista social, quebra as torres: "aí vocês estão sentados no lugar dele". Pela primeira vez na vida, Man’Filas via-se obrigado a ceder o sofá ao cão, ocupando outro assento.
.
Mais uma lição aprendida: afinal, Direitos Humanos (do cão) são liberdades que as pessoas têm pelo facto de serem pessoas (ou cães).
.....
Gociante Patissa, aeroporto da Catumbela/bairro da Fronteira, Benguela, 20 Julho 2009
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Se não entendesse de spam e vírus que se auto-enviam para os amigos do e-mail que invadem, sairia pelas ruas a gritar "azar!!!". Acabo de receber e-mail de Éder Lopes, jovem benguelense aspirante a escritor, falecido há quase um ano. Sem pânicos, é um daqueles vírus que mandam e-mail com link apenas. Bom dia a todos
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terça-feira, 24 de julho de 2012

Ontem, em prosa ao jantar, uma conviva falou-nos de um restaurante da cidade de Benguela, onde gosta de ir por volta das 16 horas. É que nessa hora, o pessoal em serviço, antes de fechar o turno, coloca-se no lugar do cliente, e como tal lhe é servido o prato do dia com direito a refrigerante. O dono, com esse gesto (e provavelmente com outros), consegue manter uma relação de dignidade para com o subordinado. Eu, que pessoalmente gosto de como sou atendido lá, só tive que concordar. Inevitável foi lembrar-me de um culto patriota, em cuja casa eu e outros ligados profissionalmente à sua esposa fomos friamente convidados a levantar do sofá, certo dia... para dar lugar ao cão.
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domingo, 22 de julho de 2012

Caçando ruínas e relíquias num sábado qualquer

Quando a entrada é a saída
Passar a mensagem do amor entre pedras, eis o papel da igreja
Coabitação difícil
Santa-Cruz Alta, zonas que palmilhei entre 1997-2000, enquanto
fotógrafo ambulante. Mais tarde por outras razões mais humanitárias.
Idem
O campo do Buraco, visto pelo forasteiro
Pracinhas que foram de pão gentio um dia
Onde os bairros "Akongo" e "Kalumba" se confundem
Lhe chamávamos de "wawa da Académica".
Uns se lembram dele pelo acidente e suas trágicas consequências,
quando a equipa da Académica vinha de Luanda
Sempre estudei longe de casa. Sempre faltou dinheiro para os
mimos escolares que a pressão social implica. Calhava muitas
vezes o Kota Gaby parar pra a boleia. Muito obrigado!
A curva mais visual do bairro
Aqui existiu o bairro "Pereirinha", com mais de 10 casas, "condomínio"
para trabalhadores da Açucareira 1º de Maio na era colonial. As casas
foram demolidas pela empresa francesa, Satom, já na década de 90,
para fazer do morro fonte de entulho para o projecto PRUALB. Este poste
de alta tensão está na iminência de ruir. Meio-termo exige-se da parte de
quem gere políticas pra que não se trate de mais um caso de sermos
vítimas do progresso.
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O desporto às vezes é a própria cidade

Estádio do Buraco - Académica Petróleos Clube do Lobito 
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sexta-feira, 20 de julho de 2012

É algo que normalmente acontece quando vejo filmes (violentos de noite), a reprodução em sonhos, os tais "vivid dreams". São chatos os vivid dreams (seriam pesadelos?), até certo ponto, porque revelam o quanto não estamos preparados para a morte. Tive-os esta noite rsrsrsrs.
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quarta-feira, 18 de julho de 2012

Reflexões avulsas: amizade, como valor, tem valor algum?

Fonte: algures no Facebook
No passado sábado, fui convidado para uma mesa-redonda radiofónica sobre “Amizade". Acabou sendo interessante o exercício de análise de tema aparentemente banal, pela sua universalidade, e ao mesmo tempo extraordinário, visto pela perspectiva sociocultural angolana.

Amizade, como substantivo, parece ser tão evidente que o Dicionário Universal (Texto Editora 1999) não se dá muito trabalho ao defini-la: afeição; boas relações; dedicação.

Depois de qualificado nos testes de locução e redacção em 2004, na fracassada tentativa de abertura da Rádio Ecclesia em Benguela, veio o passo mais difícil. O entrevistador apanhou-me desprevenido: Você tem amigos? Respondi que sim. Muitos ou poucos? Acrescentou, para o meu balbuciar, pois nunca me ocorrera tão complexo escrutínio. Disse-lhe que não tinha inimigos, me dava bem com as pessoas, mas que seria natural haver quem não goste de mim. Tem muitos ou poucos amigos? Já não me lembro de como respondi. Bem, mas tê-los muitos é tê-los verdadeiros?

Na mesa-redonda, conceptualizei amizade em três planos: enquanto manifestação de carinho (intrafamiliar); como instituição de cumplicidade e respeito entre pessoas sem laço familiar (relações interpessoais); enquanto boa educação no convívio social (escola, trabalho, vizinhança).

Valores nobres como a solidariedade, o altruísmo e a amizade transcendem fronteiras geográficas, culturais ou linguísticas. Todavia, não podemos ignorar que estes mesmos princípios e gestos se sujeitam à concepção cultural dos fenómenos de sociedade para sociedade.

Em Angola, quer pela diversidade etnolinguística Bantu, quer pela influência ocidental resultante da colonização, é evidente o choque cultural entre as sociedades tradicional e a moderna. Se na cidade é fácil notar a manifestação de amizade intrafamiliar, já no meio rural esta é avaliada apenas pela lealdade. Porém, a complexidade na compreensão deste fenómeno reside no facto de não haver um paradigma, digamos assim, estático. Logo, tradicional nem sempre é necessariamente fora do centro urbano, e sociedade é às vezes apenas uma questão de família e etnia.

Podemos referir que entre os Ovimbundu, a relação entre sogros e genros (vale para sogras e noras) é de grande formalismo, em parte por influência da divisão de papéis com base no género. Atentemos, por exemplo, que não sentam à mesma mesa para comer. Por outro lado, não se imagina que genro e sogra exponham mutuamente suas intimidades, como seria normal para uma família pró-ocidental que se diverte em dia de praia usando apenas roupa interior. Veremos, claro, que as construções sociais devem ser estudadas dentro do seu contexto cultural.

Um dos aspectos levantados prende-se com a degeneração do conceito de amizade na sociedade em geral e sobretudo pelos adolescentes e jovens. A palavra “amigo!” pode servir para designar o chinês que constrói a nossa obra, o vietnamita que fotocopia documentos, o congolês que vende telefones, o libanês que fornece frango, o maliano da cantina. “Amigo” pode também identificar a terceira parte nas relações de promiscuidade, precisamente aquele sujeito que supre os caprichos não custeados pelo namorado. De valor humano, o termo amigo passou a valor comercial.

Mas seriam amizade e interesse antagónicos? Não. Porque quando me torno amigo de alguém, tenho um interesse, o de aprimorar a minha sociabilidade. Quem manifesta carinho na família almeja que um outro membro saiba que se importa. Ao manter boas relações no local de trabalho, meu interesse é ser bem visto dentro do meu sistema de valor. O problema, em meu entender, reside no que a sociedade deve aceitar, ou não, como normal.  

Ao aceitar, ao invés de ensaiar mecanismos de reprovação, que homens adultos “namorassem” com menores de idade, a troco de bens materiais para estas e famílias, o «tal fenómeno catorzinha» despoletado na década de noventa, a sociedade transformava o abuso sexual de menores e a promiscuidade em normas de conduta. Naquela altura, não faltaram argumentos de equiparar o «fenómeno catorzinha» com a prática das sociedades tradicionais, onde as mulheres assumem lares antes dos seus dezoito anos. Quanto a mim, há um detalhe que faz a diferença: no meio rural, não é a troco de bens materiais, até porque a menina (futura esposa) é educada a produzir na lavra.

Os actores sociais, como a igreja, a escola e a imprensa foram chamados a repensar as suas missões, visando contrapor a tendência latente do individualismo/imediatismo em Angola, passando pelo combate à corrupção desde os mais pequenos exemplos à noção de direitos e deveres, uma vez residir no reconhecimento dos próprios erros o pressuposto para o perdão.

Gociante Patissa, Lobito 18 Julho 12
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terça-feira, 17 de julho de 2012

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Deus foi privatizado, foi o César.
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segunda-feira, 16 de julho de 2012

«Crer é duvidar. Só aquele que um dia duvidou pode crer comprovadamente» (citando de memória o personagem "bispo Tomás Segurado",  da telenovela portuguesa, "Ganância").
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domingo, 15 de julho de 2012

Posso ser eu o problema. Nunca se sabe.
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sexta-feira, 13 de julho de 2012

Para breve em Benguela, apresentação do livro "Kicola - Estudos sobre a Literatura Angolana no Século XIX (Volume I)"

Está marcada para 23 de Julho, 2ª feira, às 18 horas no Largo de África, cidade de Benguela, a apresentação pública do livro "Kicola - Estudos sobre a Literatura Angolana no Século XIX (Volume I)", do autor Francisco Soares (à direita na foto), com edição da Mayamba. O acto marcará o arranque da feira do livro que decorrerá até ao dia 29 de Julho, ao longo da qual vários outros livro serão oficialmente apresentados ao público.
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quinta-feira, 12 de julho de 2012

Futuro da música angolana ameaçado com "parasitismo" da nova geração


Uma denúncia de Mingo Nunes, trazida há duas semanas pelo Semanário Angolense (SA), tem animado debates no que concerne aos direitos autorais. À parte o exagero de cobrar 100 mil Dólares de indeminização por música, caiu mal a muitos ouvir que a homenagem, "Yuri da Cunha Canta Artur Nunes", teria sido feita sem o consentimento da família.

Nos dizeres de Mingo, que ameaça levar o assunto a tribunal, desrespeitou-se a memória do “Espiritual”, como era conhecido Artur Nunes (autor da canção “belina”, morto na casa dos 30 anos aquando dos acontecimentos de 27 de Maio de 1977). Yuri da Cunha, que a nível internacional partilhou palco com Eros Ramazotti e Rui Veloso, vê sua imagem beliscada.

Uma conferência de imprensa e entrevistas avulsas revelaram o desmentido de Santinha Nunes, a irmã do falecido músico que teria autorizado o decalque a troco zero, com termo de entrega reconhecido pelo notário. Nessa cruzada, Santinha qualificou Mingo Nunes de oportunista, sugerindo mesmo que fosse ele levado a tribunal e não o Yuri.

Enganou-se quem julgava encerrada a polémica. Juristas e demais gente abalizada no assunto são peremptórios em considerar que a autorização «não é legítima». A condição de irmã (mesmo que de pai e mãe, como vem sublinhando) não lhe torna herdeira dos bens de Artur Nunes, o que por lei, dizem, cabe aos filhos (os descendentes directos) e, na ausência destes, aos pais (os ascendentes, no caso presente a mãe). Nestes casos, a família deve reunir e indicar um representante para cuidar legalmente do património e que, a serem repartidos os direitos de herança pelos irmãos, deve ser de forma equitativa e sem discriminações.

Na verdade, há muito que a onda de jovens músicos reinterpretarem sucessos do antigamente vem sendo vista com maus olhos. Elias Diakimuezo, o também considerado rei da música angolana, mostrou-se preocupado, há alguns anitos, com a falta de criatividade da juventude, que hoje se evidencia com criações de outros tempos, o que fará com que pouco, ou quase nada, tenham a deixar para gerações vindouras.

Paulo Flores (alta referência da composição e canto dos últimos 20 anos), Edy Tussa (que singrou do RAP para o semba), Nanuto (mestre no saxofone), incluem-se nos que usam temas alheios sem a observância dos direitos. Quem o diz é o presidente da Sociedade Angolana de Direitos de Autores (SADIA), Lopito Feijó, que, quanto a “Yuri canta Artur Nunes”, diz que felicitá-lo-ia duas vezes se cumprisse com os pressupostos legais.

«Jovens músicos são preguiçosos mentais», convergem Santos Júnior e Dom Caetano, que só pecam por generalizar. Caetano perspectiva inclusive acionar processo judicial sobre DJ Mania, por este publicar à revelia versão do célebre “sou angolano”, na voz de Karina Santos, esposa do DJ. Conta o SA que DJ Mania teria desafiado Dom Caetano a se queixar onde quisesse, por considerar cubana a música. Magoado, o cinquentenário, que estudou durante cinco anos em Cuba e diz não ter culpas da influência cultural e rítmica disso decorrente, condiciona: «Se ele conseguir provar que Joana Pernambuco, Pedro Franco, João Cometa, Vergonha, Didi da Mãe Preta eram cubanos, então eu é que o vou indemnizar».

Conforme se vê, o triste quadro do mercado musical reflecte a sociedade no geral, onde a impunidade leva ao imediatismo, este à impunidade, e na desordem ganha o “esperto”.

Gociante Patissa, Benguela 12 Julho 2012
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terça-feira, 10 de julho de 2012

Durante décadas, este edifício, há cerca de quatro anos devolvido à Igreja Católica, viu formar-se muito boa gente enquanto Instituto Médio de Educação Cdte. Kwenha, vocacionado a formar professores.

Funcionou nele também a Direcção do Centro Pré-Universitário (PUNIV). Entre as várias razões para ficar na memória, recordo a cena insólita de um parente meu. Morador da Bela-Vista, esse meu parente, matriculou-se no curso nocturno, uma vez trabalhador durante a luz do dia. Uma cena, entretanto, fê-lo desistir: foi quando um professor exigiu que os alunos se levantassem à sua chegada na sala de aulas, para a discordância do meu familiar, professor afinal. Quer dizer, um gajo, com a idade que tem, vem de longe, suporta os riscos da noite, para agora ser obrigado por um colega a se levantar?

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segunda-feira, 9 de julho de 2012

Alfa... ainda


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domingo, 8 de julho de 2012

Às vezes sinto pena de minorias que, com pressupostos pseudocientíficos, sigam impondo (usando do farol que lhes chegou à mão) a sua "herança cultural superior" para, em nome de uma tal modernice, se minimizar a atenção necessária à investigação/resgate de alguns aspectos inerentes à identidade de outrem, como se o que há de comum fosse moeda para anular o que lhes não convém. Aí recordo para consolo os dizeres de um académico, segundo os quais, o conhecimento é sempre adquirido a partir de um lugar, não podendo por isso mesmo existir esse tão advogado diluir de fronteiras, seja na literatura, seja na planificação linguística. Até amanhã
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por natureza, ñ sou de me conformar. terei sempre outro desafio. Há muito que vivo ciclicamente à espera de respostas, ou seja, ando sempre à frente do meu tempo
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sexta-feira, 6 de julho de 2012

Partilhando leituras


Anteontem, na livraria da Texto Editores (relativamente recém-aberta em Benguela), comprei dois livros: "O Monhé das Cobras", de Rui Knopeli (1997), e "Dois Corpos Tombando na Água" ( 2007), de Alice Vieira, ambos em poesia e com edição da Caminho.

Priorizei  "Dois Corpos Tombando na Água", atraído pelo chamativo selo "Prémio Literário Maria Amália Vaz de Carvalho, 2007" (Câmara Municipal de Loures). Sempre recordo o editor do meu livro de estreia (2008), que  aconselhava vivamente prestar atenção às obras vencedoras de prémios.

Não que me sinta desiludido com a poesia marcadamente dialogante e previsível, mas não faz meu estilo. Sou mais pelo fragmento e alegoria (desde que sóbria, nada de floreados excessivos). Longe de mim qualquer análise valorativa da qualidade da obra. Aliás sobre ela, o blogue "Conversa, muita conversa", animado por Daniel Ferreira, escreveu que "Alice Vieira editou este ano um pequeno livro de poesia que não hesito em proclamá-lo como a "última maravilha da literatura portuguesa".

Do livro em apreço, partilho o poema da página 91, sob o título 5.

a língua sobre a pele        o arrepio
os teus dedos nas escadas do meu corpo

as lâminas do amor     o fogo     a espuma
a transbordar de ti na tua fuga

a palavra mordida entre os lençóis
as cinzas de outro lume à cabeceira

da mesma esquina sempre o mesmo olhar:
nada do que era teu vou devolver

Gociante Patissa, Benguela 6 Julho 2012
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quinta-feira, 5 de julho de 2012


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Há uma geração que é pura aos seus próprios olhos, e contudo nunca foi lavada da sua imundícia. In «Bíblia Sagrada, Provérbios (30: 12)»
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quarta-feira, 4 de julho de 2012

Enquanto isso, em Portugal parece repetir-se o ciclo. Passos Coelho anda já muito bem encaixado no rótulo de mentiroso. Miguel Relvas, segundo consta, mesmo até para não ficar muito a dever em termos de "originalidade", triunfou com certificado de Licenciatura duvidoso.
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segunda-feira, 2 de julho de 2012

domingo, 1 de julho de 2012

Cidadã morre afogada. É o segundo caso em duas semanas nas praias do Lobito

A jovem de 22 anos de idade, estudante, morava no bairro Alto-Esperança, zona alta da cidade do Lobito. Até ao pôr-do-sol deste domingo (01/07), a família aguardava, desolada, que o mar devolvesse o corpo para o último adeus.
Tudo começou quando, na noite de sábado (30/06), dois rapazes e duas raparigas que participavam em cortejo matrimonial pelas artérias da cidade entenderam isolar-se na ponta da Restinga, para tirar proveito da escuridão e privacidade que aquele lugar oferece aos casais. Por volta das 23 horas, uma das meninas entrou para a água e não mais foi vista. Segundo o mergulhador do Corpo Nacional de Bombeiros destacado no local, o consumo excessivo de álcool pode estar na base.
 
Ainda de acordo com a nossa fonte, a tragédia ocorreu cinco horas após o período recomendado para o mergulho, por isso, durante a ausência dos salva-vidas. “Quando a gente chega, de manhã, – disse – já temos muitas horas contra nós”. Por outro lado, as altas calemas que se registam e as baixas temperaturas nesta época de cacimbo desencorajam os mergulhos para o resgate do corpo. “Resta esperar”, asseverou.

O mergulhador lembra que, há cerca de duas semanas, se registou morte por afogamento de um adolescente no bairro do Compão. Daí apelar aos banhistas no sentido de respeitarem os sinais de perigo e evitarem o excesso de álcool.  

Gociante Patissa, 1 de Julho de 2012
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"Como água fresca para o homem sedento, tais são as boas-novas de terra remota". In «Bíblia Sagrada, Provérbios (25:25)»
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A Voz do Olho Podcast

[áudio]: Académicos Gociante Patissa e Lubuatu discutem Literatura Oral na Rádio Cultura Angola 2022

TV-ANGODEBATES (novidades 2022)

Puxa Palavra com João Carrascoza e Gociante Patissa (escritores) Brasil e Angola

MAAN - Textualidades com o escritor angolano Gociante Patissa

Gociante Patissa improvisando "Tchiungue", de Joaquim Viola, clássico da língua umbundu

Escritor angolano GOCIANTE PATISSA entrevistado em língua UMBUNDU na TV estatal 2019

Escritor angolano Gociante Patissa sobre AUTARQUIAS em língua Umbundu, TPA 2019

Escritor angolano Gociante Patissa sobre O VALOR DO PROVÉRBIO em língua Umbundu, TPA 2019

Lançamento Luanda O HOMEM QUE PLANTAVA AVES, livro contos Gociante Patissa, Embaixada Portugal2019

Voz da América: Angola do oportunismo’’ e riqueza do campo retratadas em livro de contos

Lançamento em Benguela livro O HOMEM QUE PLANTAVA AVES de Gociante Patissa TPA 2018

Vídeo | escritor Gociante Patissa na 2ª FLIPELÓ 2018, Brasil. Entrevista pelo poeta Salgado Maranhão

Vídeo | Sexto Sentido TV Zimbo com o escritor Gociante Patissa, 2015

Vídeo | Gociante Patissa fala Umbundu no final da entrevista à TV Zimbo programa Fair Play 2014

Vídeo | Entrevista no programa Hora Quente, TPA2, com o escritor Gociante Patissa

Vídeo | Lançamento do livro A ÚLTIMA OUVINTE,2010

Vídeo | Gociante Patissa entrevistado pela TPA sobre Consulado do Vazio, 2009

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